• Thursday, December 9, 2021



    Odiava a luz do dia. Achava desnecessário ter contato com a luminosidade do sol. Seu maior nêmesis era acordar cedo e não se julgava preguiçoso ou vagabundo por isso, apenas se definia como uma pessoa com hábitos noturnos. Mas não tinha nada que pudesse fazer, em uma decisão unânime da sociedade e seus longos anos de história, o período produtivo escolhido era quando o sol começasse a surgir.

    Sol esse que Tsuyo não tinha costume de ver. O Castelo dos Plasmas estava construído no subterrâneo, então os arquitetos e engenheiros tiveram que se desdobrar para trazer uma iluminação que não deixasse os ambientes superficiais.

    Conforme ele avançava pelos corredores entediantes e sua exagerada repetição de colunas e padrões de off-white e dourado, mais ele tinha certeza que arquitetura clássica era antiquada o suficiente para ele. Sua missão, dada diretamente por Ghetsis, era só uma: Convocar Kogsu para uma reunião. Primeiro, ele praguejou sobre como o líder era sem noção. Depois, aceitou com muita insistência, mesmo sabendo que o playboy gênio era uma criatura deveras difícil de se lidar.

    A ala dAs Virtudes contava com diversos quartos e espaços dedicados somente para os filhos dos Sete Sábios, grupo de alto escalão na Team Plasma. Grupo este que defendia a libertação dos Pokémon alegando que os humanos usavam as criaturas para seu próprio prazer, sem pensar no que eles realmente queriam. Crença maravilhosa, se não fosse as atitudes questionáveis.

    Tsuyo parou em uma das portas e bateu com certa impaciência, nem um pouco preocupado em saber se Kogsu estaria dormindo ou não. Logo em seguida, ouviu burburinhos e risadas maliciosas, indicando que o cientista não estava sozinho, coisa que o ninja já teorizava o que poderia significar, o que o fez revirar os olhos.

    A enorme porta se abriu e Kogsu encarou o uniformizado Tsuyo. O cientista usava calças de moletom e o tronco nu, o cabelo azul petróleo chegava até os ombros e estava bagunçado. Por cima dos ombros dele, era possível ver duas mulheres seminuas deitadas na cama bagunçada, comprovando a teoria que o Virtude havia se divertido.

    — Bom dia, Tsuyo – cumprimentou ele, casualmente. – Veio se juntar a nós? – perguntou, em provocação.

    — O Ghetsis quer falar com você – sem interesse em ser cordial, Tsuyo depositou a informação, curto e grosso.

    O cientista ignorou a informação anterior e segurou o queixo do ninja, que estava sem sua usual máscara, exibindo uma cicatriz em formato de X na região da mandíbula direita. Aproximou os rostos, utilizando o máximo de seu charme para fazer um convite especial.

    — Tem certeza que não quer se juntar? Já adianto que eu não vou te dividir – os lábios se aproximaram, mas um terceiro personagem se juntou a soma.

    A Liepard de Tsuyo se mostrou possessiva, usando suas unhas para quase atingir o cientista, que recuou, rindo. A leopardo rodeou as pernas de seu mestre, enquanto o mesmo continuava sem emoção.

    — Aparentemente, eu não sou o único ciumento aqui – observou Kogsu. – Adoro uma boa disputa – ele se virou para dentro do quarto, mudando o tom de voz para algo mais doce (o que não combinava com ele). – Meninas? Infelizmente, o gostosão de vocês precisar trabalhar. Mas eu espero vê-las a noite.

    As duas mulheres soltaram resmungos estereotipados e superficiais de reprovação. Em minutos, elas pegaram suas vestimentas curtas e se aproximaram, depositando cada uma, um beijo molhado e caloroso no lábio do Plasma, e saíram, conversando sobre qualquer outro assunto.

    — Onde é que você arruma esse tipo de gente? – questionou Tsuyo.

    — Quer o contato delas ou isso foi ciúmes? – provou o outro, vestido uma calça jeans e uma camisa social. O ninja desviou o olhar, não muito surpreso com a depravação do colega.

