Capítulo 40
— Meu nome é
Junsei Kurosawa – apresentou-se o visitante.
Hilda sabia que
estava na frente de uma figura histórica. O antepassado de Inari e o
responsável por registrar a existências das esferas dos dois dragões da Verdade
e do Ideal de Unova. Parte da família que manteve a paz por muito tempo na
região antes que fossem obrigados a fugir pela maldade das pessoas que queriam
trazer o caos novamente.
Junsei retirou a
esfera branca brilhante de dentro da bolsa de pano, relutante em entregar para
o casal. Ele suspirou e começou a falar:
— Essa é a Light
Stone, ela guarda o Dragão da Verdade, Reshiram. O Rei nos confiou as duas
esferas para que as guerras as envolvendo não voltassem – ele riu de forma sem
graça. – Mas aparentemente a pressão está sendo tantas que começamos a ser
perseguidos. Eu queria honrar minha missão, mas a minha família é mais
importante.
Hilda não
conseguia parar de encarar a Light Stone.
Novamente, o
ambiente mudou. Estava tudo no completo vazio, não havia chão, não havia teto,
muito menos paredes. Apenas uma imensidão de uma única cor. Na frente de Hilda,
Junsei a encarava como se soubesse que ela estava ali, mas não dizia nada.
A garota olhou
para suas mãos estendidas que carregavam a Light Stone. Seu ato foi estender
seus trêmulos braços para alcançar o objeto, mas a voz pesada e carregada de Junsei
a interrompeu:
— vOcê aCEitA
eSsE DEsTinO?
Os olhos azuis de
Hilda subiram para visualizar o rosto do comunicante. Sua respiração prendeu
quando o rosto de Junsei não possuía olhos, apenas um buraco negro e vazio que
assustava muito por não saber que expressão ele carregava. Sua cabeça começou a
tremer com movimentos frenéticos, até um som ensurdecedor ecoar pelo local,
fazendo a menina cobrir os ouvidos.
O som não parecia
com um grito, mas era claramente de desespero. Junsei desapareceu logo em seguida,
sendo engolido por uma espécie de vórtex.
Na sequência,
mais imagens do passado. Hilda olhou para frente e lá estava o corpo de uma
garota de cabelos curtos, quimono branco expressão vazia, suspensa, com o corpo
mole. A corda em seu pescoço revelava o motivo da morte.
A adolescente
cobriu a boca, chocada com a cena. Em seguida, uma série de eventos continuaram
a história. O corpo da mesma garota foi levado por monges que usavam máscaras
de expressão neutra, eles alcançaram um lugar não muito exato ou conhecido, mas
era possível ver um enorme abismo de forma retangular.
Como se fosse um
objeto qualquer, a garota de quimono foi arremessada no abismo.
Em seguida, um
terremoto.
E mais gritos.
Hilda se abaixou, mas o evento não parecia lhe atingir.
Uma enorme sombra
engoliu o cenário novamente.
“vOcê nÃo
POderÁ fUGir DesSe dEsTino”
O cenário muda.
Lá estavam Akiri e Ranmaru.
Ranmaru carregava
uma espada conhecida como katana. Akiri estava no chão, chorando em
desespero.
“Não foi culpa
delas que não deu certo. NÃO FOI MINHA CULPA! NINGUÉM QUERIA ESSA MALDIÇÃO!”,
berrou a mulher. As mãos sujas de sangue do homem e a expressão insana com os
olhos arregalados indicavam que ele não estava são.
“O ritual não deu
certo. As sombras vieram, quem não morreu, logo será consumido por ela”,
sua risada era assustadora. “Então essa é a maldição da Light Stone? Esse é
o poder daquela esfera? Uau”
“Como consegue
ainda ficar admirado?!”, gritou Akiri.
“Eu vi uma pessoa
tentar destruir a Light Stone enquanto fugíamos do templo. Ela agarrou a esfera
e seu corpo queimou”, Ranmaru contava com um sorriso no
rosto, enquanto alcançava uma lamparina. “Sua pele descolou de seu corpo e
eu o vi ficar em carne vive antes de as chamas consumirem seu corpo”
“O que vai fazer?”,
perguntou Akiri, preocupada com o objeto nas mãos do marido.
“Nós vamos
QUEIMAR”
Ranmaru deixou
com que a lamparina alcançasse o chão e o fogo o consumisse junto de Akiri. A
mulher gritou em desespero e ele continuou a rir, enquanto as chamas engoliam
aquela feição assustadora.
Hilda travou e
sentiu seu corpo pesar. Sentiu seu pescoço fechar e lhe faltar ar. Toda a dor
causada pela Light Stone naquela família caiu como uma culpa contra ela. Seus
joelhos cederam contra o chão, com a boca aberta, quase seca, ela começou a
chorar.
— D-Desculpa –
disse, num sussurro.
Akiri surgiu por
trás, entrando na visão da menina. Claramente se tratava de um espírito, mas
esse parecia calmo. Hilda sentiu um leve calor quando as mãos da mulher tocaram
suas bochechas.
“Seu destino é
tão triste quanto o nosso”, disse ela. “Você é tão nova
quanto minhas filhas e carrega uma missão tão exaustiva. Não é a sua culpa se
as pessoas são más. Você pode me fazer um favor? Promete que vai ajudar esse
lugar? Você só precisa levar a Light Stone embora”
Akiri acariciou
as pálpebras de Hilda e os olhos da garota se tornaram brancos, como se fosse
cega.
“Por favor, me prometa que vai salvar o mundo”
Vic berrou pelo
nome de Hilda que despertou. A adolescente se levantou, estava de volta ao
escritório, mas dessa vez, ela estava diferente.
— Hilda! Achei
que tivesse morrido ou que tivessem te levado! – disse o Victini, aliviado
em ver a amiga não tinha qualquer machucado. Mas voltou a se afligir quando ela
nada respondeu. – Hilda, tá tudo bem?
