- Home>
- capitulos , fanfic , ideal negro >
- Capítulo 39
Quando a mão tocou o ombro de Hilda, sua reação foi arremessar o bloco de notas que segurava contra o suposto ser que encostara nela. O berro de dor emitido pelo Victini poderia ser confundido com o grito de assombração de algum fantasma.
— EU VOU EXIGIR UMA CIRURGIA PLÁSTICA COM O
TANTO DE COISA QUE VOCÊS ARREMESSAM NA MINHA CARA! – protestou o Pokémon,
irritado.
Hilda sentiu seu coração leve ao ver que um de
seus amigos estava bem – tirando a marca vermelha deixada pelo bloco de notas
arremessado -, por isso, não hesitou em abraçá-lo, choramingando:
— VIC! VIC! VOCÊ TÁ VIVO!
— Mulher, para de ser dramática – disse
Vic, mas igualmente feliz em ver a garota. – Se bem que você quase me matou.
— D-Desculpe – riu a morena, nervosa, soltando
o Pokémon. – Eu achei que fosse um fantasma.
— E sua reação foi arremessar um objeto que
provavelmente atravessaria ele? – ironizou o Victini. – Seria melhor
ter usado um aspirador.
— É bom ver que seu senso de humor não muda num
lugar como esse – retrucou Hilda.
— Estou tentando esconder o pavor. Sabe onde
estamos?
— Manor of Twins – contou a garota,
levantando-se. – Aqui é o último lar da Light Stone.
— Se é o último lar, foi aqui que Jackson a
encontrou?
— Faz sentido, mas duvido que Jack tenha se
enfiado em uma mansão como essa. Será que... – ela fez uma pausa para pensar. –
Essa mansão foi coberta de areia pelo tempo e estamos ainda na Route 4?
— Pode até ser, mas como estamos aqui?
— Provavelmente a tempestade de areia nos
engoliu e fomos “transportados” para esse lugar – explicou Hilda.
— Cara, tudo isso é surreal – concluiu o
Victini. – O que faremos?
— Estou sentindo a presença da Light Stone,
então estou pensando em procurar os fragmentos e os outros – Hilda mostrou a
bolsa de Hilbert. – Eu encontrei isso, está intacta, então espero que ele ao
menos esteja bem.
— Nenhuma pista de Inari e Jackson?
— Não. Mas eles estavam juntos na hora da
tempestade.
— De toda forma, pra que direção vamos?
Antes de uma decisão ser tomada, a dupla ouviu um
choro baixo feminino. Não chegava a assustar, mas se tratando de uma mansão
assombrada, qualquer presença não humana já deixaria qualquer um arrepiado. A
lamentação era seguida de palavras indecifráveis, Vic e Hilda viraram-se na
direção da mulher que estava sentada em um lance de escadas no final do
corredor a direita.
Seu quimono roxo e seus cabelos negros batiam com a descrição que Grimaud dera em seu bloco de notas. Hilda se aproximou, encanada em saber o motivo da lamentação, já que a moça não parecia notar a presença deles, preocupada apenas em seguir com seu eterno pranto.
“Eu não aguento mais”, foi a primeira oração que a dupla ouviu
quando pararam em frente a ela. Seu corpo estava marcado com queimaduras
graves, possivelmente indicando a causa da morte. “Tudo isso porque levaram
Tomie para fora daqui”.
— A gente deveria tentar dialogar? –
sussurrou Vic para sua companheira.
— Hã... – a morena agachou na altura da mulher,
tentando algum contato visual, mas ela mantinha seu rosto escondido nas pernas.
– Com licença?
“Os espíritos ruins vão chegar, eles vão querer
a Light Stone. Esse negócio é uma maldição”, ela se levantou com a fronte baixa, caminhando para uma das portas
presentes e adentrando a sala por trás dela, atravessando-o com a sua forma
espectral. Hilda levantou-se num pulo.
