• Arquivos : Especial de Natal


    (O capítulo seguinte não é canônico e acompanha fatos que aconteceram até o capítulo 37)

    Hilda terminou de colocar a última esfera vermelha brilhante em um dos galhos do enorme pinheiro e deu dois passos para trás, analisando sua obra. O sorriso satisfeito veio quando ela acendeu as famosas luzes pisca-pisca que iluminaram a árvore como uma verdadeira magia.

    De fato, o Natal era uma data mágica. Não sabia dizer ao certo como aquela data fazia isso, mas era só se aproximar da data que todo mundo parecia entrar um espirito de família, união e gratidão. Hilda adorava os preparativos, se sentia agitada para pensar com carinho quais cores combinariam mais e ficariam harmoniosas, faltava um mês e montar o pinheiro era só a primeira parte.

    Ainda faltavam decidir os pratos para a tão esperada noite, as roupas para o evento, pensar e comprar os mais variados presentes, além de ajudar Oliver a escrever sua preciosa carta para o Papai Noel. A garota Unoviana refletia tanto que mal notou quando Inari parou ao seu lado.

    — Acho que nunca vi uma árvore de Natal tão alta desde as que montavam em Ecruteak no meio da cidade – observou a sacerdotisa. Hilda deu um pulo:

    — Ah, é – ela processou a informação. – Minha tia Maisy sempre quis uma árvore que combinasse com o tamanho do nosso apartamento. Eu lembro quando ela chegou, eu tinha uns 5 anos – contou Hilda, toda apegada com a data. – No mesmo ano, ela anunciou a gravidez. Foi uma emoção danada.

    Inari sorriu gentilmente, como sempre. Adorava ouvir as histórias das pessoas e sempre reparava no brilho no olhar que acompanhava a narrativa. Os olhos da Foley brilhavam mais que as luzes do pinheiro.

    — E você, Inari, tem alguma história legal envolvendo o natal? – questionou a amiga.

    — Oh – a ruiva levou a mão até o peito, apreensiva. – Hã... Na verdade... Eu não gosto muito do natal.

    — Como é?! – Hilda exclamou, incrédula.

    — G-Gomen, Hilda – Inari se distanciou levemente, evitando prolongar o assunto. – Eu juro que não é nada demais, é só uma opinião, mas eu juro que eu admiro muito esse espírito que as pessoas tem e as apoio. O melhor do Natal é poder fazer aquilo que quer com as pessoas que te querem bem.

    A sacerdotisa logo saiu, deixando Hilda sem chance de resposta.

    Ansiosa, ela odiava como tudo não estava perfeito e quando nem todos estavam no mesmo ritmo que ela, parecia que tinha feito algo errado ou vacilado com a pessoa. Nervosa, ela começou a pensar em como trazer Inari para o mesmo espírito, as roupas e os presentes poderiam esperar.

     

    Num apartamento grande como os do Foley, Maisy fazia questão que todos os ambientes fossem decorados e isso incluía decorar as janelas com luzes. O problema era que lidar com fio enrolados era uma tarefa insuportável, e ninguém melhor que Hilbert, Vic e Jackson para resolver isso.

    — EU JÁ FALEI PRA VOCÊ PASSAR ESSE LADO POR BAIXO! – berrou o treinador.

    FOI O QUE EU FIZ! SÓ QUE VOCÊ TEM O SENSO DE COORDENAÇÃO DE UMA SPINDA! – retrucou Vic. – VOCÊ CONSEGUIU ENROLAR MAIS AINDA!

    — ESCUTA AQUI, VOCÊS DOIS! – a voz de Jackson se ergueu. – A OBRIGAÇÃO DE VOCÊS É OUVIREM MINHAS INSTRUÇÕES!

    — CALA A BOCA, JACK! VOCÊ MAL SABE A DIFERENÇA ENTRE ESQUERDA E DIREITA!

    O arqueólogo agarrou os fios das mãos dos amigos e começou a desenrolar por conta própria o enorme fio, impaciente. Hilbert observou, mas logo resolveu intervir:

    — IRMÃO, VOCÊ TÁ FAZENDO TUDO ERRADO!

    O treinador puxou o fio, mas Jack resistiu e não deixou.

    — Hilbert, não força a amizade – retrucou o arqueólogo. – Eu to conseguindo!

    Os dois tão fazendo merda!

    Vic foi o terceiro a entrar naquela guerra de cabo. Era puxa de lá e estica de lá que ninguém soube exatamente em que momento toda aquela confusão terminou nos três presos pelo cabo que tanto disputavam.

    Hilda se aproximou com o olhar desaprovador. Se perguntava como era possível reunir em seu grupo pessoas que compartilhavam o mesmo neurônio.

    — Jack, eu esperava mais de você – argumentou a garota.

    — Vocês depositam muita expectativa em mim – respondeu o arqueólogo, tentando soltar os braços. – Eu sou só um otaku, gamer e colecionador. HILBERT, CUIDADO COM ESSE CHIFRE!

    Hilbert virou o rosto.

    — Hilda, ajuda aqui.

    — Hilbert, de você eu não esperava nada mesmo, mas eu juro que se você quebrar uma luz sequer, eu mesma arranco esses chifres – a voz de Hilda era tão ameaçadora e suava ao mesmo tempo que Hilbert rezou por sua vida.

    Com a destreza de quem realmente sabia o que fazer, Hilda conseguiu libertar seus prisioneiros e ainda desenrolar o fio como deveria ser feito. Para a sorte de Hilbert, todas as luzes estavam intactas.

    — Ei, preciso falar com vocês. É sobre a Inari – a Foley chamou a atenção dos colegas para um assunto mais sério. Jackson parecia mais atento.

    — O que tem ela?

    — Ela me disse que não gosta do Natal! – respondeu Hilda, parecendo bem afetada com o fato de alguém não compartilhar o mesmo clima natalino.

    Eu realmente não entendo os feriados dos humanos – disse Vic.

    — Basicamente são dias que as pessoas chegaram num consenso que seria uma data especial. Algumas são comemoradas, outras são para descansar, tudo depende da cultura de cada um – explicou Jackson.

    — COMEMORADAS! – exclamou Hilda, enfatizando a fala do amigo. – Natal é para ser comemorado, é uma época mágica de partilha, paz, família, de agradecer e renovar as esperanças. É ver o brilho nos olhos das pessoas, onde não existe problemas – uma completa entusiasta da data, a Foley estufava o peito. – Desde montar a árvore de natal, enrolar as luzes em volta do pinheiro, ir as compras e escolher os presentes, pensar com carinho no que será servido na ceia.