Hilda olhou para
o amigo, mas não diretamente para ele. Suas írises brancas como um véu de noiva
chegavam a ser relaxante e assustador ao mesmo tempo, seu olhar era distante como
se aquela cor fosse uma cortina para sua visão.
— Não consigo ver
nada, Vic... – revelou. – Mas sei exatamente onde está a Light Stone. Eu
preciso pegar ela.
Desamparada, mas
confiante de seus passos, Hilda começou a caminhar em direção a saída da sala.
Vic tentou segui-la, mas seu corpo paralisou, como se aquela missão fosse
apenas exclusiva para a garota. Sombra, a Zorua, por sua vez, conseguiu seguir
sua mestra e usou sua forma de Arcanine para guiá-la na mansão.
O Victini,
deixado para trás, só conseguiu recuperar o movimento quando a garota já estava
distante. Ele deixou o quarto a fim de seguir e procurar a amiga, mas sabia que
não seria uma tarefa fácil. Sua única felicidade foi se deparar com outra
figura conhecida, ainda que ela estivesse mudada.
— Bree! –
chamou o Pokémon, voando em direção dela.
— V-Vic! –
apesar de não ser o feitio dela, a Servine parecia apavorada e ofegante,
completamente perdida. – V-Você precisa me ajudar, o-o Hilbert, uma criatura
diabólica sumiu com ele!
— Bree, eu também
tô precisando de ajuda. A Hilda saiu andando por aí feito uma louca procurando
a Light Stone!
— O que
faremos?! – ansiosa, a inicial de grama começou a andar em círculos.
— E-Eu sugiro
procurarmos Hilda primeiro, ela não está tão longe.
— Jackson-sama,
aquela é a Hilda! – apontou Inari.
O Jardim da
Cerejeira era melancolicamente bonito, apesar da árvore ressecada da flor de
cerejeira estar morta, ainda era possível enxergar alguma coerência daquela
composição. Hilda fora avistada parada na entrada de um pequeno templo com um
telhado cinzento e arquitetura clássica. Local que, Ranmaru impediu de ser
acessado pelos três mosqueteiros em sua visita, o que poderia significar que
aquele pequeno templo podia guardava algo nada convidativo.
Jackson se
aproximou da sacerdotisa para confirmar e gelou.
— Ela vai entrar
ali? – questionou. E sua resposta veio logo em seguida quando Hilda estendeu a
mão para frente, alcançando a maçaneta enferrujada, puxando com certa força.
— Pelo amor de
Ho-oh! Vamos! – Inari agarrou o braço do homem, puxando para fora do quarto.
— PERA AÍ, INARI!
– berrou o rapaz, assustando-a. – A gente subiu aqui pra fugir de um fantasma,
fantasma esse que tá no andar de baixo.
— O que faremos
então? – questionou a ruiva. – Pulamos pela janela?
— Não é uma má
ideia – respondeu o arqueólogo, indo até a varanda.
— JACKSON!
Jack tirou uma
Pokéball de sua mochila e liberou Winston, o Darmanitan, que olhou apavorado em
volta, analisando o ambiente incomum. Logo em seguida, olhou para o seu
treinador com uma expressão de dúvida.
— Winston, pode
nos dar uma mãozinho? – pediu o jovem. – A gente precisa chegar lá embaixo.
Jackson apontou o
jardim. Winston era um ex-militar, o que fazia dele um Darmanitan mais forte e
alto que os de sua espécie, e isto seria até bom se o seu tempo no exército não
tivesse lhe causado tantos traumas. O Pokémon olhou o local indicado e
assentiu, sempre disposto a cumprir ordens. Seus enormes braços envolveram a
cintura de Inari que se sentiu em um filme antigo sendo sequestrada por um
macaco gigante.
Winston usou seu
braço livre e suas habilidades para alcançar a varanda e descer pelo telhado,
logo alcançando um pilar a fim de alcançar o solo.
Nesse tempo,
Hilda abriu a porta do templo, e ela se arrependeu de ter feito isso. Como se
tivesse aberto os portões do inferno, uma enorme energia sinistra sentida por
Inari a fez estremecer, assim como a própria mansão. A estrutura sacudiu e
graças ao tempo, não foi muito difícil que as paredes começassem a rachar e
algumas madeiras do chão começassem a ceder. Até mesmo o pilar que o Darmanitan
de Jackson estava apoiado rachou e ele perdeu o equilíbrio, caindo com certo
impacto no chão junto da sacerdotisa.
— Inari! Winston!
– o arqueólogo se apoiou no parapeito da varanda, preocupado. Até mesmo Bijou
grunhiu, preocupada, apoiada no ombro do rapaz.
Inari olhou para
Hilda. A jovem Foley tinha uma expressão vazia e os olhos esbranquiçados,
estava apoiada em Sombra, que começou a guiar sua mestra para dentro do templo.
Tanto a sacerdotisa quanto Hilda já sabiam: Aquele era o local que guardou a
Light Stone.
Preocupada, a
ruiva correu, ainda que com dores, em direção a amiga, a fim de impedir que ela
entrasse e o desconhecido acontecesse. Tudo o que conseguiu foi alcançar seu
ombro e, em seguida, sentir seu corpo paralisar.
Gritos ecoaram.
Gritos desesperados de dor, gritos de pedido por ajuda, gritos de angústia.
Flashback de gêmeos em quimonos brancos se repetiram várias vezes, revelando as
diversas mortes causadas por aquela que foi revelada logo em seguida.
No pequeno altar
de dentro do templo, estava ela. Incompleta e não era uma ilusão. Pelo menos ¼ da
Light Stone estava apoiada exposta como o objeto sagrado que era. Uma
quantidade enorme encontrada, para a sorte (ou azar) dos jovens. Inari observou
o objeto e olhou para Hilda.