— V-Vem Vic – alertou ela, seguindo a fantasma.
— A gente vai realmente seguir um fantasma?
— Ela falou sobre a Light Stone. Talvez eles
estejam tentando nos guiar – Hilda agarrou a maçaneta da porta de correr e abriu
com discrição. O gemido da porta foi alto e ela revelou guardar uma espécie de
escritório no mais estilo Johtoniano.
Não tiveram tempo para apreciar o ambiente pois
logo se depararam com a figura espectral da mesma mulher que chorava, só que
dessa vez, seu corpo não estava queimado e sua expressão era de preocupação.
Hilda sentiu a espinha gelar quando um outro fantasma atravessou seu corpo, era
um homem de meia idade.
“A idade delas está quase chegando”, disse o homem.
“Pelos deuses, Ranmaru, são suas filhas. Nossas
filhas”, retrucou a mulher,
inconformada.
“É pelo nosso bem, e pelo bem desse lugar,
Akiri. Ficamos responsáveis pela Light Stone como pedido da família Kurosawa, e
nós, da família Muramasa, devemos cumprir essa missão”.
“Esse objeto é uma maldição para nós!”
Hilda observava o olhar agoniado da mulher
conhecida como Akiri e sentiu um aperto no peito, com uma preocupação que as
vezes lhe assombrava: Se juntasse os fragmentos da Light Stone novamente,
olhares como aqueles seriam frequentes?
Vic pousou no ombro da amiga, ainda temeroso pelo
que podia acontecer. A cena mudou, os fantasmas sumiram e reapareceram para
contar outro capítulo. A dupla ouviu a porta abrir com força, era Ranmaru
novamente, mas sua expressão séria havia mudado para a de puro ódio.
“VOCÊ AS AJUDOU A ESCAPAR?!”, berrou o dono da mansão.
Akiri levantou-se num pulo.
“Não, nunca!”
“Tomie sumiu, só conseguimos capturar Kirie”, informou Ranmaru. “Eu sabia que não devia
deixar desconhecidos nos acompanharem nos rituais, eles são impuros. Vamos enforcá-la
e jogá-la no Hellish Abyss”, ele suspirou, demonstrando o mínimo de medo
por baixo do semblante de ódio. “Esperamos que dê certo”.
“Ranmaru, elas fugiram pois não queriam esse
destino, poupe Kirie disso”,
implorou Akiri, com as lágrimas saltando.
As duas
figuras espectrais se dissiparam e a história não continuou. Hilda permaneceu
em silêncio enquanto Vic olhava pra ela, com uma expressão de quem sabia que
tinha que aguardar as reflexões da amiga, por isso, só permaneceu ali, disposto
a oferecer qualquer apoio necessário.
— E-Eu... Não vi tudo da história... Mas essas
pessoas estavam sofrendo por conta da Light Stone, certo? – disse Hilda, não
sabendo se ela estava falando sozinha, com Clara ou com Vic.
Foi o Pokémon anjo que respondeu:
— Olha, Hilda, eu queria até responder com
uma frase motivacional – Vic encostou sua bochecha na da garota. – O
passado tá no passado, eles sofreram com as consequências deles. Você tá
vivendo o agora, está fazendo o que acha melhor para ajudar, não se
sobrecarregue tanto.
A menina olhou para o amigo Pokémon e soltou
uma risada terna.
— No final, isso foi uma frase motivacional,
não?
— Ninguém quer te ver triste. Seja lá o que
vai acontecer quando juntarmos esses fragmentos, vamos fazer de tudo para que
nenhuma pessoa mais precise chorar – sorriu Vic. – Eu sou o Pokémon
Vitória, então eu meio que torço para isso.
Hilda sorriu, aliviada por não ser a única a
pensar nessas coisas. No final, toda aquela aventura era sobre um grupo de
malucos que assumiram, junto dela, a responsabilidade de salvar Unova e impedir
que rostos tristes sejam frequentes novamente.