    — Que, particularmente, é melhor parte – apontou Hilbert, se referindo a ceia. – Minha mãe lotava a mesa, mesmo sendo só nós dois na maioria das vezes.

    — Eu gosto de procurar presentes para minha família – contou Jack, como se quisesse compartilhar memórias. – Quase nunca deixo alguém para trás.

    Bem, não tenho nada pra compartilhar, mas admito que ouvi sua tia falando sobre o cardápio e acredito que será apetitosa – disse Vic, salivando.

    — Tá vendo? Não tem como alguém simplesmente não gostar da data – argumentou Hilda.

    — Calma lá, Hilda – Jack levantou a mão, num sinal de espera. – Eu entendo seu espírito natalino, mas não é todo muito que gosta. Pode ter algum motivo mais profundo e pessoal, o máximo que a gente pode fazer é fazê-la se sentir confortável pra fazer o que ela quiser e-

    — NÓS VAMOS FAZER O ESPÍRITO DE NATAL NASCER NELA! – ignorando o colega, a garota de Castelia deu alguns pulinhos. – Quando eu era criança, eu amava ir ao Shopping e visitar o Papai Noel, talvez trazer essa experiência possa despertar esse espírito.

    — Vai levar ela pra ver o Papai Noel no Shopping? – questionou Jackson, cruzando os braços.

    — EU TOPO! EU TOPO! – animou-se Hilbert.

    — CALMA LÁ! – Hilda pediu silêncio, tentando formular seu plano. – Não precisamos leva-la. Podemos fazer tudo aqui em casa.

    O silêncio predominou na sala. O quarteto se encarava, tentando processar o plano de Hilda e nas possibilidades que ele traria. A garota agitou os braços, começando a se incomodar com tamanho tempo sem sequer uma resposta.

    — Gente, o que foi?

    — Olha Hilda, a gente já entendeu que você tem muito dinheiro – disse Jack. – Mas comprar o Papai Noel não vai meio contra com o que o Natal prega? – perguntou, com a mão no queixo, gastando alguns neurônios para procurar alguma resposta também.

    — Comprar o Papai Noel? Não! Não, não, não! – defendeu-se a garota. – Eu não falei de comprar um papai noel, e sim, de nós, com fantasia, trazermos o espírito de natal para ela.

    Basicamente todo mundo vai se vestir de Papai Noel?

    — Temos algumas opções – o sorriso de Hilda foi tão malicioso que os outros três tremeram na base. – E eu tenho um perfeito para o Hilbert.

    — Se você vai fazer a piada com o Rudolph, saiba que tá uns sete anos atrasada! – Hilbert levantou-se, adivinhando os planos da amiga, deixando-a em desvantagem. Ele a encarou como quem ganhasse uma batalha interna.

    Quem é Rudolph? – questionou Vic.

    — É uma história infantil sobre um Stantler que tinha um nariz vermelho e era zoado pelos amigos por isso, aí ele fez umas coisas e salvou o natal – explicou Jackson, fazendo o Victini rir do resumo.

    Eu estou impressionado com o tanto de coincidência. Quem inspirou quem?

    — Enfim, você aceita ou não? – Hilda cruzou os braços.

    — Só vou aceitar pela Inari – assentiu o treinador, recebendo um tapa leve no ombro da amiga, em sinal de agradecimento. – Quem vai ser o Papai Noel?

    Hilda desviou seu olhar para Jackson e Vic, que também trocaram olhares. O Victini deu de ombros quando o arqueólogo lhe lançou um olhar de imploração.

    Vai ser o Jack, aparentemente ele tá desesperado pra mostrar o saco cheio de presentes dele pra Inari – debochou o Pokémon, recebendo um olhar fuzilante de Jackson. Hilda cobriu o rosto de vergonha.

    — Vocês estão destruindo todo o espírito puro do Natal, seus depravados!

    — O Vic vai ser um elfo! – Hilbert levantou a mão, mudando o rumo da conversa. – Olha só, ele é baixinho e tem orelhas pontudas! Ele é perfeito para um ajudante do Papai Noel! – quando terminou, o garoto sorriu satisfeito com a sua sugestão.

    Vic cruzou os braços, com um olhar tedioso.

    Irmão, você é a última pessoa que tem propriedade pra me chamar de baixinho. Eu tenho um tamanho adequado para um Victini.

    — Eu gostei da ideia – disse Hilda. – Acho que só me restou ser a Mamãe Noel.

    E o Papai Noel é casado por acaso? ­– questionou Vic.

    — Sim, com a Mary – respondeu Jack.

    Mary?

    — Mary Christmas – brincou o arqueólogo. Hilda cobriu o rosto e Vic revirou os olhos

    — Mas nem ferrando! – interrompeu Hilbert, exclamando ao lado da amiga. – Você é pesada e eu sou um Stantler só! O trenó nem vai sair do lugar.

    A Foley fechou o punho e a veia de seu pescoço saltou, o clima natalino sumiu e ela acertou um soco contra o nariz do menino.

    Agora sim o Hilbert tá entrando no personagem – Vic se aproximou do amigo e observou. – O nariz vermelho ele já tem. Mais natural, impossível.

     

    Chegava a ser cômico um grupo de jovens em uma loja de fantasias dominada por pessoas mais velhas ou crianças. A vendedora que os atendeu foi gentil, já que estava acostumada com a grande procura de fantasias natalinas na época. Hilbert brincava com alguns itens enquanto Hilda e Jackson estavam realmente empenhados na missão.

    — Eu não sei exatamente se a fantasia de Papai Noel vai cair bem no senhor – disse a vendedora, procurando nas araras o famoso traje vermelho. – Geralmente são pessoas mais gordinhas que compram, então procuramos sempre números maiores – explicou, retirando uma peça pendurada no cabide. – Mas, como o Natal é e deve ser para todos, eu acho que esse vai servir em você. Pode experimentar, se quiser.

    Jackson agradeceu e se dirigiu aos provadores. Hilda procurava em outra arara roupas para ela e para Hilbert.

    — Você disse que precisa de roupas para Mamãe Noel e mais quem? – questionou a vendedora, dando atenção a garota.

    — Do Rudolph, o Stantler do nariz vermelho – a morena apontou para o treinador que brincava com o brinquedo de um Papai Noel dançarino. – É para aquele idiota ali.  

    A funcionária riu e começou a sua busca, retirando logo de cara o vestuário pedido.