— Essa maldita
está aí – praguejou a morena, com uma expressão de insatisfação, enquanto seus
olhos cegos só conseguiam “olhar” para aquela que amaldiçoava.
Ela se aproximou
e segurou o objeto como se nada fosse e seus olhos voltaram para o tom azul de
sempre. Sombra olhou preocupada para sua tutora e grunhiu docilmente.
— Hilda? – chamou
Inari, ganhando a atenção da garota.
— I-Inari? –
aliviada, ela se aproximou a abraçou a sacerdotisa. – V-você está bem?
— S-só com alguns
arranhões e dores – nervosa, ela olhou para o pedaço da Light Stone. – E pensar
que parte dos fragmentos voltariam para o local de origem.
— Esse lugar
precisa descansar – disse Hilda, com a voz baixa. – Estou ajudando-os como
posso.
— HEY! VOCÊS
DUAS! – Jackson gritou do segundo andar, recebendo a atenção das meninas. –
Está tudo bem?!
— Jackson! –
Hilda sorriu, igualmente aliviada por ver mais de um de seus amigos bem. –
E-Está tudo bem!
Winston voltou
para o local em que seu treinador o aguardava, carregando-o para baixo juntos
das outras duas garotas. O arqueólogo se aproximou.
— Ok, três de nós
estamos reunidos – disse. – Algum sinal do Hilbert? E Vic?
— Eu só encontrei
a bolsa dele – contou Hilda, mostrando o objeto pendurado em seu corpo. – Eu
encontrei o Vic, ele estava comigo. Mas depois de um acontecimento, devo ter o
deixado para trás e ele se perdeu – a voz dela demonstrava preocupação. – A
gente precisa sair daqui, temos que tirar a Light Stone daqui. Esse lugar
sofreu muito.
— Nós imaginamos
– disse Inari, com a voz triste. – Essa casa nos mostrou a história. Essas almas
vivem em uma repetição eterna de um ritual que não funcionou.
— Pessoas
inocentes eram destinadas a morte – complementou Jackson, num silêncio de
respeito.
— Bem, estamos
aqui para reunir os fragmentos e garantir que não teremos cenas como essa se
repetindo, né? – encorajou Hilda, com um sorriso confiante. – Akiri me disse
que meu destino é tão triste quanto os que estavam aqui. Mas eu prometi para
mim mesma que faria o futuro ser legal comigo.
— E você não está
sozinha – sorriu Inari.
A paz momentânea
foi interrompida quando criaturas começaram a surgir do chão com suas máscaras
e olhos avermelhados. Estavam em quantidade grande e rodeavam o trio, nem um
pouco satisfeitos com a presença deles. Cami, a Furret, eriçou os pelos e
reforçou sua segurança com o ovo em seu rabo, enquanto Sombra e Winston se
posicionaram de modo defensivo.
Hilda sacou duas
de suas Pokéballs, liberando Lucio e Koin para ajudar. Jackson lançou Jesse,
que se juntou ao Darmanitan, até mesmo Reginn, o mais novo Axew do arqueólogo,
quis se juntar.
— São Yamask – disse
Jackson.
— É impressão
minha ou eles estão carregando máscaras parecidas com aquelas que vimos nos
corpos quando Kirie nos atacou? – questionou Inari, olhando para o arqueólogo
ao seu lado.
— As informações
na Pokédex dizem que eles carregam a máscara com o rosto de quando eram vivos –
informou.
Alguns Yamask
começaram a atacar com seus grunhidos finos. Winston e Koin socavam alguns com
seus punhos cobertos por chamas fazendo os Pokémon caírem no chão e serem
engolidos por ele. Jesse usava um golpe conhecido como Metal Claw e
conseguia atingir uma quantidade maior de inimigos que tinham o mesmo destino
dos outros. Lucio usava golpes aquáticos, priorizando o Water Gun para
afastar os fantasmas de Hilda.
Apesar de uma
grande força ofensiva, os Yamask não cessavam de aparecer, sedentos em alcançar
os três jovens, mas, precisamente, os fragmentos e o pedaço da Light Stone
encontrada por Hilda. Um deles agarrou o tornozelo da garota, assustando-a. Ela
sacudiu o pé para se livrar e perdeu o equilibro, fazendo com que mais se aproximassem.
Sombra atacou alguns enquanto o Palpitoad continuava a afastar alguns que
insistiam em se aproximar.
Jackson e Inari
tentaram ajudar, mas estavam sendo atacando por muitos deles. Parecia uma
espécie de formigueiro, mais e mais surgiam, agitados e se multiplicando.
De repente, um
tornado de folhas varreu alguns do Yamask, aliviando momentaneamente a
situação. Os que atacavam Hilda recuaram, colocando as mãos em suas cabeças.
Brianna e Vic surgiram para a ajuda.
— Finalmente
achamos vocês! – disse o Victini, se aproximando dos amigos junto da
Servine.
— Vic! – exclamou Hilda, aliviada. – Sinto
muito por te deixar pra trás. Essa é a Brianna?
— Ela mesmo –
confirmou o Pokémon vitória. – Ela me contou que estava com Hilbert.
— E onde ele está
agora, Brianna? – perguntou a garota, preocupada.
O clima mudou
novamente. Inari sentiu que a atmosfera era tão forte que até mesmo os Yamask
paravam seus ataques para contemplar a nova figura que surgiria. Era um
Pokémon, a máscara em sua cabeça indicava que se tratava de algo relacionado
com os Yamask presentes, mas era bem maior e diferente de um. Seu corpo era
semelhante, se não, igual a um sarcófago, a luz da lua revelava a dominância da
cor prata com detalhes transversais em violeta. Estático, os jovens se preocuparam
com o que poderia acontecer.