Os olhos azuis da garota encontraram um objeto
perdido sobre um travesseiro de aparência firme conhecido como zabuton. O colar
brilhava levemente como se fosse um item importante numa quest, era
feito de prata e possuía uma corrente fina, indicando que pertencia a uma
figura feminina. Hilda só teve certeza de que pertencia a Akiri quando se
aproximou o suficiente para ver o pingente com a silhueta de duas meninas de
mãos dadas.
Vic analisava os movimentos da amiga e a viu se
agachar para alcançar o objeto, mas só teve tempo de estender a mão para frente
quando viu Hilda ser engolida por chamas que brotaram do chão.
“Sou eu, Auteville”, reforçou a fantasma de quimono branco. “Kirie.
Você prometeu me levar para longe desse inferno, desse meu trágico destino”.
Hilbert continuava com a respiração presa,
temendo por sua vida. Não tinha a mínima noção do que estava acontecendo, nem o
motivo de uma criatura horrenda saber seu sobrenome, a única certeza era de que
não podia vacilar ou qualquer passo em vão poderia custar sua vida.
— M-Moça, de novo, e-eu não te conheço – ele
foi cauteloso nas palavras. – Eu peço perdão se não posso te ajudar. Eu só
quero encontrar meus amigos, estamos aqui por engano. Eu ouvi uma voz me chamar
e agora todo mundo sumiu.
“Fui eu que te chamei, senhor Autevielle!”, revelou Kirie, ansiosa, se é que tal
sentimento era possível para um fantasma. “Eu senti você. Você voltou para
me buscar e me levar para minha irmã Tomie, não é?”
Apenas Grimaud chamava Hilbert de senhor e ele
sabia muito bem que o único motivo era por causa de seu pai, Sir Athos
Autevielle. Concluiu então que o Autevielle que Kirie procurava era sua
estimada figura paterna, infelizmente, Hilbert não podia ajudar muito, já que
nem ele mesmo sabia onde Athos estava. Porém, contar que ele havia simplesmente
desaparecido estava fora de questão, a julgar que não saberia qual iria ser a
reação de Kirie.
— D-Desculpe, eu realmente não sei como te
ajudar – desculpou-se o menino, mais uma vez, torcendo para que dessa vez a
fantasma entendesse.
“N-Não é justo! Tomie conseguiu fugir”, a de quimono branco começou a se agitar, e a
figura fantasmagórica assustadora que a acompanhava apresentou sinais de
hostilidade. Hilbert sentou-se na areia, recuando aos poucos, temendo pelo
pior. Kirie tentava se aproximar, resmungando e praguejando sobre fugir dali e
de estar com medo, mas era o treinador que estava cada vez mais apavorado.
A calmaria veio quando o fantasma ajoelhou no
solo e começou a lamentar. Um choro vazio e triste sem lágrimas, de alguém que
já chorou por muito tempo, mas que nunca houvesse alguém que limpasse toda a
dor.
“Ele prometeu. Ele prometeu que nada de ruim
aconteceria, que nunca me deixaria sozinha, que faria de tudo para dar um
futuro diferente para mim”, a
fronte apavorante de Kirie olhou para o treinador que estava chocado com as
palavras. “Ele me abandonou mesmo depois de prometer que tudo ficaria bem”.
Hilbert estava com o olhar perdido, como era
possível que ele e aquele espírito fossem tão parecidos. Mentalmente, ele
amaldiçoou seu próprio pai.
— P-Podemos achar uma s-saída – disse o garoto,
tentando negociar sua própria saída dali. – N-Não sou exatamente quem você
procura, mas podemos dar um jeito.
Kirie deu sinais de calma, mas foi a criatura
presa a ela que começou a gemer agitado de dor. A fantasma voltou sua atenção
para ele, trocando olhares como se conversassem. A expressão da mulher de
quimono branco mudou para algo aterrorizante e toda a máscara de lamentação
caiu sobre o solo e o treinador voltou a sentir seu corpo arrepiar.