    — Esse daqui é completo, é um macacão marrom – explicou, com um sorriso típico da profissão. – Tem uma bolinha vermelha para colocar no nariz, e o mais importante, uma tiara com os famosos chifres.

    “Nem vai ser necessário”, riu Hilda para si mesma, analisando a fantasia. O tecido conseguia imitar a sensação de estar acariciando um legítimo Stantler. Ela chamou pelo amigo, que se aproximou.

    — Achei sua fantasia, quer experimentar?

    — Vamos fazer o máximo para que o menor número de pessoas possível me veja passando vergonha – negou o garoto.

    — Ah, você vai ficar uma graça – brincou Hilda. – Vem até o nariz vermelho.

    — Você já me deu um hoje de manhã – ironizou, se aproximando do ouvido da amiga, sussurrando: - E a fantasia do Vi? Não é como se eles vendessem o tamanho ‘Victini’.

    — Eu vou dar um jeito – respondeu a garota, sussurrando também. - Qualquer coisa a gente passa num Poké Shop, eles devem ter fantasias para Pokémon.

    Eu amo o conceito de vocês estarem discutindo como se eu fosse um Lillipup de estimação – resmungou Vic, na bolsa de Hilbert.

    O barulho de cortina arrastando chamou a atenção dos três e da vendedora. Jackson saiu do pequeno provador com sua fantasia de Papai Noel, que tinha lhe caído muito bem, mas o detalhe estava em como ele usava a tradicional camisa: aberta. Por baixo dela, uma regata branca justa que marcava boa parte de seu tórax definido, fazendo com que a vendedora não conseguisse desviar o olhar, hipnotizada com a ousadia do arqueólogo.

    — Acho que a gente pode inovar um pouco – disse Jackson. – Um Papai Noel mais jovem, uma parada mais sexy. Talvez se eu chegasse com a touca na boca – ele colocou a peça do vestuário na boca, soltando um sorriso travesso. – O que acham?

    A vendedora cobriu a região do nariz, levantando o polegar em sinal de aprovação. Hilda revirou os olhos, com vergonha.

    — Ok, senhor gostosão, você está estragando o Natal. Feche essa roupa e coloque a touca como um bom Papai Noel.

    — Você está atrapalhando minha liberdade criativa, Hilda – argumentou Jack. – A Inari tem a minha idade, se a gente tornar essa figura menos infantil, talvez vá entreter ela mais.

    — Se a senhora Yukiko descobre que você tentou seduzir a neta dela vestido de Papai Noel, tenho certeza que ela vai acertar tantas bengalas em você até você cantar Jingle Bell – disse Hilda.

    Jackson refletiu sobre as possibilidades e vestiu o gorro vermelho na cabeça e ajeitou a roupa, sorrindo sem graça.

    — Eu acho melhor a gente manter o tradicional, né? – riu o arqueólogo, nervoso.

    — Ok. Só falta uma coisa – a morena se virou para a funcionária que os atendia, que ainda se recuperava do fato anterior. – Você teria uma fantasia de elfo natalino para uma pessoa de uns – ela coçou o cabelo, nervosa. – 40 centímetros?

    A vendedora arqueou a sobrancelha, fazendo uma expressão de dúvida, tentando processar o pedido da garota.

    — Você diz fantasias para bebês?

    — I-isso! Isso! – a menina riu da própria ignorância.

    Hilbert segurou a risada e Vic resmungou algo sobre preferir ser tratado como um bicho de estimação.

     

    Inari estava confusa com o repentino pedido de Hilda em ficar no corredor do lado de fora da casa dos Foley. A morena parecia ansiosa e nervosa quando fez o pedido e ela aceitou sem reclamar, tentando adivinhar mentalmente o que ela e o seu novo grupo de amigos estaria aprontando. Ouviu alguns barulhos, a maioria era de Hilda discutindo com Hilbert, e isso a fez rir.

    Hilda logo abriu a porta da entrada com um sorriso ansioso. A sacerdotisa logo se virou e estranhou os trajes natalinos da amiga, consistindo em um vestido vermelho na altura do joelho, botas com pompons e um belo gorro triangular.

    — T-Tudo pronto, Ina – anunciou a morena. – Você já pode entrar. Seja bem-vindo ao nosso Natal.

    A garota segurou a mão da mais velha e a guiou para dentro do apartamento, que foi recepcionada pela árvore iluminada recém montada por Hilda, por estarem próximos da noite, as luzes ficavam mais fortes e bonitas. A sala de estar estava decorada, com os leds montados por Hilbert, Vic e Jackson, o chão estava forrado com tapetes verdes e vermelhos, além de estatuetas de Stantlers e alguns duendes simpáticos. Do meio dessas figuras, surgiu Hilbert, com seu traje de Rudolph e um sorriso envergonhado no rosto, tão vermelho quanto seu nariz, fazendo Inari conter um riso, achando-o fofo com aquele traje.

    O menino se aproximou e vestiu o famoso gorro na cabeça da sacerdotisa. A ruiva não pode deixar de observar os chifres de nascença dele e se admirou com o fato dele os mostrar sem preocupação. Vic logo surgiu, com um belo traje de duende de tons esverdeados com dizeres nas costas: “Our little Baby Elf”. O Victini notou que Inari segurava o riso e ele retribuir dando de ombros.

    Não vendem roupas de elfos para Victinis – sussurrou, colocando um cachecol quentinho na mulher.

    — Agora que você está devidamente vestida para o Natal, o que acha de conhecer o Papai Noel? – disse Hilda, segurando o ombro da amiga e apontando para frente.

    Inari desviou seu olhar para a direção e corou. Jackson estava sentado informalmente em uma poltrona decorada com um traje de uma das principais figuras do Natal, só que sem a famosa barba longa e branca. Ele sorriu como um galã que era e fez sua apresentação:

    — Olá, senhorita. Eu sou o Papai Noel, estou ansioso para ouvir o que você quer de Natal.

    — JACKSON! CADÊ A SUA BARBA?! – berrou Hilda, quebrando completamente o clima. – E senta direito!

    — EU ODEIO BARBA! Elas pinicam e ficam fazendo cócegas – argumentou o arqueólogo. – Já me viu com barba? Não! Porque eu sempre a corto.

    A Hilda ameaçou todo mundo para não sair do papel e ela foi a primeira a destruir tudo – resmungou Vic.

    — Eu até ia falar alguma coisa, mas eu lembrei que sou um Stantler do nariz vermelho que não fala – o treinador passou um zíper imaginário em sua boca.