A criatura,
conhecida como Cofagrigus, levantou a máscara onde supostamente seria seu rosto
e uma faixa preta antes escondida por ela, revelaram dois olhos vermelhos com
expressão perversa e profunda, que foi complementada por uma espécie de sorriso
com dentes pontudos. Mas foi a aura escura com tons roxeados que assustou o
grupo, que quase infartou quando quatro braços com mãos enormes e ameaçadores
apareceram.
Tensa, Hilda
olhou para seus próprios Pokémon, indicando que eles só deviam atacar em caso
de hostilidade. A risada da criatura só pesava mais aquele clima macabro e
ninguém sabia exatamente quais eram os planos dele, já que suas mãos apenas
flutuavam pelo ar.
— A gente faz
alguma coisa? – sussurrou Vic para os amigos.
— Até mesmo os
Yamask pararam com a presença desse Cofagrigus – disse Jackson, observando. –
Deve ser o líder deles, ou uma entidade muito mais perigosa.
O grupo se
atentou quando uma das mãos do Cofagrigus alcançaram a própria lateral de seu corpo
e puxou lentamente, como que se atentasse a fazer tensão. Aos poucos, aquele
corpo de sarcófago foi aberto como uma porta e lá foi revelado algo inesperado.
— HILBERT! –
gritou Hilda.
O corpo do
treinador estava desfalecido, seu rosto estava calmo, mas era possível ver
lágrimas finas escorrendo pelas bochechas. Ele estava em pé, preso pela massa
preta que era vista dentro do Cofagrigus.
“Ele é meu!”,
gritou a voz de Kirie, que saia do Pokémon. “NÃO VÃO ME SEPARAR DO AUTEVIELLE!”
Brianna tomou a
frente, nervosa, olhando pra Vic. O Victini notou e assentiu, assumindo uma
pose nunca vista antes. O corpo do Pokémon foi rodeado por chamas e seus olhos
brilharam.
Vic estendeu o
corpo para frente e chamas foram liberadas de seu corpo. O golpe, conhecido
como Inferno, atingiu o solo e as labaredas se direcionaram aos Yamask,
que gritaram, desesperados. Apesar do fogo generalizado, os que acompanhavam o
Pokémon não foram atingidos.
Com os Yamask
exterminados, restava apenas o que realmente importava naquele momento. Hilda
se levantou e um calor de ódio subiu pelo seu corpo, não suportava ver Hilbert
naquele estado.
— D-Devolva-o! –
a garota sentiu sua voz falhar, mas quem olhava, viu olhos azuis brilhantes
prontos para qualquer coisa. Inari, Vic e Jackson sentiram os corpos arrepiarem.
“Venha pegar”,
provocativa, Kirie afundou para aos poucos para debaixo da terra, sumindo junto
de Hilbert.
Hilda rangeu os
dentes.
— Para onde ela
foi?! – berrou, olhando para seus amigos, que não souberam o que responder.
“Ela voltou para
o Hellish Abbys”, Tomie apareceu, com a voz calma, ela
logo ganhou a atenção dos demais. A gêmea de Kirie estava posicionada na frente
do templo onde estava a Light Stone. “Vocês estão quase lá. Ela está com
medo, então por favor, façam tudo para salvá-la”.
— Salvá-la?! –
questionou Jack, incrédulo. – Essa coisa tá tentando nos matar! A gente é que
deveria ser salvo! – desesperado, o arqueólogo colocou as mãos na cabeça, com
medo e frágil. Bijou, a Cleffa, estendeu suas mãozinhas em direção a ele,
preocupada.
Inari olhou para
o rapaz com pena, se aproximando para dar suporte.
“E-eu sinto
muito”, desculpou-se Tomie, preocupada. “Foi
horrível ficar sem Kirie. Eu consegui escapar, eu tive uma vida depois desse
lugar. Eu me casei, tive filhos e morri de velhice, como deveria ser. Mas Kirie
não, e é tudo culpa minha. Se eu tivesse segurado a mão dela quando ela pediu,
mas eu estava com tanto medo que não conseguia pensar em nada!”
Hilda suspirou.
Seu coração se aqueceu e ela lembrou de Hilbert lhe dizendo sobre a importância
de contar sobre suas dores. Pensou também no seu sonho, ser médica era ajudar,
não lhe importava quem, nem onde estava. Dor era dor, e sua função era curá-la
de alguma maneira.
— Eu não posso
prometer nada – disse Hilda à Tomie. – Eu sou apenas uma adolescente como outra
qualquer, eu não tenho grandes dotes. Sua irmã está com uma pessoa extremamente
especial para mim, eu só cheguei até aqui por causa dele, então minha principal
missão é salvá-lo. Não sei se sua irmã quer ser salva, mas tentaremos o que
estiver no nosso alcance.
Tomie secou
algumas lágrimas inexistentes e assentiu, agradecida. Ela mostrou que o altar
com a Light Stone revelou uma passagem secreta onde escadas levavam para um
andar inferior, lugar onde provavelmente Hilbert e Kirie os aguardavam.
O local era
escuro, então Jackson tomou a dianteira, usando Cleffa com Flash para
iluminar. Após as escadas, um caminho guiava-os por um longo corredor que se
afinava, as paredes eram feitas de pedra, indicando que se aproveitaram das
estruturas naturais para fazer aquela construção. Depois de uma caminhada sem
nada que se destacasse, foi uma fileira de toris vermelhos que indicaram que
estavam chegando a algum lugar.
Hilda reconheceu
a estrutura. Além de ter no jardim, ela teve a vaga memória de ter visto a
mesma em uma visão com a garota pendurada. Inari parou ao lado da jovem.
— Tenho quase
certeza de que depois desses toris, as coisas vão ficar tensas – comentou,
segurando a mão da amiga.