“NÃO VÃO PEGAR ELE DE MIM!”, berrou Kirie, com sua forma espectral
desaparecendo aos poucos, mostrando que logo deixaria o menino sozinho de novo.
— N-Não! Espera! – Hilbert estendeu a mão para
tentar agarrá-la, mas quando se jogou, atravessou e caiu na areia. A solidão
voltou a ser sua companhia. – N-Não quero ficar sozinho...
Suspirou e se levantou, limpando a roupa. Um
raio avermelhado veio de seu bolso e atingiu o solo, de lá, Brianna saiu. A
Snivy olhou para seu treinador e começou a entrelaçar-se entre as pernas do
menino.
— No final, o conselho de Jackson foi bem útil
– disse ele, sentindo um alívio no coração. – N-Não fica com medo, Brianna,
v-vamos sair daqui. Pelo menos agora, temos a companhia um do outro.
Maldita boca, era o que Hilbert diria logo em
seguida quando a areia em sua volta começou a se mover. Snivy se posicionou em
pose de batalha, vendo que o que surgia por debaixo da areia eram Pokémon. Um
grupo de aparência curiosa, parecidos com sombras, carregando na parte inferior
de seu corpo uma máscara amarelada com expressões diferentes, revelando que
aquele eram os rostos de quem já foram quando vivos. Os olhos vermelhos
arregalados encaram até a alma da cobra de grama e do treinador, enquanto
balançavam seus braços lentamente.
— E-Eu não e-estou com a minha Pokédex – disse
Hilbert, intimidado por não conseguir informações sobre aquelas criaturas. O
grupo era composto por mais de dez deles, o que deixava a inicial de grama em
desvantagem. – C-Cuidado, Brianna.
Os Pokémon com máscara começaram a se
movimentar e mergulharam em direção a Hilbert, que foi defendido pela sua
Snivy, utilizando seus golpes de grama para contra-atacar.
Mesmo sendo oponentes fracos, mais e mais
daqueles surgiam, como se fossem a cabeça de uma hidra. Por um descuido, um dos
Pokémon agarrou o rosto de Hilbert com suas mãos de maneira bizarra, soltando
grunhidos desesperados, puxando a pele da face dele na intenção de arrancá-la,
como se precisasse de uma nova máscara e um novo rosto. O treinador gritou,
tentando afastar o Pokémon, enquanto outros deles agarravam seu corpo.
Brianna se livrou de algumas criaturas que a
atacavam e virou-se para seu tutor, notando que os fantasmas puxavam o garoto
para dentro da areia. A Snivy sentiu estar ficando maluca ao ver que os Pokémon
pareciam fantasmas humanos com roupas de épocas antigas. Louca ou não, a
inicial de grama usou um Leaf Tornado contra eles. O tornado de folhas
levou os fantasmas para longe, fazendo Hilbert se soltar e cair com a fronte
baixa.
Snivy se aproximou do menino, que aparentava
exaustão, mas foram as finas lágrimas escorrendo pelo rosto ensombrado dele que
cortaram o coração de sua Pokémon. Ele deu alguns soluços e olhou com pavor
para sua inicial:
— Eu estou com medo, Brianna...
Coberta por determinação, Brianna sentiu seu
corpo arder e o brilho da evolução veio. Até mesmos os Pokémon que atacavam,
pararam para ver. Como uma versão crescida da própria Snivy, Servine possuía um
corpo esguio maior e folhas brotando em suas costas até sua cauda. Em seu
peito, uma estrutura amarelada em formato de V ultrapassava para além dos
ombros, seus braços haviam encolhido e seus olhos estavam mais estreitos e
maduros.