    — Nenhum dos dois. Toda semana você traz alguém de fora – apontou. – Me preocupo se você vai ser o idiota que traga outro idiota que acabe por vazar nossa localização.

    — O quê? Acha que eu saio com espiãs? – riu Kogsu, fechando a porta do seu quarto, se posicionando no corredor. – Não se preocupe, Tsuyo, essas belezinhas ganham o dobro para ficarem quietinhas. E eu sou muito seletivo com as minhas damas.

    — É com isso que você gasta? Por isso vive pedindo o dobro de dinheiro pro Ghetsis – ironizou o de cabelos brancos, caminhando ao lado do colega.

    — Se ele paga, é porque tem – o outro deu de ombros.

    Apesar do visual que remetia a uma arquitetura medieval com cúpulas ovadas e arcos curvados, o local possuía tecnologia de ponta, sendo uma ofensa para os mais cultos. Câmeras de segurança, dispositivos com digitais e enormes elevadores asseguravam toda a circulação segura das centenas de pessoas que viviam no Castelo dos Plasmas. Kogsu acionou o elevador com um botão, e casualmente, ele e Tsuyo se dirigiram para um andar mais baixo que ligava o corredor branco com luzes de led até uma porta dupla igualmente da mesma cor.

    Como se tivesse saindo de uma série medieval e adentrado num seriado de ficção cientifica, o laboratório dos Plasmas era o local favorito de Kogsu. Era lá que todos os estudos e informações possíveis saíam e moviam os planos da equipe. Cheio de aparelhos, tubos de ensaio e computadores modernos lotavam o local.

    O cientista vestiu um jaleco branco com o famoso brasão da equipe nas costas como se fosse um uniforme, sentou-se em uma cadeira, aguardando aquele que convocara a reunião.

    — O que Ghetsis quer?

    — É sobre sua nova invenção – contou o ninja.

    — Aaah, finalmente meus meses de estudo vão receber a atenção que merecem – debochou o rapaz. – Ele mesmo me pediu esse estudo, mas depois resolveu brincar de xadrez com o filhinho dele.

    — Você sabe que ele precisa manter a imagem da Team Plasma limpa – argumentou o outro. – Quanto menos gente desconfiando das merdas que fazemos, mais agimos nas sombras.

    Kogsu e Tsuyo se mantiveram em silêncio por um tempo. Os sons ambientes eram os únicos audíveis, barulhos entediantes semelhantes com de um hospital. O cientista estralou o pescoço levemente, soltando algumas onomatopeias que indicavam sua impaciência em esperar. Procurou nos bolsos seu celular, segurando-o na posição vertical enquanto Tsuyo observava com certa curiosidade o que o companheiro faria. Quando o som de uma música alegre de um jogo tocou do pequeno aparelho, o ninja cobriu o rosto de vergonha.

    — Tá de zoera que você vai jogar? – questionou, só para ter certeza.

    — A culpa não é minha se o Ghetsis tá demorando – respondeu o rapaz, colocando os pés na mesa. – Uma partida de Pokémon Unite não vai matar ninguém, tenho missões diárias pra fazer. Quer jogar?

    — Eu passo – Tsuyo levantou a mão em resposta, andando pelo laboratório.

    O cientista começou sua jogatina enquanto conversava com seu próprio telefone, usando alguns termos que o próprio ninja não entendia ou tentava entender. Kogsu sorriu e comentou sobre como adorava jogar com uma garota conhecida como Jackie.

    — Ela é muito boa com Greninja e Zeraora, cara – sorriu ele, como um adolescente apaixonado por seu namoro virtual. – Admito que já paguei umas skins pra ela.

    — Você já não me surpreende mais – ironizou o ninja. – Logo, você a chama pra cá e descobre que ela é um cara de 40 anos que ainda mora com a mãe.

    — Vira sua boca pra lá – riu Kogsu.

    Atento como era, o ninja virou seu olhar para a porta de entrada e como uma assombração, Ghetsis entrou, com sua usual roupa, com seu semblante sério e enigmático. Tsuyo se manteve neutro quanto a entrada do chefe, enquanto Kogsu quase jogou o celular no chão, tentando manter sua pose. Levantou-se com rapidez e ajeitou o jaleco.