— É como se
tivéssemos perto do inferno. Está sentindo esses arrepios? – disse Hilda para a
sacerdotisa.
— Talvez esses arrepios
sejam por causa DAQUELA COISA – Jackson se aproximou e apontou para um dos
toris, onde uma solitária corda resistia ao tempo e brincava com o ar quente
que era gerado no corredor.
De um clima
bizarro para um clima melancólico, o último flashback foi exibido. Kirie
caminhava no meio de vários monges mascarados com a mesma máscara de Yamask,
sua fronte estava baixa e seu olhar perdido. Seu quimono branco estava sujo de
terra e suas mãos, amarradas, estavam sujas de sangue.
Como numa
narrativa de uma história que estava destinada a ter sempre um final trise, o
grupo conseguiu a voz de Kirie ecoar.
“Estou com
medo...
...
Me prometeram que
eu iria ver o mundo. ELE prometeu. Tomie me deixou.
...
Eu só queria ver
mais uma vez minha mãe. E a árvore de cerejeira do jardim. Tem tanta coisa que
eu queria vez.”
Nas mãos, ela
segurava um galho seco da cerejeira, o único resquício de um mundo que ela
desconhecia. Sua única companhia, para o resto da eternidade.
“Eu quero ver o mundo.”
A cena sumiu.
Inari não conteve o choro e enterrou o rosto na manga de sua blusa, Jackson
abaixou a cabeça em respeito, Vic respirou fundo. Hilda começou a descer o
lance de escada logo a frente e encontrou o galho de cerejeira carregado por
Kirie, ela agachou e o pegou. Apesar de morta, a natureza era poética. O galho
retorcido e preto contrastava com as flores mortas roseadas.
Um ar quente
balançou as mechas do cabelo de Hilda e ela olhou para baixo. Seu destino
estava lá.
— Gente, por
aqui! – a adolescente se levantou e correu, sendo seguida pelos amigos.
Enfim, o tão
esperando encontro. O grupo chegou em um espaço enorme que tinha como principal
figura um abismo de formato retangular. O famoso Hellish Abbys soltava
um ar quente como se fosse a própria boca do inferno. Kirie estava do outro
lado do abismo, encarando-os com o espírito atormentador em suas costas.
O sarcófago de
Cofagrigus com o corpo de Hilbert estava do lado dela.
— Você pretende
negociar ou o quê? – questionou Hilda.
“Não é justo
vocês levarem mais ele de mim!”, disse Kirie.
— Ele não é seu,
Kirie – argumentou. – Não pode manter uma pessoa assim como se ela fosse sua
propriedade! Você só está trazendo mais sofrimento pra você e para os outros.
“O QUE VOCÊ SABE
SOBRE SOFRER?!”
— TALVEZ NEM A
METADE DO QUE VOCÊ SOFREU! MAS EU SEI O QUE ESTOU SOFRENDO! – gritou Hilda de
volta. – VOCÊ ESTÁ COM ALGUÉM IMPORTANTE PARA NÓS!
“Ele prometeu que
ia me ajudar!”, o espírito demoníaco de Kirie se
agitou. “Ele disse que eu iria ver o mundo!”
— Você fala
disso?! – a garota levantou o galho de cerejeira.
“M-Meu
galhinho...”
— Todos nós vimos o que aconteceu nesse lugar
– contou. – Vimos que todos sofreram, principalmente você. Vocês sofreram por
causa da Light Stone, esse objeto atrai muita coisa ruim. Mas nós estávamos
levando isso para longe, para que vocês possam descansar.
Kirie permaneceu
em silêncio, mas logo disse.
“E-Eu estou
destinada a ficar aqui, não é mesmo?”, conformada, ela
estendeu o braço até o sarcófago e levitou o objeto até o grupo. Hilda reprimiu
os lábios, satisfeita em ter Hilbert perto, mas incomodada por ver que no
final, não ajudara ninguém além dela mesma.
Jackson tomou a
frente e o abriu, segurando o corpo do garoto que pendeu pra frente. Ele
ajoelhou e deitou o treinador no chão. Inari, Vic e Hilda se aproximaram, preocupados.
Até mesmo Brianna começou a rodeá-lo, nervosa.
— Ele está
respirando – apontou Jack.
— A gente deveria
ir? – questionou Inari.
— Mas como saímos
daqui?
Hilbert tossiu,
dando sinais de que acordaria. Ele se revirou um pouco e abriu os olhos, cobrindo-os
rapidamente, incomodado com a fraca luz. Aparentemente bem, ele se sentou
enquanto seus amigos olhavam cada movimento dele.
— Hilbert? –
perguntou Hilda, com a voz baixa.
— M-Meu Arceus,
eu nunca mais durmo numa cama como essa – disse, irônico. – Tô destruído.
A garota não
segurou o choro e abraçou o treinador com carinho.
— Como tem
coragem de fazer piadas numa situação como essa, seu idiota?!
Inari, Jack e Vic
riram, igualmente aliviados em saber que o grupo estava junto novamente. Apenas
restava encontrar a saída daquele lugar.
Hilbert
acariciava o cabelo de Hilda e notou Kirie do outro lado. A expressão do
fantasma era de solidão, era possível ver que seus olhos encaram o grupo com
certa inveja. Inveja da liberdade.
— Kirie – chamou
o menino, recebendo ajuda de Hilda para levantar-se. – Eu não sou o Autevielle
que você procura. Você procura Athos Autevielle, o meu pai.
A fantasma olhou
para o garoto, surpresa. O treinador se manteve firme ao falar sobre algo que
lhe causava tanta dor, mas no momento, aquilo era necessário.