Hilbert admirou ao ver. Era a primeira vez que
um Pokémon seu evoluía. Mas não teve tempo de aproveitar, já que seu corpo
cedeu ao cansaço e ele apagou. Brianna continuou próxima do treinador e viu
Kirie retornar, afugentando todas as criaturas sombrias. A inicial jurou estar
protegida, mas seu corpo paralisou quando a mulher de quimono branco e o
fantasma demoníaco começaram a se aproximar, com uma expressão que não era de
boas intenções.
“Vocês precisam salvar Kirie”, a voz confortante que soprou como brisa nas
nucas de Inari e Jackson fizeram os dois tremerem. Eles se entreolharam, decidindo
mentalmente quem seria o corajoso a olhar. A sacerdotisa foi a escolhida e seus
olhos esverdeados encontraram um rosto mais novo que ela. A fantasma usava um
quimono branco, mas tinha uma aura completamente diferente do espírito que
viram no quarto.
Os cabelos negros curtos contrastavam com a
pele pálida e a expressão calma. Inari engoliu seco, ainda pensando se podia
relaxar ou pensando em quão louca era toda aquela situação.
“Por favor, salvem a minha querida irmã”, suplicou novamente.
— Tá falando daquele demônio que engole a gente
só com o olhar? Não acho que ela queria ser salva – respondeu Jackson, com uma
risada ligeira e nervosa. A sacerdotisa lhe deu uma cotovelada de repreensão.
— Estamos tentando sair daqui, estamos por
acidente aqui – explicou a ruiva.
“O senhor Autevielle nos ajudou a fugir do
Ritual das Gêmeas, mas Kirie ficou para trás”, contou a garota. “Nossa missão era proteger a nossa casa dos
espíritos obsessores que rondam a Light Stone, mas eu não queria matar minha própria
irmã. Por favor, nos ajudem”, e assim a menina desapareceu.
— R-Ritual? – Jack olhou para a mulher ao seu
lado, sentindo a espinha arrepiar só com o som da palavra.
— Os povos mais antigos utilizavam de rituais
que envolviam sacrifícios com símbolos – explicou Inari. – O Ritual das Gêmeas
é desconhecido até para mim.
— Se me permitem, acho que estou me
recordando das coisas – Grimaud saltou sobre o ombro de Jackson. – Aquela
era Tomie, a garota que conseguimos resgatar. Sua irmã, a Kirie, infelizmente
ficou para trás.
— Não quero bancar o adivinha, mas talvez toda
essas coisas esteja relacionado com essa fuga mal sucedida – presumiu Jackson.
— Um espírito que ficou preso nesse plano por
conta de uma missão não cumprida ou uma mágoa... – completou Inari, reflexiva.
– Talvez ajudar a tal Kirie seja a nossa saída.
— E a gente faz o quê? Exorciza? Joga água
benta? Sal? Bate na madeira? – o arqueólogo cruzou os braços, não muito
contente com a ideia.
— Grimaud-sama, pode nos ajudar a recriar os
passos que fez aqui quando era humano? – perguntou Inari para o pequeno Joltik.
O Pokémon saltou alto, tentando ter uma visão
geral da mansão, tentando se lembrar daquele ambiente.
— Depois que o senhor Ranmaru nos apresentou
a mansão, eles nos apresentaram a Kirie e Tomie. Não podíamos vê-las
diretamente, apenas ouvi-las.
— Eles provavelmente queriam mantê-las puras
para o mundo. Isso explica o quarto não ter janelas – contou Inari, se
levantando.
— Se me lembro bem, e se a visão estava
correta, nós fomos para lá – o inseto salvou em direção da varanda. – Foi
por aqui!
— Pera aí! – protestou Jack. – A gente vai
brincar de Ghostsbusters e caçar fantasmas? Digo, já vimos um que quase sugou
nossas almas, imagina o que podemos encontrar se a gente seguir exatamente os
passos que eles estão nos mostrando.
Inari virou-se para ele com uma expressão
brincalhona.
— Você está com medo?