    Inari apenas observava a confusão generalizada com absoluto silêncio e a testa franzida. Jackson coçou a garganta, ajeitou-se na poltrona e recuperou um pouco dignidade.

    — Ignora o fato de eu não ser um Papai Noel de barba, Inari-senpai – ele deu leves tapas em sua perna esquerda, indicando para que a sacerdotisa se sentasse. – Vem aqui me contar o que você deseja de Natal.

    O rosto de Inari ruborizou com o convite e ela ficou estática.

    — O JACKSON QUEBROU A INARI! – berrou Hilbert, preocupado.

    Eu falei que era uma péssima ideia colocar o mais depravado do grupo como a figura pura e inocente do Natal! – disse Vic, dando suporte para Inari, que com certeza cairia se não fosse segurada.

    — Eu tô tentando ficar no papel, ok? – defendeu-se Jack.

    — Ela vai deixar de odiar o Natal pra pegar trauma dele! – resmungou Hilda, ajudando a amiga a sentar-se sobre a perna do amigo, que segurou a cintura da ruiva para impedir que ela caísse.

    Inari se recuperou e olhou para Hilda.

    — D-Desculpe Inari – disse a Foley. – Isso daqui era só uma tentativa da gente de despertar o espirito de Natal em você. Quando você disse que não gostava do Natal, eu fiquei desesperada, queria que todo mundo perto de mim pudesse sentir o pouquinho que eu sentia quando era criança ao escrever cartas pedindo presentes, ajudando na decoração ou só passando o tempo com a minha família – confessou a morena, envergonhada. – Eu nem pensei nos seus motivos pessoais e ainda forcei todos a participarem disso.

    — Foi bem divertido, na verdade – contou Hilbert, com um sorriso ensolarado. – Quando eu era criança, odiava esse apelido, mas com vocês, é diferente.

    Eu até que gostei dessa roupinha de bebê – brincou Vic.

    — ... Eu não odeio o Natal – disse Inari, recebendo a atenção de todos. – É uma época divertida em Johto, as pessoas saem com os amigos, comemos bolos e trocamos presentes. Eu fiz muito disse por lá.

    Jackson olhou para a sacerdotisa, tentando ler a mente dela.

    — Mas... – ele insistiu para que ela continuasse.

    — Mas... Por uma infeliz coincidência, eu perdi meus pais uma semana antes do Natal – contou a ruiva. – Apesar de fazer muito tempo, é apenas um momento de tristeza que eu tenho todo ano.

    — S-sentimos muito – disse Hilda, com a voz baixa.

    — Porém, eu disse que o melhor dessa data é comemorar com as pessoas que nos fazem bem – sorriu ela, gentil. – E vocês são basicamente minha nova família, então eu sou grata por vocês estarem se esforçando para me fazer feliz.

    Hilda não conteve a emoção e abraçou a amiga.

    — Feliz Natal, Inari!

    — Hilda, falta alguns dias pro Natal ainda – apontou o treinador.

    — Fica quieto, Stantlers não falam – riu Hilda, enxugando as lágrimas. – Já sei, vou buscar alguns biscoitos para nós – a adolescente se levantou e correu para a cozinha, levando consigo Hilbert.

    Inari riu, mantendo a postura ereta, tentando conter a ansiedade ao notar a situação em que estava. Jackson suspirou.

    — Tudo teria se resolvido com uma conversa – disse, brincando com o gorro natalino.

    — Não vou mentir, achei tudo isso fantástico – riu a sacerdotisa, olhando para o amigo. – Achei que o traje de Papai Noel combinou com você.

    Jack lançou um sorriso malandro para a colega e passou o braço em volta dos ombros de Inari, depois, puxou-a para um pouco mais dele e sussurrou em seu ouvido:

    — Você foi uma boa menina esse ano?

    A sacerdotisa sentiu seu corpo esquentar e sobrecarregar com tanta informação e sentimento, sua cabeça tombou para trás, como se tivesse parado de funcionar. O arqueólogo riu e Vic olhou preocupado:

    HILDA, O JACKSON QUEBROU A INARI DE NOVO!

     

    Feliz Natal e Boas Festas <3

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  • Capítulo 37



    Odiava a luz do dia. Achava desnecessário ter contato com a luminosidade do sol. Seu maior nêmesis era acordar cedo e não se julgava preguiçoso ou vagabundo por isso, apenas se definia como uma pessoa com hábitos noturnos. Mas não tinha nada que pudesse fazer, em uma decisão unânime da sociedade e seus longos anos de história, o período produtivo escolhido era quando o sol começasse a surgir.

    Sol esse que Tsuyo não tinha costume de ver. O Castelo dos Plasmas estava construído no subterrâneo, então os arquitetos e engenheiros tiveram que se desdobrar para trazer uma iluminação que não deixasse os ambientes superficiais.

    Conforme ele avançava pelos corredores entediantes e sua exagerada repetição de colunas e padrões de off-white e dourado, mais ele tinha certeza que arquitetura clássica era antiquada o suficiente para ele. Sua missão, dada diretamente por Ghetsis, era só uma: Convocar Kogsu para uma reunião. Primeiro, ele praguejou sobre como o líder era sem noção. Depois, aceitou com muita insistência, mesmo sabendo que o playboy gênio era uma criatura deveras difícil de se lidar.

    A ala dAs Virtudes contava com diversos quartos e espaços dedicados somente para os filhos dos Sete Sábios, grupo de alto escalão na Team Plasma. Grupo este que defendia a libertação dos Pokémon alegando que os humanos usavam as criaturas para seu próprio prazer, sem pensar no que eles realmente queriam. Crença maravilhosa, se não fosse as atitudes questionáveis.

    Tsuyo parou em uma das portas e bateu com certa impaciência, nem um pouco preocupado em saber se Kogsu estaria dormindo ou não. Logo em seguida, ouviu burburinhos e risadas maliciosas, indicando que o cientista não estava sozinho, coisa que o ninja já teorizava o que poderia significar, o que o fez revirar os olhos.

    A enorme porta se abriu e Kogsu encarou o uniformizado Tsuyo. O cientista usava calças de moletom e o tronco nu, o cabelo azul petróleo chegava até os ombros e estava bagunçado. Por cima dos ombros dele, era possível ver duas mulheres seminuas deitadas na cama bagunçada, comprovando a teoria que o Virtude havia se divertido.

    — Bom dia, Tsuyo – cumprimentou ele, casualmente. – Veio se juntar a nós? – perguntou, em provocação.