— Eu não sei onde
está meu pai, assim como você, eu também fui abandonado por ele – sério,
Hilbert demonstrava uma força que fez Hilda se admirar. – E eu sei o quanto dói
você não poder contar com a pessoa que supostamente deveria estar ali. Eu não
posso chamar meu pai, mas eu espero, em nome dele... Ou melhor, no meu nome,
poder dizer o que você precisa ouvir.
“A-Autevielle”
— Desculpa,
Kirie. Desculpa por te deixarem sozinha. Desculpa pelo seu sofrimento. Desculpa
pela promessa não cumprida. Desculpa por tudo.
Kirie se encolheu
e começou a chorar. Aquelas palavras sinceras tiraram um peso de seu corpo, seu
espírito deixou de carregar uma atmosfera sombria, transformando-a, aos poucos,
em um espírito puro. A figura demoníaca em suas costas desapareceu. Inari ficou
impressionada, estava acostumada com histórias de espíritos que se purificavam,
ainda mais sobre a força do perdão, mas era a primeira vez que ela conseguia
testemunhar tal coisa.
— Me disseram uma
vez que para que possamos te ajudar, você precisa contar onde dói – o treinador
sorriu levemente e sentiu que Hilda segurou sua mão. – Você disse que queria
ver o mundo? Eu não posso fazer muita coisa, mas talvez possamos dar um jeito.
— O galho de cerejeira
– disse Inari, apontando para a mão de Hilda.
— Levaremos esse
galhinho em nossa jornada, e ele vai ver o mundo – sorriu Hilbert. – Dessa vez,
é uma promessa. Vou cuidar dele como se fosse minha vida.
Kirie assentiu,
choramingando.
“Obrigada,
Autevielle. Obrigada”
Tomie surgiu ao
lado da irmã.
“Nee-chan”,
chamou, docilmente.
“Nee-sama!”,
Kirie abraçou sua irmã sem discrição. As duas tentavam sentir o calor uma da
outra, um calor que já não mais existia, mas que só o reencontro já era o
suficiente. Gêmeas predestinadas a um destino cruel que só conseguiram se ver
novamente em um outro plano astral. Pelo menos agora, o grupo de protagonistas
sentiu seus corações leves.
Jackson passou o
braço em volta do ombro de Inari enquanto Hilda e Hilbert continuavam de mãos
dadas. Tomie olhou para sua irmã com um sorriso terno.
“Vamos cumprir
nosso destino, Nee-chan”, disse. “Dessa vez, juntas. Vamos
poder descansar num lugar sem culpa e sem solidão. Você vai ver o mundo de modo
diferente”
Kirie assentiu,
confiante. As duas gêmeas uniram as mãos e se viraram para o abismo, fazendo o
grupo de amigos ficarem assustados.
— E-Elas vão se
jogar? – perguntou Hilda.
Respondendo a
dúvida da menina, as duas penderam o corpo pra frente e caíram no abismo, leves
como pena, desaparecendo na escuridão. A visão seguinte foi ainda mais
relaxante para os olhos. Semelhante a borboletas, pequenas partículas brancas
saíram do abismo em direção ao céu, o grupo contemplou aquilo com os olhos
marejados.
Aqueles eram as
almas de todos as vítimas, que finalmente teriam um descanso.
De repente, uma
luz engoliu os jovens.
Hilda acordou com
areia no corpo, mas não ficou irritada. Olhou em volta e se aliviou ao ver que
estava de volta a Route 4, e também, ficou feliz em ver que todos seus amigos
estavam lá. Jackson ajudou Inari a se levantar.
Ninguém queria
comentar sobre, apesar da missão cumprida e do final supostamente feliz, todos
estavam psicologicamente abalados e modificados. Aquela fora uma aventura nada
convencional e nem se comparava com a brincadeira de coletar insígnias e
procurar fragmentos. Hilda guardou os espólios da Light Stone em sua bolsa e se
aproximou de Hilbert para devolver a mala do garoto.
Hilbert estava
ajoelhado em frente a uma esfera docilmente encostada em um galhinho de
cerejeira. A Heal Ball, igual a de Mercuria, a Vaporeon, curava os danos do
Pokémon dentro dela.
— Tem um Pokémon
aí dentro? – perguntou Hilda.
— É a Kirie –
respondeu o garoto. – Bem, não é exatamente ela. Mas você entendeu.
Jackson e Inari
se aproximaram, junto de Vic.
— Provavelmente
foi o Cofagrigus que nos atacou – o arqueólogo riu. – Irônico, não é?
— Vai ficar com
ela? – perguntou a sacerdotisa.
Hilbert pegou a
esfera e o galhinho de cerejeira.
— Eu prometi
levar ela para ver o mundo. Está pronta, Kirie?
Capítulo 39
Quando a mão tocou o ombro de Hilda, sua reação foi arremessar o bloco de notas que segurava contra o suposto ser que encostara nela. O berro de dor emitido pelo Victini poderia ser confundido com o grito de assombração de algum fantasma.
— EU VOU EXIGIR UMA CIRURGIA PLÁSTICA COM O
TANTO DE COISA QUE VOCÊS ARREMESSAM NA MINHA CARA! – protestou o Pokémon,
irritado.
Hilda sentiu seu coração leve ao ver que um de
seus amigos estava bem – tirando a marca vermelha deixada pelo bloco de notas
arremessado -, por isso, não hesitou em abraçá-lo, choramingando:
— VIC! VIC! VOCÊ TÁ VIVO!
— Mulher, para de ser dramática – disse
Vic, mas igualmente feliz em ver a garota. – Se bem que você quase me matou.
— D-Desculpe – riu a morena, nervosa, soltando
o Pokémon. – Eu achei que fosse um fantasma.
— E sua reação foi arremessar um objeto que
provavelmente atravessaria ele? – ironizou o Victini. – Seria melhor
ter usado um aspirador.
— É bom ver que seu senso de humor não muda num
lugar como esse – retrucou Hilda.