— Sinceramente? APAVORADO! – respondeu o
arqueólogo. – Eu odeio filmes de terror, jogos e qualquer coisa do gênero.
— Ah, vamos lá, Jackson-sama – a sacerdotisa
colocou as mãos nos quadris, se divertindo com a situação. – Qualquer coisa
você segura a minha mão.
O silêncio predominou e Inari corou quando
percebeu no que tinha acabado de dizer. Jackson coçou os cabelos bagunçados,
sentindo a orelha esquentar. Caminhou em direção onde Grimaud os aguardava,
passando perto da colega.
— Essa frase é minha, ok?
O trio adentrou a mansão e já foram
recepcionados por vultos de Athos andando pelos corredores. A forma espectral
indicando o flashback estava sozinho e virou um corredor a direita. Os três não
pensaram muito e seguiram o mosqueteiro, mas logo pararam ao ver que o mesmo
havia parado na frente de uma parede.
“Vocês podem me ouvir?”, disse Athos, agachando para ficar mais
confortável.
“S-Senhor Autevielle?”, respondeu uma voz feminina, abafada pela
construção.
“Sou eu mesmo”, riu o homem, em resposta. Jackson percebeu
como a risada era bem semelhante à de Hilbert, ainda que mais elegante.
“T-Tomie, é o senhor Autevielle!”, a menina de dentro do quarto pareceu agitada.
“Já ouvi, Kirie, já ouvi”, riu uma segunda voz.
“Dormiram bem?”, perguntou Athos.
“Com certeza. E o senhor?”, perguntou Tomie.
“A recepção foi maravilhosa, então minha noite
foi incrível”, contou o
mosqueteiro. “Meu quarto fica de frente para a árvore de cerejeira do jardim
de vocês. É tão lindo”
“Sério?”, a voz de Kirie parecia de surpresa. “Vimos poucas vezes, então não
nos lembramos”.
Athos soltou um longo suspiro. Sua feição
parecia de preocupação e seu olhar estava perdido em pensamentos. Grimaud
olhava para seu antigo mestre com uma expressão de quem sentia falta dos velhos
tempos.
“Posso contar algo para vocês?”, Athos começou a espiar por uma rachadura,
conseguindo enxergar a expressão curiosa das gêmeas. “Meu maior sonho é ter
filhos. Infelizmente, eu sou um andarilho sem-terra que passo a maior parte do
tempo ajudando pessoas. Mas eu adoraria ter alguém pra mostrar o mundo e todas
as maravilhas dele.”
Inari e Jackson se entreolharam. Chegaram em
pensar em Hilbert, imaginando se Athos havia mantido esse pensamento até os
dias atuais.
“Papai nos contou que somos as escolhidas para
o Ritual das Gêmeas, então temos que ficar aqui, sem contato com o mundo
externo”, contou Kirie. O
mosqueteiro notou que a menina brincava com um galho seco da cerejeira. “Mas
eu tenho muita vontade de conhecer o mundo lá fora.”
“Eu prometo que assim que fizermos o ritual,
irei para todos os lugares”,
Tomie segurou a mão de sua irmã. “E você vai vir comigo, porque seremos uma”.
Inari virou-se para Grimaud.
— Grimaud... O que é, afinal, o Ritual das
Gêmeas?
— Enquanto o senhor Athos conhecia as
gêmeas, eu conversei com a senhora Akiri, a mãe delas – contou o Joltik. – Ela
era uma mulher muito bonita com seus cabelos negros, mas sempre tinha um olhar
vazio. Demorou algum tempo até que me contasse qual seria o destino das duas irmãs.
— Tomie contou algo sobre matar a irmã –
lembrou Jackson, meio se preparando para digerir a história.
