• Capítulo 20


    — Quanto pesa uma coroa, Anthea? – questionou N, sentado gentilmente em um sofá, observando o quadro de uma pintura antiga de uma paisagem de Unova, provavelmente de dentro da Pinwheel Forest.

    A moça com quem se comunicava olhou curiosa para o rapaz, ela tinha lisos e leves cabelos róseos e uma expressão tranquila, suas delicadas mãos estavam ocupadas costurando uma espécie de capa. Quando processou a pergunta, ela sorriu:

    — Depende de vários fatores, meu querido irmão. Mas eu ouvi dizer que algumas pesam até um quilo.

    — Eu não falo de peso físico...

    — Oh – a mulher, alguns anos mais velha que N, assentiu. – Bem, tem que pensar que qualquer problema que acontecer será responsabilidade sua, mesmo que você nem esteja presente.

    — Isso foi meio duro – o rapaz de cabelos verdes olhou para a irmã.

    — Eu sei, querido. Pode se levantar? Preciso checar uma coisa.

    Os dois se aproximaram e Anthea envolveu o jovem, que era alguns centímetros maior que ela, com a capa branca que costurava.

    — Está perfeito – a moça sorriu gentilmente e ajeitou a peça que cobria todo o corpo o rapaz. – Lembro que o papai usava um cobertor velho para simular esse momento várias vezes na sua infância. Ele vai se sentir muito nostálgico ao ver isso.

    — Anthea... – N respirou fundo. – Por que eu?

    — É tão difícil assim me chamar de irmã? – a risada da outra parecia um tanto decepcionada.

    — Perdão, é meio difícil pra mim... ainda.

    — É, eu entendo – o sorriso de compreensão logo veio, como se ela tivesse ouvido várias vezes essa mesma desculpa. – Sobre sua pergunta. Você é puro N, como um quadro em branco pronto para ser pintado.

    — E isso é bom?

    — Bem, querido – Anthea o olhou no fundo dos olhos, como se procurasse conversar com sua alma. – Não sou eu que escolho as tintas.

    Natural tinha ouvido falar da chegada da Dark Stone no castelo da Team Plasma. Na verdade, não sabia da existência daquilo até o dia que Kogsu, um dos generais, por assim dizer, da equipe, lhe contou sobre e de como estava pesquisando pela sua localização. Sua atenção ganhou mais destaque quando leu sobre Zekrom, o dragão negro que representava os IDEIAIS.

    Mas a pressão de Ghetsis a respeito da coroação dele não o deixava pensar nas possibilidades que teria se tivesse Zekrom como seu amigo, até que a ideia surgiu.

    — Se você me trazer o objeto que Kogsu procura – ele disse naquele fatídico dia. – Eu aceito me tornar rei.

    Não sabia se o mais velho tinha aceitado a proposta por desespero em ver seu filho ser coroado ou se tinha um pouco de empatia em seu coração que queria ver N feliz. Preferiu acreditar na segunda opção, ainda que a primeira fosse a cara de Ghetsis.

    Resolveu então, conferir pessoalmente a beleza da Dark Stone, ela estava depositada em uma espécie de altar como uma figura sagrada, numa sala tão protegida quanto um sistema penitenciário. N se questionou os motivos das pessoas endeusarem tanto um objeto. Recebendo autorização de membros de segurança para adentrar, ele caminhou com passos leves e surdos até a esfera, que brilhando feito mármore, era rodeada por pequenas ondas elétricas azuis.

    — Você está aí, Zekrom? – Natural questionou, inocente, mas não obteve resposta. – Vamos lá, eu só quero conversar com você...

    Não é tão fácil conquistar ele – o rapaz de cabelos verdes quase deu um pulo ao ouvir uma voz.

    — E-Eu pensei que estava sozinho.

    Teoricamente está. Eu sou parte de você, Natural – o homem continuou a falar. – Estou “dentro da sua cabeça”. Dividimos a mesma alma.