    — Bom dia, chefia – cumprimentou. – Primeiro, agradeço a reunião, estou ansioso para mostrar o resultado dos meus estudos.

    — Estou curioso pra saber o que você fez pra aumentar o poderio da Team Plasma – disse o líder, sem se preocupar com saudações formais.

    — Certo – Kogsu sorriu falsamente, tirando um pano que cobria algumas coisas em cima de uma das mesas.

    Tsuyo se aproximou, com uma expressão tão incrédula quanto a de Ghetsis. Além de papéis com diversas anotações, um cubo de vidro deixava em exposição um punhado de barro em um formato de pirâmide. O líder dos Plasmas piscou lentamente algumas vezes e encarou o cientista.

    — Te paguei pra você me trazer barro? – questionou ele, fazendo o ninja segurar a risada.

    — Não é só barro, chefe – explicou Kogsu. – O barro, ou a argila, são materiais naturais que são moldáveis. As pessoas usam para construção ou artesanato. Onde eu quero chegar? Bem, você vai ver – o cientista se aproximou da Liepard de Tsuyo e arrancou um pequeno pelo do Pokémon, que arrepiou, ameaçando atacar, mas logo foi impedida por seu dono.

    Ele voltou para sua mesa de trabalho e depositou a amostra recolhida numa pequena máquina acoplada ao cubo com o barro. O equipamento agiu como um scanner, analisando o que fora depositada em seu interior, alguns ruídos eletrônicos acionaram pequenas garras que se movimentaram e começaram a trabalhar com a argila. Foram longos minutos até que a obra se completasse.

    Uma cópia perfeita da Liepard de Tsuyo em escala reduzida acabara de ser feita, mas aquilo não impressionou Ghetsis, que olhou irritado para o cientista.

    — Você passou meses estudando pra desenvolver uma máquina de esculpir? – questionou. – Eu não preciso de esculturas novas, Kogsu, eu preciso de poder.

    — Chefia, se me permite, a melhor parte ainda não chegou – respondeu o outro, se gabando um pouco. – Observe – o cientista procurou uma Pokéball em seus bolsos e liberou o Elgyem usado nos acontecimentos de Nacrene.

    O comando dado pelo homem fez os olhos e as esferas nas mãos do Pokémon brilharem, indicando que ele estava usando algum golpe psíquico. Kogsu pegou dois fios coloridos e conectou a máquina com as mãos do Elgyem, que continuava concentrado. Tsuyo e Ghetsis olhavam cada movimento feito pelo rapaz, ansiosos para o que viria em seguida.

    Talvez pudesse ser chamado de milagre, ainda que fosse pura ciência misturada com poderes psíquicos, mas a escultura de Liepard ganhou vida própria. Ela não agia como um boneco, seus movimentos eram precisos, como se todos os músculos e ossos estivessem ali presentes. A leopardo real observava aquilo com certa atenção e admiração, como se reconhecesse aquele pequeno Pokémon de barro como um dos seus. Apesar da movimentação viva, a pequena criatura agia como ela era: Controlada e vazia, não que isso fosse um problema para Ghetsis, que soltou uma exclamação de satisfação.

    — Isso... é incrível!

    — Agradeço, chefia – sorriu o cientista. – Se me permite, posso dizer que isso está em fase de testes. Na verdade, seria muito interessante se pudéssemos expandir o tamanho desses Pokémon para uma escala real.

    — Poderíamos criar um exército dessas criaturas – complementou o líder dos Plasmas.

    — Com um tamanho maior dessa máquina, posso até criar atualizações que nos permitam modificar os Pokémon, misturando o melhor de cada criatura. E tudo que eu vou precisar são amostras de DNA.

    — Podemos usar alguns Pokémon que temos a nossa disposição – refletiu Ghetsis, com a mão no queixo.

    — Se me permite, chefe – Tsuyo levantou a mão. – Com o avanço da missão de convencer as pessoas de “libertarem” seus Pokémon, temos muitas criaturas poderosas de treinadores perdidos por aí.