    — O Ghetsis quer falar com você – sem interesse em ser cordial, Tsuyo depositou a informação, curto e grosso.

    O cientista ignorou a informação anterior e segurou o queixo do ninja, que estava sem sua usual máscara, exibindo uma cicatriz em formato de X na região da mandíbula direita. Aproximou os rostos, utilizando o máximo de seu charme para fazer um convite especial.

    — Tem certeza que não quer se juntar? Já adianto que eu não vou te dividir – os lábios se aproximaram, mas um terceiro personagem se juntou a soma.

    A Liepard de Tsuyo se mostrou possessiva, usando suas unhas para quase atingir o cientista, que recuou, rindo. A leopardo rodeou as pernas de seu mestre, enquanto o mesmo continuava sem emoção.

    — Aparentemente, eu não sou o único ciumento aqui – observou Kogsu. – Adoro uma boa disputa – ele se virou para dentro do quarto, mudando o tom de voz para algo mais doce (o que não combinava com ele). – Meninas? Infelizmente, o gostosão de vocês precisar trabalhar. Mas eu espero vê-las a noite.

    As duas mulheres soltaram resmungos estereotipados e superficiais de reprovação. Em minutos, elas pegaram suas vestimentas curtas e se aproximaram, depositando cada uma, um beijo molhado e caloroso no lábio do Plasma, e saíram, conversando sobre qualquer outro assunto.

    — Onde é que você arruma esse tipo de gente? – questionou Tsuyo.

    — Quer o contato delas ou isso foi ciúmes? – provou o outro, vestido uma calça jeans e uma camisa social. O ninja desviou o olhar, não muito surpreso com a depravação do colega.

    — Nenhum dos dois. Toda semana você traz alguém de fora – apontou. – Me preocupo se você vai ser o idiota que traga outro idiota que acabe por vazar nossa localização.

    — O quê? Acha que eu saio com espiãs? – riu Kogsu, fechando a porta do seu quarto, se posicionando no corredor. – Não se preocupe, Tsuyo, essas belezinhas ganham o dobro para ficarem quietinhas. E eu sou muito seletivo com as minhas damas.

    — É com isso que você gasta? Por isso vive pedindo o dobro de dinheiro pro Ghetsis – ironizou o de cabelos brancos, caminhando ao lado do colega.

    — Se ele paga, é porque tem – o outro deu de ombros.

    Apesar do visual que remetia a uma arquitetura medieval com cúpulas ovadas e arcos curvados, o local possuía tecnologia de ponta, sendo uma ofensa para os mais cultos. Câmeras de segurança, dispositivos com digitais e enormes elevadores asseguravam toda a circulação segura das centenas de pessoas que viviam no Castelo dos Plasmas. Kogsu acionou o elevador com um botão, e casualmente, ele e Tsuyo se dirigiram para um andar mais baixo que ligava o corredor branco com luzes de led até uma porta dupla igualmente da mesma cor.

    Como se tivesse saindo de uma série medieval e adentrado num seriado de ficção cientifica, o laboratório dos Plasmas era o local favorito de Kogsu. Era lá que todos os estudos e informações possíveis saíam e moviam os planos da equipe. Cheio de aparelhos, tubos de ensaio e computadores modernos lotavam o local.

    O cientista vestiu um jaleco branco com o famoso brasão da equipe nas costas como se fosse um uniforme, sentou-se em uma cadeira, aguardando aquele que convocara a reunião.

    — O que Ghetsis quer?

    — É sobre sua nova invenção – contou o ninja.

    — Aaah, finalmente meus meses de estudo vão receber a atenção que merecem – debochou o rapaz. – Ele mesmo me pediu esse estudo, mas depois resolveu brincar de xadrez com o filhinho dele.

    — Você sabe que ele precisa manter a imagem da Team Plasma limpa – argumentou o outro. – Quanto menos gente desconfiando das merdas que fazemos, mais agimos nas sombras.

    Kogsu e Tsuyo se mantiveram em silêncio por um tempo. Os sons ambientes eram os únicos audíveis, barulhos entediantes semelhantes com de um hospital. O cientista estralou o pescoço levemente, soltando algumas onomatopeias que indicavam sua impaciência em esperar. Procurou nos bolsos seu celular, segurando-o na posição vertical enquanto Tsuyo observava com certa curiosidade o que o companheiro faria. Quando o som de uma música alegre de um jogo tocou do pequeno aparelho, o ninja cobriu o rosto de vergonha.

    — Tá de zoera que você vai jogar? – questionou, só para ter certeza.

    — A culpa não é minha se o Ghetsis tá demorando – respondeu o rapaz, colocando os pés na mesa. – Uma partida de Pokémon Unite não vai matar ninguém, tenho missões diárias pra fazer. Quer jogar?

    — Eu passo – Tsuyo levantou a mão em resposta, andando pelo laboratório.

    O cientista começou sua jogatina enquanto conversava com seu próprio telefone, usando alguns termos que o próprio ninja não entendia ou tentava entender. Kogsu sorriu e comentou sobre como adorava jogar com uma garota conhecida como Jackie.

    — Ela é muito boa com Greninja e Zeraora, cara – sorriu ele, como um adolescente apaixonado por seu namoro virtual. – Admito que já paguei umas skins pra ela.

    — Você já não me surpreende mais – ironizou o ninja. – Logo, você a chama pra cá e descobre que ela é um cara de 40 anos que ainda mora com a mãe.

    — Vira sua boca pra lá – riu Kogsu.

    Atento como era, o ninja virou seu olhar para a porta de entrada e como uma assombração, Ghetsis entrou, com sua usual roupa, com seu semblante sério e enigmático. Tsuyo se manteve neutro quanto a entrada do chefe, enquanto Kogsu quase jogou o celular no chão, tentando manter sua pose. Levantou-se com rapidez e ajeitou o jaleco.

    — Bom dia, chefia – cumprimentou. – Primeiro, agradeço a reunião, estou ansioso para mostrar o resultado dos meus estudos.

    — Estou curioso pra saber o que você fez pra aumentar o poderio da Team Plasma – disse o líder, sem se preocupar com saudações formais.

    — Certo – Kogsu sorriu falsamente, tirando um pano que cobria algumas coisas em cima de uma das mesas.

    Tsuyo se aproximou, com uma expressão tão incrédula quanto a de Ghetsis. Além de papéis com diversas anotações, um cubo de vidro deixava em exposição um punhado de barro em um formato de pirâmide. O líder dos Plasmas piscou lentamente algumas vezes e encarou o cientista.