    — Estou delirando de novo, né? – o jovem virou o rosto, dando leves tapas em sua bochecha para verificar sua sanidade.

    Que tal recomeçarmos as apresentações? Eu sei o seu nome, mas você não me conhece – a voz parecia alegre. – Sou Eric, muitos me conhecem também como O Príncipe Negro.

    — Príncipe Negro? Nunca ouvi falar.

    S-sério? – o príncipe parecia desconcertado. – Você não lê livros?

    — Leio, mas só os que o meu pai e minhas irmãs me davam – N suspirou, parecia um bobo contando sobre sua vida pessoal para uma voz em sua cabeça.

    Pois bem, é uma pena. Mas para resumir, eu e Zekrom somos parceiros. E agora, você é a continuação do meu legado, é sua vez de se juntar a ele e provar para o mundo que os IDEAIS devem prevalecer e comandar o mundo.

    — ... Outra pessoa querendo colocar títulos em mim – murmurou o jovem, não escondendo a decepção na voz.

    Ninguém te coloca títulos à toa, meu rapaz, eles são lhe dados baseados na sua fama ou nos seus feitos.

    — Não sei se Natural, o Rei é o título certo pra mim.

    Pois agora, para mim, você será Natural, o Nobre Destinado.

    — Destinado a que exatamente?

    A conversa foi interrompida por leves passos que surgiram no ambiente, a atenção de N foi toda roubada e ele viu sua pequena Katrina se aproximar, roçando carinhosamente em sua perna, miando gentilmente, o jovem sorriu.

    — E não é que ela sempre sabe onde você está? – uma figura feminina loira surgiu, sorrindo animadamente. – Finalmente te achei, meu irmãozinho.

    — Oh, Concordia – observou o de cabelos verdes, reconhecendo a figura. – Estava só... Observando o objeto que pedi para Ghetsis trazer.

    — Sabe que o papai sempre faz de tudo para te ver feliz – a mulher se aproximou.

    — Desde que eu apresente algo do interesse dele em troca – o rapaz cruzou os braços, observando a Dark Stone, tentando não transparecer toda a ansiedade.

    — Vocês nem parecem pai e filho falando desse jeito – riu a outra. – O papai é meio ambicioso, mas ele não é só isso, ele ama a gente.

    N suspirou e olhou para sua Purrloin, como se implorasse para que ela o levasse para um mundo diferente sem preocupações. Ao notar que não obteve resposta, Concordia coçou a garganta de leve:

    — Estava conversando com a esfera? Ouvi sua voz no corredor.

    — É difícil explicar – o rapaz suspirou, tentando procurar palavras para explicar. Talvez sua irmã o pudesse ajudar. – Tem uma voz na minha cabeça.

    — Todos nós temos uma voz interna, querido – respondeu a loira, sem dar muito tempo de ele completar sua explicação. Sem maldade, ela não parecia estar muito interessada na explicação, provavelmente estava sendo gentil. – Cabe você ouvir ela ou não.

    — Não é isso! – exclamou o rapaz, mas logo em seguida se arrependeu. A voz tinha saído mais alto do que ele imaginou. – D-Desculpa...

    — Não foi nada, você só está nervoso e ansioso com a coroação – Concordia sorriu. – Todos nós estamos, na verdade. E eu vim te buscar justamente para começarmos logo a cerimônia. Vamos lá?

    Outro suspiro se ouvir e pelo menos, naquele momento, ele resolveu deixar a história do Príncipe Negro de lado e “aproveitar” a cerimônia. Era hora de assumir a máscara do Rei N.