    — Isso é genial, Tsuyo – o êxtase do líder o fez sorrir de maneira bizarra. – Com esse avanço, poderemos criar criaturas com poder absurdo.

    — O problema é que apesar do poderio que isso pode nos trazer – apontou Kogsu, ajeitando o jaleco. – Como sabem, o barro é um material frágil – ele retirou a tampa do cubo de vidro que protegia a Liepard de argila, jogando um copo de água sobre ela. Em minutos o Pokémon se desfez, como se derretesse.

    — Não me importa, prezamos pela quantidade do que pela quantidade nesse caso – disse Ghetsis, com firmeza.

    — Mais uma coisa – Kogsu voltou a dizer. – Preciso deixar vocês dentro de todos os problemas. Se vamos fazer uma quantidade maior, vamos precisar de uma quantidade maior de poder psíquico. Eles agem como o cérebro desses Pokémon, mas um Elgyem e minha baixa especialidade na tipagem não seria o suficiente.

    — Você precisa de Pokémons psíquicos e um especialista? – Ghetsis riu, sabendo da sorte que tinha. – Temos a pessoa perfeita.

    Diferente da entrada do líder dos Plasmas, a entrada a mulher de cabelos róseos soou como se um anjo entrasse, leve como uma pena, ela trouxe até um clima mais calmo para o ambiente, ainda que o próprio Ghetsis estivesse também presente. Com sua expressão calma, ela sorriu gentilmente como se já soubesse de tudo:

    — Eu senti ondas psíquicas aqui – disse, olhando para o Elgyem. – Imaginei que seriam suas, pequeno.

    — Kana querida – cumprimentou Ghetsis. – Veio em boa hora, vamos precisar das suas habilidades e Pokémon.

    — Ajudarei como precisar, senhor Ghetsis – concordou a mulher, sentando-se para ouvir o pedido.

     

    N estava em seu quarto, perdido em pensamentos enquanto analisava a Dark Stone que lhe fora dado. Após entrar em acordo com seu pai, Ghetsis, de que se tornaria Rei dos Plasmas após se obter a esfera que guardava o dragão dos ideais, Zekrom, finalmente ambas as partes poderiam comemorar, ainda que Natural odiasse usar coroas ou se comportar como um rei de fato.

    Eu também não era o maior fã de coroas na minha época – a voz que apenas N escutava era a de Eric, o Príncipe Negro.

    Após por as mãos em seu objetivo, Natural descobrira que as surpresas só estavam começando. Eric havia reencarnado no Rei dos Plasmas, e assim como Clara, aparecia para conversar e convencer N a cumprir seu papel como controlador de Zekrom.

    — É difícil se acostumar com alguém lendo sua mente – respondeu o rapaz de cabelos verdes.

    É difícil evitar – riu o príncipe. – Estou tão ansioso quanto você para libertarmos Zekrom e transformar o mundo em um lugar de ideais.

    — Quando vou conseguir convencer Zekrom a sair daqui? – questionou N, que era como uma criança curiosa.

    Talvez ainda faltem alguma motivação maior para que ele saia.

    — Eu ouvi dizer que existe a contraparte – comentou, se lembrando o que Kogsu havia comentando na sua festa de coroação. – Light Stone.

    A contraparte de Zekrom, Reshiram, é o dragão da verdade. Ambos só nasceram porque eu e minha irmã, Clara, escolhemos e acreditamos em caminhos diferentes.

    — Eu adoro ouvir história, Príncipe Eric – sorriu N, acariciando os pelos de Katrina, sua Purrloin, que dormia ao seu lado. – Se quiser me contar a sua.

    Você é um rapaz muito gentil – elogiou o Príncipe Negro. – Eu fui de uma época estranha. Admiro-me ver que hoje em dias as pessoas mudaram seus conceitos sobre amor.

    — Que tipo de amor?

    Os românticos, os casais, os que casam e vivem o resto da vida juntos. – explicou Eric, ainda um pouco receoso em tocar no assunto de uma vez, mesmo que N estivesse com uma expressão confusa. – Você ama alguém, Natural?