— Estou tentando esconder o pavor. Sabe onde
estamos?
— Manor of Twins – contou a garota,
levantando-se. – Aqui é o último lar da Light Stone.
— Se é o último lar, foi aqui que Jackson a
encontrou?
— Faz sentido, mas duvido que Jack tenha se
enfiado em uma mansão como essa. Será que... – ela fez uma pausa para pensar. –
Essa mansão foi coberta de areia pelo tempo e estamos ainda na Route 4?
— Pode até ser, mas como estamos aqui?
— Provavelmente a tempestade de areia nos
engoliu e fomos “transportados” para esse lugar – explicou Hilda.
— Cara, tudo isso é surreal – concluiu o
Victini. – O que faremos?
— Estou sentindo a presença da Light Stone,
então estou pensando em procurar os fragmentos e os outros – Hilda mostrou a
bolsa de Hilbert. – Eu encontrei isso, está intacta, então espero que ele ao
menos esteja bem.
— Nenhuma pista de Inari e Jackson?
— Não. Mas eles estavam juntos na hora da
tempestade.
— De toda forma, pra que direção vamos?
Antes de uma decisão ser tomada, a dupla ouviu um
choro baixo feminino. Não chegava a assustar, mas se tratando de uma mansão
assombrada, qualquer presença não humana já deixaria qualquer um arrepiado. A
lamentação era seguida de palavras indecifráveis, Vic e Hilda viraram-se na
direção da mulher que estava sentada em um lance de escadas no final do
corredor a direita.
Seu quimono roxo e seus cabelos negros batiam com a descrição que Grimaud dera em seu bloco de notas. Hilda se aproximou, encanada em saber o motivo da lamentação, já que a moça não parecia notar a presença deles, preocupada apenas em seguir com seu eterno pranto.
“Eu não aguento mais”, foi a primeira oração que a dupla ouviu
quando pararam em frente a ela. Seu corpo estava marcado com queimaduras
graves, possivelmente indicando a causa da morte. “Tudo isso porque levaram
Tomie para fora daqui”.
— A gente deveria tentar dialogar? –
sussurrou Vic para sua companheira.
— Hã... – a morena agachou na altura da mulher,
tentando algum contato visual, mas ela mantinha seu rosto escondido nas pernas.
– Com licença?
“Os espíritos ruins vão chegar, eles vão querer
a Light Stone. Esse negócio é uma maldição”, ela se levantou com a fronte baixa, caminhando para uma das portas
presentes e adentrando a sala por trás dela, atravessando-o com a sua forma
espectral. Hilda levantou-se num pulo.
— V-Vem Vic – alertou ela, seguindo a fantasma.
— A gente vai realmente seguir um fantasma?
— Ela falou sobre a Light Stone. Talvez eles
estejam tentando nos guiar – Hilda agarrou a maçaneta da porta de correr e abriu
com discrição. O gemido da porta foi alto e ela revelou guardar uma espécie de
escritório no mais estilo Johtoniano.
Não tiveram tempo para apreciar o ambiente pois
logo se depararam com a figura espectral da mesma mulher que chorava, só que
dessa vez, seu corpo não estava queimado e sua expressão era de preocupação.
Hilda sentiu a espinha gelar quando um outro fantasma atravessou seu corpo, era
um homem de meia idade.
“A idade delas está quase chegando”, disse o homem.
“Pelos deuses, Ranmaru, são suas filhas. Nossas
filhas”, retrucou a mulher,
inconformada.
“É pelo nosso bem, e pelo bem desse lugar,
Akiri. Ficamos responsáveis pela Light Stone como pedido da família Kurosawa, e
nós, da família Muramasa, devemos cumprir essa missão”.
“Esse objeto é uma maldição para nós!”
Hilda observava o olhar agoniado da mulher
conhecida como Akiri e sentiu um aperto no peito, com uma preocupação que as
vezes lhe assombrava: Se juntasse os fragmentos da Light Stone novamente,
olhares como aqueles seriam frequentes?
Vic pousou no ombro da amiga, ainda temeroso pelo
que podia acontecer. A cena mudou, os fantasmas sumiram e reapareceram para
contar outro capítulo. A dupla ouviu a porta abrir com força, era Ranmaru
novamente, mas sua expressão séria havia mudado para a de puro ódio.
“VOCÊ AS AJUDOU A ESCAPAR?!”, berrou o dono da mansão.
Akiri levantou-se num pulo.
“Não, nunca!”
“Tomie sumiu, só conseguimos capturar Kirie”, informou Ranmaru. “Eu sabia que não devia
deixar desconhecidos nos acompanharem nos rituais, eles são impuros. Vamos enforcá-la
e jogá-la no Hellish Abyss”, ele suspirou, demonstrando o mínimo de medo
por baixo do semblante de ódio. “Esperamos que dê certo”.
“Ranmaru, elas fugiram pois não queriam esse
destino, poupe Kirie disso”,
implorou Akiri, com as lágrimas saltando.
As duas
figuras espectrais se dissiparam e a história não continuou. Hilda permaneceu
em silêncio enquanto Vic olhava pra ela, com uma expressão de quem sabia que
tinha que aguardar as reflexões da amiga, por isso, só permaneceu ali, disposto
a oferecer qualquer apoio necessário.
— E-Eu... Não vi tudo da história... Mas essas
pessoas estavam sofrendo por conta da Light Stone, certo? – disse Hilda, não
sabendo se ela estava falando sozinha, com Clara ou com Vic.
Foi o Pokémon anjo que respondeu:
— Olha, Hilda, eu queria até responder com
uma frase motivacional – Vic encostou sua bochecha na da garota. – O
passado tá no passado, eles sofreram com as consequências deles. Você tá
vivendo o agora, está fazendo o que acha melhor para ajudar, não se
sobrecarregue tanto.