    — Te paguei pra você me trazer barro? – questionou ele, fazendo o ninja segurar a risada.

    — Não é só barro, chefe – explicou Kogsu. – O barro, ou a argila, são materiais naturais que são moldáveis. As pessoas usam para construção ou artesanato. Onde eu quero chegar? Bem, você vai ver – o cientista se aproximou da Liepard de Tsuyo e arrancou um pequeno pelo do Pokémon, que arrepiou, ameaçando atacar, mas logo foi impedida por seu dono.

    Ele voltou para sua mesa de trabalho e depositou a amostra recolhida numa pequena máquina acoplada ao cubo com o barro. O equipamento agiu como um scanner, analisando o que fora depositada em seu interior, alguns ruídos eletrônicos acionaram pequenas garras que se movimentaram e começaram a trabalhar com a argila. Foram longos minutos até que a obra se completasse.

    Uma cópia perfeita da Liepard de Tsuyo em escala reduzida acabara de ser feita, mas aquilo não impressionou Ghetsis, que olhou irritado para o cientista.

    — Você passou meses estudando pra desenvolver uma máquina de esculpir? – questionou. – Eu não preciso de esculturas novas, Kogsu, eu preciso de poder.

    — Chefia, se me permite, a melhor parte ainda não chegou – respondeu o outro, se gabando um pouco. – Observe – o cientista procurou uma Pokéball em seus bolsos e liberou o Elgyem usado nos acontecimentos de Nacrene.

    O comando dado pelo homem fez os olhos e as esferas nas mãos do Pokémon brilharem, indicando que ele estava usando algum golpe psíquico. Kogsu pegou dois fios coloridos e conectou a máquina com as mãos do Elgyem, que continuava concentrado. Tsuyo e Ghetsis olhavam cada movimento feito pelo rapaz, ansiosos para o que viria em seguida.

    Talvez pudesse ser chamado de milagre, ainda que fosse pura ciência misturada com poderes psíquicos, mas a escultura de Liepard ganhou vida própria. Ela não agia como um boneco, seus movimentos eram precisos, como se todos os músculos e ossos estivessem ali presentes. A leopardo real observava aquilo com certa atenção e admiração, como se reconhecesse aquele pequeno Pokémon de barro como um dos seus. Apesar da movimentação viva, a pequena criatura agia como ela era: Controlada e vazia, não que isso fosse um problema para Ghetsis, que soltou uma exclamação de satisfação.

    — Isso... é incrível!

    — Agradeço, chefia – sorriu o cientista. – Se me permite, posso dizer que isso está em fase de testes. Na verdade, seria muito interessante se pudéssemos expandir o tamanho desses Pokémon para uma escala real.

    — Poderíamos criar um exército dessas criaturas – complementou o líder dos Plasmas.

    — Com um tamanho maior dessa máquina, posso até criar atualizações que nos permitam modificar os Pokémon, misturando o melhor de cada criatura. E tudo que eu vou precisar são amostras de DNA.

    — Podemos usar alguns Pokémon que temos a nossa disposição – refletiu Ghetsis, com a mão no queixo.

    — Se me permite, chefe – Tsuyo levantou a mão. – Com o avanço da missão de convencer as pessoas de “libertarem” seus Pokémon, temos muitas criaturas poderosas de treinadores perdidos por aí.

    — Isso é genial, Tsuyo – o êxtase do líder o fez sorrir de maneira bizarra. – Com esse avanço, poderemos criar criaturas com poder absurdo.

    — O problema é que apesar do poderio que isso pode nos trazer – apontou Kogsu, ajeitando o jaleco. – Como sabem, o barro é um material frágil – ele retirou a tampa do cubo de vidro que protegia a Liepard de argila, jogando um copo de água sobre ela. Em minutos o Pokémon se desfez, como se derretesse.

    — Não me importa, prezamos pela quantidade do que pela quantidade nesse caso – disse Ghetsis, com firmeza.

    — Mais uma coisa – Kogsu voltou a dizer. – Preciso deixar vocês dentro de todos os problemas. Se vamos fazer uma quantidade maior, vamos precisar de uma quantidade maior de poder psíquico. Eles agem como o cérebro desses Pokémon, mas um Elgyem e minha baixa especialidade na tipagem não seria o suficiente.

    — Você precisa de Pokémons psíquicos e um especialista? – Ghetsis riu, sabendo da sorte que tinha. – Temos a pessoa perfeita.

    Diferente da entrada do líder dos Plasmas, a entrada a mulher de cabelos róseos soou como se um anjo entrasse, leve como uma pena, ela trouxe até um clima mais calmo para o ambiente, ainda que o próprio Ghetsis estivesse também presente. Com sua expressão calma, ela sorriu gentilmente como se já soubesse de tudo:

    — Eu senti ondas psíquicas aqui – disse, olhando para o Elgyem. – Imaginei que seriam suas, pequeno.

    — Kana querida – cumprimentou Ghetsis. – Veio em boa hora, vamos precisar das suas habilidades e Pokémon.

    — Ajudarei como precisar, senhor Ghetsis – concordou a mulher, sentando-se para ouvir o pedido.

     

    N estava em seu quarto, perdido em pensamentos enquanto analisava a Dark Stone que lhe fora dado. Após entrar em acordo com seu pai, Ghetsis, de que se tornaria Rei dos Plasmas após se obter a esfera que guardava o dragão dos ideais, Zekrom, finalmente ambas as partes poderiam comemorar, ainda que Natural odiasse usar coroas ou se comportar como um rei de fato.

    Eu também não era o maior fã de coroas na minha época – a voz que apenas N escutava era a de Eric, o Príncipe Negro.

    Após por as mãos em seu objetivo, Natural descobrira que as surpresas só estavam começando. Eric havia reencarnado no Rei dos Plasmas, e assim como Clara, aparecia para conversar e convencer N a cumprir seu papel como controlador de Zekrom.

    — É difícil se acostumar com alguém lendo sua mente – respondeu o rapaz de cabelos verdes.

    É difícil evitar – riu o príncipe. – Estou tão ansioso quanto você para libertarmos Zekrom e transformar o mundo em um lugar de ideais.

    — Quando vou conseguir convencer Zekrom a sair daqui? – questionou N, que era como uma criança curiosa.

    Talvez ainda faltem alguma motivação maior para que ele saia.