    N refletiu.

    — ... Eu amo os Pokémon.

    O príncipe riu.

    Sim, eu notei isso. Mas... – ele fez uma pausa. – Existe... alguém que mexe com as suas estruturas? Que te deixa incomodado? Que te faz querer sair da sua zona de conforto? Que só a presença dela te faz sentir em casa?

    Natural encolheu as pernas, tímido, confuso. Eric, em sua mente, conseguiu visualizar a figura de Susan, o que o fez rir.

    — Amor... é algo complicado pra mim – confessou N. – Eu amo todas as pessoas que amam os Pokémon. Mas não sei se é esse tipo de amor que você está se referindo. Eu amo a presença das minhas irmãs, Anthea e Concordia, elas me fazem me sentir bem, em casa. E tem a Susan, ela me deixa nervoso, tímido, agitado, me dá vontade de sair do lugar só de estar perto dela. Meu coração dói – ele contou.

    Eric quis acariciar o ombro do rapaz, mas sabia que era impossível. Sentiu toda a confusão que a mente inocente de um garoto simples tivera com aquela simples pergunta e concordava quando disseram que o rapaz era só uma tela em branco. E sabia também que a pureza daquele branco não teria espaço para preconceito.

    Eu amei um homem uma vez – confessou, percebendo que Natural apenas continuava a prestar atenção, sem um pingo de julgamento.

    — Ele te fazia sentir como? – questionou, como se tentasse aprender sobre amor.

    Como se eu fosse o último homem do mundo.

    — Isso não é meio trágico?

    Pelo contrário, ele me tratava como se não houvesse mais ninguém. Mas havia mais alguém – Eric suspirou. – Minha irmã, Clara. Ela também amava o mesmo homem.

    — Quem ele escolheu?

    Lembra que eu te falei que eu vim de uma época estranha? – perguntou o príncipe, cuidadoso com as palavras. – Natural, o que o senhor achar de um homem amando outro homem?

    N refletiu.

    — Hã... – ele ponderou. – A gente não escolhe quem vai amar, né? Ou melhor, não é normal que a gente ame todas as pessoas que nos fazem bem, independente de quem são.

    Uma resposta digna de uma pessoa inocente como uma criança – riu Eric.

    — Isso é ruim?

    Pelo contrário. Queria que as pessoas pensassem o mesmo – suspirou e coçou a garganta para continuar sua história. – Esse homem era um lorde. Naquela época, era um absurdo um homem estar com outro homem, então, nossos encontros eram as escondidas – contou. – Foram alguns anos até alguém descobrir.

    — Vocês foram punidos?

    Não, mas foi porque ele aceitou casar com Clara, minha irmã, pessoa que o amava também – revelou Eric, com a voz apática. – Uma semana antes do casamento, ele surgiu na minha porta, desesperado, dizendo que após o casamento, Clara proibiria de nos vermos.

    — Sua própria irmã? – N pareceu surpreso. – Ela não deveria te ajudar?

    Num mundo ideal, nós nem precisaríamos de ajuda, apenas seríamos felizes. O nosso único obstáculo seria quem seria o escolhido, mas isso seria uma livre opção.

    — E o que vocês fizeram?

    Nós fugimos. Ele me escolheu – apesar dessa informação, Eric não parecia feliz, e isso deixa N confuso. – Eu fiquei dias me remoendo, até que resolvi voltar a público com ele e revelar a verdade. No fundo, conseguia imaginar Clara nos acolhendo. Ela era minha irmã gêmea.

    — Pela sua voz, o final não foi feliz, né?

    Não – disse, com a voz baixa. – Ela surtou, me acusou de traição, disse palavras horríveis. Foi quando iniciamos a guerra. A guerra que destruiu Unova.

    Natural se manteve em silêncio, ele segurou a Dark Stone, acariciando sua superfície com delicadeza, procurando o que responder.

    — Amor causou isso? – perguntou o rapaz de cabelos verdes, refletindo para si mesmo. – Me disseram que amor era um sentimento bom.