     

    A base de operações principal da Team Plasma, também conhecido como o Castelo dos Plasmas não tinha uma localização específica, mas era dito que ficava ao norte da região de Unova. O motivo de tanta confusão quanto ao seu posicionamento específico no mapa se devia ao fato da construção se localizar, por algum motivo, ficar abaixo do solo. Tinha pelo menos cinco andares, espaço suficiente para um exército de capangas leais que moravam nos andares inferiores, enquanto nos andares superiores, os Sete Sábios – os maiores apoiadores e fundadores da Team Plasma – viviam com seus filhos, além do próprio Ghetsis, o cabeça da equipe, Concordia e Anthea. E por fim, o jovem N, futuro rei daquela monarquia.

    Natural alcançou o salão de festas com suas irmãs sem grandes cerimônias, o ambiente estava decorado adequadamente para a ocasião com tons de dourado e prata, o dono do evento parecia não querer economizar no luxo daquilo tudo, ainda que N parecesse um pouco deslocado de tudo ali. Vestido com sua capa branca feita por Anthea, o rapaz logo recebeu a atenção dos convidados, os homens usavam elegantes ternos e as mulheres esbanjavam beleza em seus vestidos de diversas cores e modelos. Todos observavam o futuro rei da Team Plasma com um olhar curioso, a maioria já era conhecida do jovem.

    Rapidamente, alguns membros da equipe apareceram uniformizados e formaram um corredor que ligava N até uma espécie de altar onde Ghetsis estava, ao lado dos outros sábios, que estavam vestido com rakusus, uma vestimenta tradicional dos monges (ainda que eles não pudessem ser considerados assim). Os que estavam em fila ergueram espadas cenográficas para o alto ao ritmo que o jovem de cabelos verdes caminhava entre eles até chegar ao seu destino, sempre com a cabeça baixa e uma expressão indecifrável, seu pai foi o primeiro a abrir os braços num gesto de acolhimento e sorriu sem descrições.

    — Não faz ideia do quanto eu esperei por esse dia – disse o homem.

    — Talvez eu tenha um pouco – a voz de Natural falhou um pouco. – Você sempre falou sobre esse dia que é impossível não... saber – seu tom parecia inocente, não sendo agressivo. – Chamou tanta gente.

    — Chamei as mais importantes, meu filho. Todos estão aqui por você, eles sabem que você vai prosperar a Team Plasma.

    — P-Podemos começar? – o jovem ajeito sua capa branca, incomodado.

    Com poucos gestos, os convidados e empregados se reorganizaram de forma que toda a atenção fosse voltada para aquele pequeno altar, aquilo causou ainda mais timidez por parte do futuro rei que estava prestes a ser coroado. Eram muitos olhos que pareciam julgar sua capacidade em reinar que nem mesmo ele sabia se tinha. Aliás, qual era a função de um rei mesmo? Ser bondoso? Impor respeito? Ser cruel? Ou só usar uma coroa e assinar papéis?

    — Sejam todos muito bem-vindos ao evento mais histórico da Team Plasma desde a sua fundação – começou Ghetsis, com sua voz marcante e forte. – A coroação do novo rei, o meu filho, que é um símbolo de esperança para todos nós e nossos objetivos.

    O rapaz coçou os cabelos, acanhado.

    — Nós, da Team Plasma, temos um objetivo nobre: Transformar Unova em um lugar ideal para os Pokémon, onde humanos não os usem como objetos de combate e escravidão. Trazer um rei jovem que acredite nisso é renovar a crença nesse objetivo. Acredito que estamos muito longe de um mundo ideal, mas não iremos desistir – o locutor aumentava mais seu sorriso de orgulho a cada palavra que pronunciava. – Todos os presentes aqui são parte da família, e é uma honra receber cada um de vocês. Pode trazer a coroa.

    Concordia, caminhou com classe para os fundos daquele altar e logo voltou com a pequena coroa de ouro pontiaguda que estava depositada gentilmente sobre uma almofada macia, seus passos se tornaram mais atentos devido ao medo de derrubar aquele objeto precioso. Só parou quando se aproximou de Ghetsis e este segurou o símbolo supremo da monarquia com suas duas mãos e a levantou em direção ao público, como se exibisse um troféu. O ouro que era o material daquilo provavelmente deveria valer mais que aquele castelo. A luz que refletiu contra aquilo fez N levemente cobrir seus olhos, logo em seguida, o mais velho virou-se para ele e gesticulou com a cabeça, para que o filho se curvasse levemente, e assim o fez.