    — Eu ouvi dizer que existe a contraparte – comentou, se lembrando o que Kogsu havia comentando na sua festa de coroação. – Light Stone.

    A contraparte de Zekrom, Reshiram, é o dragão da verdade. Ambos só nasceram porque eu e minha irmã, Clara, escolhemos e acreditamos em caminhos diferentes.

    — Eu adoro ouvir história, Príncipe Eric – sorriu N, acariciando os pelos de Katrina, sua Purrloin, que dormia ao seu lado. – Se quiser me contar a sua.

    Você é um rapaz muito gentil – elogiou o Príncipe Negro. – Eu fui de uma época estranha. Admiro-me ver que hoje em dias as pessoas mudaram seus conceitos sobre amor.

    — Que tipo de amor?

    Os românticos, os casais, os que casam e vivem o resto da vida juntos. – explicou Eric, ainda um pouco receoso em tocar no assunto de uma vez, mesmo que N estivesse com uma expressão confusa. – Você ama alguém, Natural?

    N refletiu.

    — ... Eu amo os Pokémon.

    O príncipe riu.

    Sim, eu notei isso. Mas... – ele fez uma pausa. – Existe... alguém que mexe com as suas estruturas? Que te deixa incomodado? Que te faz querer sair da sua zona de conforto? Que só a presença dela te faz sentir em casa?

    Natural encolheu as pernas, tímido, confuso. Eric, em sua mente, conseguiu visualizar a figura de Susan, o que o fez rir.

    — Amor... é algo complicado pra mim – confessou N. – Eu amo todas as pessoas que amam os Pokémon. Mas não sei se é esse tipo de amor que você está se referindo. Eu amo a presença das minhas irmãs, Anthea e Concordia, elas me fazem me sentir bem, em casa. E tem a Susan, ela me deixa nervoso, tímido, agitado, me dá vontade de sair do lugar só de estar perto dela. Meu coração dói – ele contou.

    Eric quis acariciar o ombro do rapaz, mas sabia que era impossível. Sentiu toda a confusão que a mente inocente de um garoto simples tivera com aquela simples pergunta e concordava quando disseram que o rapaz era só uma tela em branco. E sabia também que a pureza daquele branco não teria espaço para preconceito.

    Eu amei um homem uma vez – confessou, percebendo que Natural apenas continuava a prestar atenção, sem um pingo de julgamento.

    — Ele te fazia sentir como? – questionou, como se tentasse aprender sobre amor.

    Como se eu fosse o último homem do mundo.

    — Isso não é meio trágico?

    Pelo contrário, ele me tratava como se não houvesse mais ninguém. Mas havia mais alguém – Eric suspirou. – Minha irmã, Clara. Ela também amava o mesmo homem.

    — Quem ele escolheu?

    Lembra que eu te falei que eu vim de uma época estranha? – perguntou o príncipe, cuidadoso com as palavras. – Natural, o que o senhor achar de um homem amando outro homem?

    N refletiu.

    — Hã... – ele ponderou. – A gente não escolhe quem vai amar, né? Ou melhor, não é normal que a gente ame todas as pessoas que nos fazem bem, independente de quem são.

    Uma resposta digna de uma pessoa inocente como uma criança – riu Eric.

    — Isso é ruim?

    Pelo contrário. Queria que as pessoas pensassem o mesmo – suspirou e coçou a garganta para continuar sua história. – Esse homem era um lorde. Naquela época, era um absurdo um homem estar com outro homem, então, nossos encontros eram as escondidas – contou. – Foram alguns anos até alguém descobrir.

    — Vocês foram punidos?

    Não, mas foi porque ele aceitou casar com Clara, minha irmã, pessoa que o amava também – revelou Eric, com a voz apática. – Uma semana antes do casamento, ele surgiu na minha porta, desesperado, dizendo que após o casamento, Clara proibiria de nos vermos.

    — Sua própria irmã? – N pareceu surpreso. – Ela não deveria te ajudar?

    Num mundo ideal, nós nem precisaríamos de ajuda, apenas seríamos felizes. O nosso único obstáculo seria quem seria o escolhido, mas isso seria uma livre opção.

    — E o que vocês fizeram?

    Nós fugimos. Ele me escolheu – apesar dessa informação, Eric não parecia feliz, e isso deixa N confuso. – Eu fiquei dias me remoendo, até que resolvi voltar a público com ele e revelar a verdade. No fundo, conseguia imaginar Clara nos acolhendo. Ela era minha irmã gêmea.

    — Pela sua voz, o final não foi feliz, né?

    Não – disse, com a voz baixa. – Ela surtou, me acusou de traição, disse palavras horríveis. Foi quando iniciamos a guerra. A guerra que destruiu Unova.

    Natural se manteve em silêncio, ele segurou a Dark Stone, acariciando sua superfície com delicadeza, procurando o que responder.

    — Amor causou isso? – perguntou o rapaz de cabelos verdes, refletindo para si mesmo. – Me disseram que amor era um sentimento bom.

    É um sentimento desgastante, algumas pessoas não lidam bem com ele.

    — Não, ele não é desgastante. Ele é renovador – Natural olhou para Katrina ao seu lado. – Quando eu me sinto cansado, eu olho para os Pokémon que eu tanto amo e me renovo. Eu quero que Zekrom me ajude a trazer um mundo ideal para eles, sem Pokéballs ou prisões.

    Você sabe que para isso, terá que confrontar a contraparte, Reshiram e Clara, que pensam diferente, certo?

    — Não quero que esse embate destrua Unova – confessou. – Mas, se for preciso para conseguir o que é certo, farei de tudo. E sabe, Eric, se eu conseguir, eu prometo que nesse mundo ideal, eu farei que todas as pessoas aceitem o amor independente da forma dele.

    Obrigado, meu nobre jovem. Zekrom está em mãos certas.

    — Eu vou procurar quem está responsável por Reshiram, quero conversar para saber o que pensa quem está do outro lado – concluiu N, logo depois, lembrou-se de algo que queria perguntar: - Ah, só por curiosidade, como era o nome desse lorde que você amava?

    Oh, o nome dele era Kyuu.

    — É um nome estranhamente familiar – refletiu o Rei dos Plasmas, ainda que ele não soubesse dizer quem era.

     

    A reunião no laboratório de Kogsu durou a manhã inteira praticamente, Tsuyo já resmungava de fome e se perguntava o motivo de ter ficado por tanto, já que sua única missão era ter avisado o cientista da tal reunião. Odiava se envolver tanto em algo.