— Existe uma crença que irmãos gêmeos são a
mesma alma dividida em dois corpos – apesar de não ser algo rotineiro,
Grimaud contava com seriedade, mostrando todo seu respeito com o acontecido. – Para
proteger a mansão e a vila de espíritos ruins, de tempos em tempos, gêmeos são
escolhidos para realizarem o ritual de purificação. O irmão que nasceu por
último deve matar estrangulado o irmão que nasceu primeiro, já que, se me
lembro bem, acredita-se que o mais velho e mais forte ajuda o mais novo e fraco
a nascer primeiro para depois vir ao mundo.
— Eu já ouvi falar sobre essa crença – contou
Inari. – Pelo que Tomie disse, ela é a mais velha das duas?
— Exatamente. Depois de estrangulada, o
corpo é jogado no Hellish Abyss e se funcionar, a vila e a mansão ficam purificadas
até o próximo ritual.
— Se Athos fugiu com as gêmeas, isso significa
que o ritual deu errado. Mas o que exatamente aconteceu com Kirie que foi
deixada para trás? – questionou Jack, analisando as informações com a mão no
queixo.
Seu corpo tremeu quando ele encaixou alguns
fatos. Haviam capturado Kirie e tentado fazer o ritual mesmo incompleto, o que
provavelmente deixou o espírito com uma carga negativa enorme, o que explicaria
a figura sinistra que tiveram que encarar há alguns minutos.
— Ela deve ter se sentido sozinha e incapaz –
comentou o arqueólogo, com a voz baixa.
As velas do ambiente crepitaram e sacudiram com
força, o ambiente entrou em uma atmosfera perturbadora. Inari sentiu seu corpo
pesar e olhou para trás. Kirie estava lá, com seus olhos maliciosos.
Mais de perto, era possível ver a corda em seu
pescoço magro, a corda era conectada ao espírito obsessor que gemia de dor e
agonia. Suas mãos, apesar de pálidas, estava com os dedos sujos do que parecia
lama e sangue, indicando que ela havia lutado pela sua sobrevivência antes de
ser brutalmente assassinada, além de esquecida e abandonada.
As mãos de Kirie alcançaram o pescoço de Inari.
“Vocês não deveriam ter vindo tão longe. Se eu
não saí daqui, ninguém mais vai”,
disse ela, aplicando certa força contra o pescoço da sacerdotisa, que não
conseguia se mexer.
— INARI! – gritou Jackson, se jogando para cima
da mulher, envolvendo-a num abraço, afastando-se do fantasma.
Kirie começou a rir de forma bizarra, seu corpo
pendeu levemente para trás enquanto sua risada mexia com a iluminação local. As
velas se apagaram e um trovão ribombou no céu, mesmo o tempo estando limpo. A
luz causada pelo fenômeno revelou algo que brincaria com a sanidade dos
presentes.
Corpos esqueléticos e sem vida forravam todo o
chão de madeira velha. A semelhança entre eles eram as máscaras amarelas de
expressão neutra, os únicos rostos que apareciam revelavam faces horrorizadas.
Inari tremeu de medo e continuou abraçada com Jackson, ambos previam o pior.
— N-não consigo me mexer – sussurrou a
sacerdotisa, com a voz pesada e os olhos molhados.
— V-Vamos morrer aqui? – perguntou o
arqueólogo, segurando a mão da mulher.
O grunhido de Bijou na mochila de Jack chamou a
atenção dos dois. A Cleffa pulou no ombro de seu tutor e se preparou para
utilizar um golpe, estendendo as curtas mãos para frente e emanando um brilho
forte de seu corpo. Flash era um golpe popular por treinadores para
iluminar cavernas escuras, mas aqui, ele serviu como um repelente para o
espírito de Kirie, que cobriu os olhos, como se aquela luz fosse divina e
estivesse condenando-a por seus pecados.
Jackson sentiu que seu corpo se movia novamente
e não pensou duas vezes antes de agarrar o pulso de Inari e sair correndo,
fugindo novamente daquela criatura demoníaca. Bijou grunhiu em resposta quando
seu treinador a agradeceu.