    — Eu, Ghetsis Harmonia Gropius, líder dos Sete Sábios e atual líder dos Plasmas, coroo você, Natural Harmonia Gropius, como Rei da Team Plasma – Ghetsis depositou gentilmente a coroa sobre a cabeça do rapaz. Não era tão pesada fisicamente, mas a carga de obrigações a faziam parecer que ela o derrubaria no chão. – Pode levantar a cabeça.

    Sério, Natural ergueu sua cabeça e seus olhos não focaram ninguém em específico.

    — Arceus salve o Rei.

    — Arceus salve o Rei! – o coro da multidão ecoou pelo salão e a espinha do jovem se arrepiou. Não seria mais o filho, o irmão, o jovem ou só N. Agora, toda sua história se resumia naquele objeto de ouro que enfeitava sua cabeça. Ele era o Rei agora.

     

    Os sons das bebidas sendo servidas já podia ser ouvido, os tintilar das taças anunciavam a hora mais esperada por alguns convidados: a festa. Pratos exóticos e sofisticados, ponches, vinhos e champagnes caros e até mesmo uma fonte de chocolate enfeitavam uma enorme mesa, disposta para qualquer um. Logo após a cerimônia, o castelo dos Plasmas passaria horas recepcionando as animadas pessoas que ansiavam por um pouco de diversão. Principalmente a jovem Mikoto.

    Em seu vestido dourado brilhante estilo sereia, ela atravessava o ambiente com empolgação e extremamente sociável com todos os presentes, cumprimentando todos, apesar de não conhecer alguns. Logo, ela se aproximou de seu destino inicial: um grupo de seis pessoas que possuíam idades próximas, a maioria já passava dos vinte.

    — Eu definitivamente estava precisando de uma festa! – anunciou a loira, encostando em Kogsu, que parecia não ter tido problemas para escolher uma roupa social para a ocasião, já que estava acostumado a usá-las sempre. Um elegante terno branco com uma gravata prateada.

    — Você foi em uma ontem, Mikoto – respondeu o rapaz.

    — Aquela estava tão entediante que eu nem contei como uma – ela deu de ombros.

    Além de Kogsu e Mikoto, estavam naquela roda Tsuyo, o ninja que estava apenas vestido com uma camisa azul escuro por baixo de um colete preto e calças de mesma cor, Kana, com seus longos cabelos róseos presos em um rabo de cavalo alto com um vestido róseo, Izami e Izani, um casal de gêmeos que apesar da diferença de gêneros, eram facilmente confundidos, mas naquela ocasião, era possível perceber quem era quem graças ao elegante vestido laranja de Izami e a camisa social do irmão da mesma cor, e por fim, a serena e majestosa Susan, que se diferenciava dos outros por usar um elegante kimono vermelho. Aqueles eram As Virtudes, filhos dos Sete Sábios, eles faziam parte do alto escalão da Team Plasma e comandavam maioria das operações em campo.

    — Lembrando que a gente a não estaria aqui se não fosse a mente brilhante do Kogsu – disse a loira, levantando a taça em direção ao colega. – Você não só descobriu, como comprovou a existência da Dark Stone. Além de descobrir a localização dela!

    Kogsu riu de leve, um tanto convencido.

    — Não foi muito difícil. Nada que horas de leituras e acesso a arquivos confidenciais que o governo ignorava não resolvessem. Lógico que eu admito que foi um golpe de sorte aquele raio azul na Twist Mountain – riu o homem de cabelos azuis.

    — Não esqueçam que quem estava em campo eram eu e Mi – pronunciou-se Kana, com sua voz tímida.