    É um sentimento desgastante, algumas pessoas não lidam bem com ele.

    — Não, ele não é desgastante. Ele é renovador – Natural olhou para Katrina ao seu lado. – Quando eu me sinto cansado, eu olho para os Pokémon que eu tanto amo e me renovo. Eu quero que Zekrom me ajude a trazer um mundo ideal para eles, sem Pokéballs ou prisões.

    Você sabe que para isso, terá que confrontar a contraparte, Reshiram e Clara, que pensam diferente, certo?

    — Não quero que esse embate destrua Unova – confessou. – Mas, se for preciso para conseguir o que é certo, farei de tudo. E sabe, Eric, se eu conseguir, eu prometo que nesse mundo ideal, eu farei que todas as pessoas aceitem o amor independente da forma dele.

    Obrigado, meu nobre jovem. Zekrom está em mãos certas.

    — Eu vou procurar quem está responsável por Reshiram, quero conversar para saber o que pensa quem está do outro lado – concluiu N, logo depois, lembrou-se de algo que queria perguntar: - Ah, só por curiosidade, como era o nome desse lorde que você amava?

    Oh, o nome dele era Kyuu.

    — É um nome estranhamente familiar – refletiu o Rei dos Plasmas, ainda que ele não soubesse dizer quem era.

     

    A reunião no laboratório de Kogsu durou a manhã inteira praticamente, Tsuyo já resmungava de fome e se perguntava o motivo de ter ficado por tanto, já que sua única missão era ter avisado o cientista da tal reunião. Odiava se envolver tanto em algo.

    Kana ouvira sobre a invenção de Kogsu com admiração, contente em saber que seus poderes psíquicos e seus Pokemon seriam úteis para tal missão. Mas havia outra coisa que a interessava.

    — Você disse que precisa dos poderes psíquicos para dar a eles um cérebro, assim você pode controla-los – a mulher se virou para o cientista. – Mas e a alma? É possível dar alma para eles?

    — Kana – o homem deu uma risada rápida, não se preocupando muito com os sentimentos da mulher. – Essas criaturas só serviram para nos obedecerem. Elas não precisam ter vida própria.

    A de cabelos róseos colocou a mão em seu peito, acariciando um pequeno relógio de bolso que ela transformara em colar. O objeto era antigo, mas muito bem cuidado, com símbolos esculpidos no metal prata com formatos de lua, estrelas e alguns planetas. Seja lá qual fosse a história, Kana tinha um grande apreço.

    — De verdade, Kana, eu não recomendo que você se apegue a qualquer Pokémon de barro que criarmos – alertou o cientista.

    — C-Certo – respondeu, desanimada.

    — Aliás, mudando de assunto, a gente pode criar um nome? – questionou Kogsu, mudando até o tom de voz para algo mais descontraído. – Falar Pokémon de barro é muito entediante.

    — A última coisa que devemos nos preocupar é com nomes, Kogsu – Tsuyo cruzou os braços, entediado. – Temos que preparar os próx-

    — Pokénendos! – Ghetsis exclamou, surpreendendo os três Virtudes presentes. Era raro ver o líder perder seu jeito sério e se entregar com animação a algo, dava até para considera-lo humano com uma interação dessas. Ele notou os olhares surpresos e coçou a garganta com uma tosse seca: - Desculpe. Acho que seria interessante chama-los assim. Nendo significa barro em japonês.

    — Admiro sua cultura, senhor Ghetsis – disse Kana, tentando recuperar o ego do homem.

    — De toda forma, nosso próximo passo é atualizar os equipamentos de Kogsu – disse Ghetsis. – Irei me certificar que o senhor Jeffery Sanchéz vá nos patrocinar, por isso, peço que faça um relatório sobre isso.

    — Deixa comigo, chefia – o cientista assentiu.

    — Precisamos também de amostras de DNA – o líder olhou para o ninja. – Tsuyo, posso contar com você? Diga a seu pai, Zinzolin, que nos ofereça as forças da Shadow Triad para conseguir o maior número de Pokémon que foram libertos.