A sacerdotisa apontou para o fim do corredor e
lá estava Tomie, apontando para o corredor da esquerda. Confiantes, os dois
viraram e subiram um lance de escadas para o segundo andar. Andar esse que
havia tantas portas que eles escolheram a primeira que viram, entrando em um
quarto de visitas.
O quarto dava visão para o aclamado Jardim da
Cerejeira. Os humanos respiraram fundo, recuperando as energias e o fôlego. Inari
caminhou pelo quarto, indo até a janela, tentando colocar os fatos no lugar,
evitando que sua mente colapsasse e ela perdesse a sanidade, tanto ela quanto
Jack sabiam que precisam com urgência achar a saída.
Foi quando a visão para o jardim lhe chamou a
atenção de algo finalmente conhecido. No pequeno templo próxima a árvore estava
uma garota de cabelos castanhos e blusa rosa que encarava a entrada.
— J-Jackson-sama – alertou a sacerdotisa. – É-é
a Hilda!
Parecia estar em um cenário de flashback em preto
e branco igual alguns filmes que sua mãe atuava. Hilda olhou em volta e notou
estar na entrada da Manor of Twins, em uma época em que havia vida, a julgar
pela aparência convidativa, mesmo tudo estando sem cores. Na sua mão, o colar
de Akiri, o objeto que provavelmente havia transportado ela até lá.
Na sua frente, Ranmaru e a própria dona do
objeto, com feições mais joviais e felizes pareciam aguardar alguém. A mulher
foi a primeira acenar levemente, indicando que a tal visita chegara.
A Foley olhou em direção para onde os dois
olhava e logo viu um homem de meia idade, a julgar pelos fios brancos que
nasciam escondidos entre as mechas ruivas. Usava um quimono tradicional da
época e carregava consigo um objeto dentro de uma bolsa de pano. Hilda sentiu
seu peito arder e já adivinhou do que se tratava.
O homem enfim, parou para os dois que o
recepcionava:
— Senhor e senhora Muramasa – ele se curvou,
cordialmente – Meu nome é Junsei Kurosawa e vim lhes trazer a Light Stone.
Yo, Star!
ReplyDeleteEsse capítulo, uau, eu gostei tanto do clima e da ambientação que vc propôs para este capítulo na Manor of Twins, mas sem abrir mão do humor característico de Neo Unova em certas cenas como entre Vic e Hilda ali no comecinho, fora a mensagem motivadora do Victini.
A cena do Hilbert sozinho com a Brianna e a luta dela para proteger o Hilbert foi fascinante e como ela derrotou os Yamask para defendê-lo e permaneceu ao lado dele, além da evolução era tudo o que estávamos precisando.
As cenas do Jackson, Inari e do Grimaud (que pela primeira vez não está sendo um velho tarado) além do backstory por trás do ritual das gêmeas, da Tomie e da Kirie, além de vermos mais do pai do Hilbert e seu passado por aquele flashback visual, gostei de ver como o Athos sempre quis ter uma família.
Enfim, concluindo, eu estou gostando bastante desse arco, ansioso para a conclusão dele.
Yoo Leucro
DeleteSorry a demora
Obrigada, de verdade, fico feliz que tenha conseguido trazer um clima tenso, porém, equilibrado para o capítulo. Sofri pra caramba pra tentar trazer inspirações de terror que eu tenho. Foi um capítulo escrito as cegas sem um estudo grande sobre o que fazer.
BRIANNA ARRASOU NESSE CAPÍTULO. Agradeço o Canas que me motivou a fazer a evolução dela muito mais emocionante do que em uma simples batalha de beira de estrada.
Eu fico impressionada como é a primeira vez que o Grimaud deve falar realmente sério hausuahhu O que prova que apesar de depravado, o Grimaud está lá para ajudar. Eu amei fazer essa conexão dele com as meninas.
Obrigada pelo comentário, Leucro <3
See ya
Clima tenso otimo!
ReplyDelete