    — É claro que não esqueci, foi uma operação... explosiva – riu Mikoto, bebendo um gole de seu champanhe, recordando-se com certo orgulho.

    — O que o Ghetsis não faz pelo filhinho dele? – murmurou Tsuyo, indiferente.

    — Ouvi dizer que encontraram a Light Stone também – comentou Susan, ajeitando seus cabelos negros.

    — Essa sim foi um golpe de sorte. Uma das minhas capangas ouviu o sobrinho da Lenora falando para dois jovens em um café que ele estava com a tal pedra – explicou Kogsu, logo, seu tom de voz pareceu soberbo. – Como ele é parente de uma figura pública, não foi muito difícil rastrear seu endereço. Aí eu mandei a Maggie e o Peter para a operação e...

    — E a Light Stone simplesmente sumiu após uma explosão – provocou o ninja, recebendo um olhar ameaçador do colega.

    — Uma explosão? – Mikoto sorriu. – Agora essa história ficou interessante. Como aconteceu?

    — Duas crianças vieram me encher o saco, eles tinham um Victini falante muito irritante – contou o de cabelos azuis.

    — Um Victini? – Kana se demonstrou curiosa.

    — O mesmo aconteceu comigo – resmungou Tsuyo. – Seria uma infeliz coincidência se fossem os mesmos garotos que me atrapalharam em Striaton.

    — Tá, tá – a mulher de vestido dourado gesticulou com as mãos. – E como terminou a história?

    — Um dos meus capangas acabou destruindo-a – relembrou Kogsu, de braços cruzados. – Pobre Peter, era tão jovem.

    — Hm? O que quer dizer? – questionou Susan.

    — Não ficaram sabendo? A explosão causada pela Light Stone deixou Peter bem ferido, levamos ele pra atendimento médico, mas ele acabou não resistindo. Parece que o impacto ao ser arremessado lesionou o pulmão dele gravemente.

    — Ah minha nossa – Kana levou as mãos ao peito, tocada.

    Uma garçonete de cabelos curtos e ruivos que se destacavam por uma mecha azul mais comprida se aproximou com uma bandeja cheia de taças. Sem muito ânimo, ela disse:

    — Gostariam de mais bebidas, senhores e senhoras?

    — Ah, Maggie – seu superior foi o primeiro a reconhecer a figura. – Eu sinto muito por Peter, sei que eram próximos.

    — E-Ele só... era um colega – Maggie pareceu distante, tentando evitar que o assunto se prolongasse a qualquer custo. – Aceitam bebidas?

    — Estamos bem – ele respondeu, a dispensando com um gesto gentil com as mãos.

    A garota então deu meia volta e saiu, partindo para o próximo convidado. Não fazia nem dois dias da morte de seu colega, mas a oportunidade de ganhar um dinheiro lhe surgiu e ela não podia recusar. Estava em uma jornada para enfrentar a liga, precisava fazer trabalhos para ganhar algo. Chocada, mas ao mesmo tempo indignada, não conseguia deixar de pensar em como Peter fora enterrado como um criminoso sem coração, ela fora a única que o acompanhara até o túmulo – se é que um pedaço de terra com uma pedra com seu nome mal escrito pudesse se considerar um túmulo. Sem outros membros da Plasma ou até mesmo a própria família do garoto. Tão desumano.

    Se livrando de seus pensamentos, ela se aproximou de onde Ghetsis e o novo monarca, Natural, conversavam com um homem que passava dos cinquenta anos a julgar pelos penteados fios de cabelo platinados com gel que cheirava incrivelmente bem, as linhas de expressão ressaltando os olhos azuis que combinavam harmoniosamente com o terno de linho cinza. Dois seguranças acompanhavam a figura masculina, mas não pareciam protegê-lo, e sim, garantir que não fugiria.