    — Peço perdão, senhor Ghetsis, mas eu estava encarregado em espalhar o Dream Mist, o que vai acontecer com essa missão? – questionou o ninja.

    — Passe isso para Izami e Izani, aqueles dois já ficaram parados por tempo demais – ordenou Ghetsis, sempre com uma resposta pronta.

    — Certo, senhor – apesar de contrariado, ele não estava com paciência para discutir. Gostava da praticidade que era espalhar o Dream Mist, já que passava a maior parte do tempo deitado enquanto seu Mandibuzz fazia o resto do trabalho.

    — Bem, a reunião de hoje é essa – Ghetsis encerrou a reunião como um exímio líder, mostrando que a palavra dele sempre era a última, apesar disso, virou-se para Kogsu: - Eu preciso falar exclusivamente com você.

    Os três Virtudes se entreolharam, tentando adivinhar o motivo da reunião super secreta. Como não obtiveram sucesso, Kana e Tsuyo se dirigiram para fora, voltando cada um para seus afazeres. Kogsu coçou a mão com certa ansiedade.

    — Aceita um café? – questionou o cientista.

    — Não bebo café antes do almoço – respondeu Ghetsis, um pouco seco. – Faz mal pro estômago.

    — C-claro – o homem gaguejou. Começara a pensar se o líder dos Plasmas descobrira que todo o dinheiro que investira nele estava sendo gasto com mulheres.

    — Estava pensando se poderíamos criar um Pokémon que seria capaz de superar todos os outros Pokémon – disse o mais velho, enfim, revelando o motivo da conversa.

    — Chefia, só se você criasse uma nova versão de Arceus – disse Kogsu, soltando uma ligeira risada.

    — Não, não. Não falo disso – explicou-se Ghetsis. – Eu tenho mania de grandeza, mas tenho pés no chão – ele sentou-se e gesticulou com as mãos. – Eu pensei em criar uma espécie de Leviathan.

    — Uma criatura enorme? – questionou Kogsu, procurando acompanhar o raciocínio de seu chefe.

    — Isso. Uma criatura enorme que causaria o terror. Que mostraria todo o poder dos Plasmas, que ninguém pode entrar em nosso caminho – o líder dos Plasmas contava aquilo como se imaginasse seu império naquele pequeno plano. – Acha que consegue imaginar uma criatura assim? Sei que provavelmente pensou em Reshiram e Zekrom.

    — Na verdade, chefia – sorriu o cientista. – Existe um terceiro elemento.

    Kogsu se aproximou de uma prateleira de livros e como bom estudioso, retirou um livro de capa marrom e folheou as páginas, parando em uma delas. Se aproximou de Ghetsis novamente e começou a ler:

    “Quando o equilíbrio é quebrado, dois dragões nasceram: Reshiram e Zekrom. Entretanto, a casca vazia deixada deu a origem ao terceiro dragão da Tao Trio” – ele virou a página e olhou rapidamente para seu chefe. – “O terceiro dragão representa o vazio, o nada, a parte que falta, o pote, molde, o zero: Kyurem”.

    — Não pode ser! – exclamou Ghetsis.

    — Se Reshiram e Zekrom existem e foram considerados lendas, nada impede que Kyurem exista – revelou Kogsu, fechando o livro. – Kyurem é perfeito para o que queremos. Ele é uma casca vazia, ele pode se transformar em tudo aqui que você quiser.

    — Kogsu, comece as pesquisas, use o dinheiro que precisar. Vamos descobrir se esse Pokémon realmente existe e se existe alguma forma de o obtermos – Ghetsis se levantou. – É sempre um prazer fazer negócios com você.

    — Estou à disposição, chefia – sorriu o cientista.

    Quando o líder dos Plasmas deixou a sala sem nenhuma preocupação em se despedir, Kogsu suspirou e afrouxou a camisa, sentando-se na cadeira confortável, ligando seu celular novamente, ansioso em voltar para a sua jogatina.

    — Bom, pelo menos posso usar esse dinheiro pra comprar skins novas para a minha querida Jackie – debochou ele, rindo sozinho. 


          

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