    Kana ouvira sobre a invenção de Kogsu com admiração, contente em saber que seus poderes psíquicos e seus Pokemon seriam úteis para tal missão. Mas havia outra coisa que a interessava.

    — Você disse que precisa dos poderes psíquicos para dar a eles um cérebro, assim você pode controla-los – a mulher se virou para o cientista. – Mas e a alma? É possível dar alma para eles?

    — Kana – o homem deu uma risada rápida, não se preocupando muito com os sentimentos da mulher. – Essas criaturas só serviram para nos obedecerem. Elas não precisam ter vida própria.

    A de cabelos róseos colocou a mão em seu peito, acariciando um pequeno relógio de bolso que ela transformara em colar. O objeto era antigo, mas muito bem cuidado, com símbolos esculpidos no metal prata com formatos de lua, estrelas e alguns planetas. Seja lá qual fosse a história, Kana tinha um grande apreço.

    — De verdade, Kana, eu não recomendo que você se apegue a qualquer Pokémon de barro que criarmos – alertou o cientista.

    — C-Certo – respondeu, desanimada.

    — Aliás, mudando de assunto, a gente pode criar um nome? – questionou Kogsu, mudando até o tom de voz para algo mais descontraído. – Falar Pokémon de barro é muito entediante.

    — A última coisa que devemos nos preocupar é com nomes, Kogsu – Tsuyo cruzou os braços, entediado. – Temos que preparar os próx-

    — Pokénendos! – Ghetsis exclamou, surpreendendo os três Virtudes presentes. Era raro ver o líder perder seu jeito sério e se entregar com animação a algo, dava até para considera-lo humano com uma interação dessas. Ele notou os olhares surpresos e coçou a garganta com uma tosse seca: - Desculpe. Acho que seria interessante chama-los assim. Nendo significa barro em japonês.

    — Admiro sua cultura, senhor Ghetsis – disse Kana, tentando recuperar o ego do homem.

    — De toda forma, nosso próximo passo é atualizar os equipamentos de Kogsu – disse Ghetsis. – Irei me certificar que o senhor Jeffery Sanchéz vá nos patrocinar, por isso, peço que faça um relatório sobre isso.

    — Deixa comigo, chefia – o cientista assentiu.

    — Precisamos também de amostras de DNA – o líder olhou para o ninja. – Tsuyo, posso contar com você? Diga a seu pai, Zinzolin, que nos ofereça as forças da Shadow Triad para conseguir o maior número de Pokémon que foram libertos.

    — Peço perdão, senhor Ghetsis, mas eu estava encarregado em espalhar o Dream Mist, o que vai acontecer com essa missão? – questionou o ninja.

    — Passe isso para Izami e Izani, aqueles dois já ficaram parados por tempo demais – ordenou Ghetsis, sempre com uma resposta pronta.

    — Certo, senhor – apesar de contrariado, ele não estava com paciência para discutir. Gostava da praticidade que era espalhar o Dream Mist, já que passava a maior parte do tempo deitado enquanto seu Mandibuzz fazia o resto do trabalho.

    — Bem, a reunião de hoje é essa – Ghetsis encerrou a reunião como um exímio líder, mostrando que a palavra dele sempre era a última, apesar disso, virou-se para Kogsu: - Eu preciso falar exclusivamente com você.

    Os três Virtudes se entreolharam, tentando adivinhar o motivo da reunião super secreta. Como não obtiveram sucesso, Kana e Tsuyo se dirigiram para fora, voltando cada um para seus afazeres. Kogsu coçou a mão com certa ansiedade.

    — Aceita um café? – questionou o cientista.

    — Não bebo café antes do almoço – respondeu Ghetsis, um pouco seco. – Faz mal pro estômago.

    — C-claro – o homem gaguejou. Começara a pensar se o líder dos Plasmas descobrira que todo o dinheiro que investira nele estava sendo gasto com mulheres.

    — Estava pensando se poderíamos criar um Pokémon que seria capaz de superar todos os outros Pokémon – disse o mais velho, enfim, revelando o motivo da conversa.

    — Chefia, só se você criasse uma nova versão de Arceus – disse Kogsu, soltando uma ligeira risada.

    — Não, não. Não falo disso – explicou-se Ghetsis. – Eu tenho mania de grandeza, mas tenho pés no chão – ele sentou-se e gesticulou com as mãos. – Eu pensei em criar uma espécie de Leviathan.

    — Uma criatura enorme? – questionou Kogsu, procurando acompanhar o raciocínio de seu chefe.

    — Isso. Uma criatura enorme que causaria o terror. Que mostraria todo o poder dos Plasmas, que ninguém pode entrar em nosso caminho – o líder dos Plasmas contava aquilo como se imaginasse seu império naquele pequeno plano. – Acha que consegue imaginar uma criatura assim? Sei que provavelmente pensou em Reshiram e Zekrom.

    — Na verdade, chefia – sorriu o cientista. – Existe um terceiro elemento.

    Kogsu se aproximou de uma prateleira de livros e como bom estudioso, retirou um livro de capa marrom e folheou as páginas, parando em uma delas. Se aproximou de Ghetsis novamente e começou a ler:

    “Quando o equilíbrio é quebrado, dois dragões nasceram: Reshiram e Zekrom. Entretanto, a casca vazia deixada deu a origem ao terceiro dragão da Tao Trio” – ele virou a página e olhou rapidamente para seu chefe. – “O terceiro dragão representa o vazio, o nada, a parte que falta, o pote, molde, o zero: Kyurem”.

    — Não pode ser! – exclamou Ghetsis.

    — Se Reshiram e Zekrom existem e foram considerados lendas, nada impede que Kyurem exista – revelou Kogsu, fechando o livro. – Kyurem é perfeito para o que queremos. Ele é uma casca vazia, ele pode se transformar em tudo aqui que você quiser.

    — Kogsu, comece as pesquisas, use o dinheiro que precisar. Vamos descobrir se esse Pokémon realmente existe e se existe alguma forma de o obtermos – Ghetsis se levantou. – É sempre um prazer fazer negócios com você.

    — Estou à disposição, chefia – sorriu o cientista.

    Quando o líder dos Plasmas deixou a sala sem nenhuma preocupação em se despedir, Kogsu suspirou e afrouxou a camisa, sentando-se na cadeira confortável, ligando seu celular novamente, ansioso em voltar para a sua jogatina.

    — Bom, pelo menos posso usar esse dinheiro pra comprar skins novas para a minha querida Jackie – debochou ele, rindo sozinho. 


          

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