    — É uma honra recebê-lo em nosso palácio, Sr. Sanchez – sorriu o mais velho para seu convidado. – Se hoje esses pilares estão em pé é graças a seu investimento.

    — Ainda tenho alma de empreiteiro apesar de anos longe dessa área – brincou o homem, acendendo um charuto caro. – Não é tão fácil encontrar clientes quando se está “preso”. Se é que usar uma tornozeleira e andar dois seguranças no seu pé seja considerado uma prisão – ele voltou a rir enquanto liberava a fumaça de seu cigarro. Aquela baforada parecia como um alívio, como se fizesse tempos que não sentia o gosto da nicotina em sua língua.

    — Com licença – Maggie finalmente entrou na conversa. – Gostariam de uma bebida? – ofereceu, com a voz meio automática.

    — Oh, obrigado mocinha – Sanchez se serviu e começou a observar a jovem dos pés à cabeça, sem malícia, apenas com curiosidade. – Você parece bem nova, quantos anos tem?

    — D-Dezesseis, senhor.

    — Quase a idade da minha filha – comentou o homem, como uma informação aleatória, mas que chamou a atenção de Ghetsis, que fazia de tudo para se manter próximo e amigável do empresário.

    — Não sabia que era pai, senhor.

    — Apenas Jeffery, por favor – retrucou, bebendo um gole de seu champanhe. – E sim, eu sou pai. Infelizmente não conheço a menina, eu e a mãe dela meio que nos desentendemos, mas obtive informações de terceiros de que ela deve ter aproximadamente quinze anos. Me pergunto se ela tem os meus olhos pelo menos – riu.

    — Nunca conheceu ela? Ah, podemos te ajudar com isso. Posso mandar meus melhores comandantes para investigar. O filho de Giallo, um dos sábios, é um especialista no assunto.

    — Ghetsis, por favor, não se afobe – Jeffery tragou seu charuto e suspirou, sorrindo no canto da boca. – O destino vai cuidar disso – ele ajeitou o relógio de ouro e N não pode deixar de notar a pequena marca de nascença parecida com um coração branco perto do pulso.

    — Você está quieto demais, meu Rei – notou Ghetsis, demonstrando preocupação. – Algo te preocupa?

    — N-Não, claro que não – Natural negou várias vezes com a cabeça, recuando um pouco. – Eu... Posso sair um pouco? Para tomar um ar. Não estou acostumado com tanta gente junta.

    — Fique à vontade, majestade.

    N não deu tempo para que seu pai terminasse a frase e logo virou-se nos calcanhares e caminhou em direção para outro ambiente, uma antessala que estava decorada com tantos sofás que faria uma criança achar que aquilo era um parque de diversões com pulas-pulas. O jovem sorriu só de imaginar.

    Finalmente, ele sentou-se e respirou fundo.

    — Ser o centro das atenções nunca foi seu forte, não é? – uma voz feminina gentil preencheu os ouvidos do rapaz que sentiu seu rosto queimar e o fez se virar em direção a voz. Susan parecia mais angelical quando estava abaixo de uma luz branca, ela sorriu e se aproximou. – A coroa fica bem em você.

    — O-Obrigado – N parecia um robô de tão nervoso e travado que estava.

    — Eu trouxe alguém que com certeza você vai gostar – a moça abriu espaço para que a pequena Katrina surgisse com um miado animado.

    — Ah! – o rapaz esbanjou um sorriso pela primeira vez. – Oi garota.

    Era disso que gostava, de estar perto dos Pokémon, das criaturas fascinantes que eram completamente misteriosas, que sempre foram seus companheiros desde a infância, o protegiam e eram sua família. Amigáveis, Natural sabia que todas elas mereciam de volta toda a proteção e cuidados, e doía demais para ele ver essas criaturas sendo usadas como objetos de batalha. Purrloin roçou seu corpo no jovem magrelo em sinal de carinho e logo juntou-se a ele no sofá. Naquela hora, ele prometeu a si mesmo que governaria a Team Plasma pelos Pokémon.

    — Acha que eu fui uma boa escolha? – questionou N, se virando para Susan. A moça de cabelos negros então sentou-se ao lado do colega com a postura ereta, dava inveja a ver ser sentada tão perfeitamente.

    — Eu acho que estávamos precisando de alguém igual a você.

    — Estranho? – ele forçou uma risada.

    — Humano – respondeu, ajeitando alguns fios verdes bagunçados do rapaz, com certa intimidade. – Você não se gaba pela coroa que está em sua cabeça e nem quer que fiquem te chamando de Rei, provavelmente nem deve saber o preço dela e nem quer saber. Algumas histórias infantis dizem que um bom líder é aquele que é humilde e humano e geralmente, os reis que não são assim, são os vilões da história e se dão mal no final.

    — Mas o bonzinho também sofre muito na história antes de ter um final feliz – suspirou o rei.

    — Tudo faz parte de um teste para provar a essência do protagonista. Você é o protagonista da nossa história, N.

    — O protagonista, o quadro em branco, o destinado, o rei, o filho – N mexeu as mãos, nervoso. – São tantos rótulos.

    — Saiba que no final da história, quem escolhe o que você quer ser é você. E geralmente, esse título é o que estampa a capa do livro.

    — Eu só quero ser o N. Ou o Natural.

    — Eu queria ser só a Susan também – confessou a mulher, rindo gentilmente. – Mas sou a filha de Gorm, uma das Virtudes. Às vezes me pergunto o motivo de termos nomes sendo que sempre somos taxados com títulos.

    O outro riu.

    — É um bom ponto – disse, refletindo um pouco. – Espero um dia encontrar a resposta.

    Susan virou-se e segurou o rosto magro do rapaz entre suas mãos, ela riu quando sentiu o rosto dele ferver de vergonha. Adorava aquele jeito tímido. Sem muita discrição, ela uniu seu nariz com o do rapaz e esfregou levemente em movimentos rápidos. Natural achou ter levado um tapa na hora de tão corado que estava, não conseguia ficar perto da mulher sem externar seus sentimentos, os mais especialistas diriam que aquilo era amor, mas N acreditava ser uma extrema admiração.

    — Deixa eu te falar. Geralmente todo protagonista tem seu próprio time, que vai lhe apoiar e ajudar até a última linha do livro – confessou a moça, soltando o rosto do jovem. – Se você é o nosso protagonista, eu serei a personagem que irá garantir que o final feliz esteja escrito na última página – o sorriso com dentes brancos preencheu a boca carnuda dela. – Eu e as Virtudes estaremos com você. Ainda que alguns que sejam teimosos, como o Tsuyo e o Kogsu, posso garantir que eles são pessoas fiéis – riu.

    Natural riu de volta, sentindo um alívio em seu coração.

    — Oh! – o grito de exclamação veio de Izami, que estava acompanhada de seu irmão gêmeo, carregando um doce em mãos. – Olha, Izani, acho que eles estão num encontro.

    — Susan e o Rei estão namorando? – riu Izani, provocando a dupla.

    — Susan e o Rei estão namorando! – riu a gêmea de voltando, entrando na brincadeira.

    Susan apoiou os braços na costa do sofá e sorriu de forma amedrontadora.

    — Se vocês continuarem com isso, eu vou ser a bruxa da história e transformar vocês em pequenos Tympoles.

    Izani e Izami se entreolharam, pareciam duas crianças que acreditavam em qualquer história, e logo, saíram correndo, rindo de suas brincadeiras.

    — Quer saber? No final da história, esses dois vão virar o bobo da corte – concluiu Susan.

    — Concordo plenamente com a ideia – riu N de volta.

    Qual o peso de uma coroa? Não era tão pesada quanto parecia. Vai ficar tudo bem, pensou o jovem consigo mesmo.

       

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