A menina olhou para o amigo Pokémon e soltou
uma risada terna.
— No final, isso foi uma frase motivacional,
não?
— Ninguém quer te ver triste. Seja lá o que
vai acontecer quando juntarmos esses fragmentos, vamos fazer de tudo para que
nenhuma pessoa mais precise chorar – sorriu Vic. – Eu sou o Pokémon
Vitória, então eu meio que torço para isso.
Hilda sorriu, aliviada por não ser a única a
pensar nessas coisas. No final, toda aquela aventura era sobre um grupo de
malucos que assumiram, junto dela, a responsabilidade de salvar Unova e impedir
que rostos tristes sejam frequentes novamente.
Os olhos azuis da garota encontraram um objeto
perdido sobre um travesseiro de aparência firme conhecido como zabuton. O colar
brilhava levemente como se fosse um item importante numa quest, era
feito de prata e possuía uma corrente fina, indicando que pertencia a uma
figura feminina. Hilda só teve certeza de que pertencia a Akiri quando se
aproximou o suficiente para ver o pingente com a silhueta de duas meninas de
mãos dadas.
Vic analisava os movimentos da amiga e a viu se
agachar para alcançar o objeto, mas só teve tempo de estender a mão para frente
quando viu Hilda ser engolida por chamas que brotaram do chão.
“Sou eu, Auteville”, reforçou a fantasma de quimono branco. “Kirie.
Você prometeu me levar para longe desse inferno, desse meu trágico destino”.
Hilbert continuava com a respiração presa,
temendo por sua vida. Não tinha a mínima noção do que estava acontecendo, nem o
motivo de uma criatura horrenda saber seu sobrenome, a única certeza era de que
não podia vacilar ou qualquer passo em vão poderia custar sua vida.
— M-Moça, de novo, e-eu não te conheço – ele
foi cauteloso nas palavras. – Eu peço perdão se não posso te ajudar. Eu só
quero encontrar meus amigos, estamos aqui por engano. Eu ouvi uma voz me chamar
e agora todo mundo sumiu.
“Fui eu que te chamei, senhor Autevielle!”, revelou Kirie, ansiosa, se é que tal
sentimento era possível para um fantasma. “Eu senti você. Você voltou para
me buscar e me levar para minha irmã Tomie, não é?”
Apenas Grimaud chamava Hilbert de senhor e ele
sabia muito bem que o único motivo era por causa de seu pai, Sir Athos
Autevielle. Concluiu então que o Autevielle que Kirie procurava era sua
estimada figura paterna, infelizmente, Hilbert não podia ajudar muito, já que
nem ele mesmo sabia onde Athos estava. Porém, contar que ele havia simplesmente
desaparecido estava fora de questão, a julgar que não saberia qual iria ser a
reação de Kirie.
— D-Desculpe, eu realmente não sei como te
ajudar – desculpou-se o menino, mais uma vez, torcendo para que dessa vez a
fantasma entendesse.
“N-Não é justo! Tomie conseguiu fugir”, a de quimono branco começou a se agitar, e a
figura fantasmagórica assustadora que a acompanhava apresentou sinais de
hostilidade. Hilbert sentou-se na areia, recuando aos poucos, temendo pelo
pior. Kirie tentava se aproximar, resmungando e praguejando sobre fugir dali e
de estar com medo, mas era o treinador que estava cada vez mais apavorado.
A calmaria veio quando o fantasma ajoelhou no
solo e começou a lamentar. Um choro vazio e triste sem lágrimas, de alguém que
já chorou por muito tempo, mas que nunca houvesse alguém que limpasse toda a
dor.
“Ele prometeu. Ele prometeu que nada de ruim
aconteceria, que nunca me deixaria sozinha, que faria de tudo para dar um
futuro diferente para mim”, a
fronte apavorante de Kirie olhou para o treinador que estava chocado com as
palavras. “Ele me abandonou mesmo depois de prometer que tudo ficaria bem”.
Hilbert estava com o olhar perdido, como era
possível que ele e aquele espírito fossem tão parecidos. Mentalmente, ele
amaldiçoou seu próprio pai.
— P-Podemos achar uma s-saída – disse o garoto,
tentando negociar sua própria saída dali. – N-Não sou exatamente quem você
procura, mas podemos dar um jeito.
Kirie deu sinais de calma, mas foi a criatura
presa a ela que começou a gemer agitado de dor. A fantasma voltou sua atenção
para ele, trocando olhares como se conversassem. A expressão da mulher de
quimono branco mudou para algo aterrorizante e toda a máscara de lamentação
caiu sobre o solo e o treinador voltou a sentir seu corpo arrepiar.
“NÃO VÃO PEGAR ELE DE MIM!”, berrou Kirie, com sua forma espectral
desaparecendo aos poucos, mostrando que logo deixaria o menino sozinho de novo.
— N-Não! Espera! – Hilbert estendeu a mão para
tentar agarrá-la, mas quando se jogou, atravessou e caiu na areia. A solidão
voltou a ser sua companhia. – N-Não quero ficar sozinho...
Suspirou e se levantou, limpando a roupa. Um
raio avermelhado veio de seu bolso e atingiu o solo, de lá, Brianna saiu. A
Snivy olhou para seu treinador e começou a entrelaçar-se entre as pernas do
menino.
— No final, o conselho de Jackson foi bem útil
– disse ele, sentindo um alívio no coração. – N-Não fica com medo, Brianna,
v-vamos sair daqui. Pelo menos agora, temos a companhia um do outro.
Maldita boca, era o que Hilbert diria logo em
seguida quando a areia em sua volta começou a se mover. Snivy se posicionou em
pose de batalha, vendo que o que surgia por debaixo da areia eram Pokémon. Um
grupo de aparência curiosa, parecidos com sombras, carregando na parte inferior
de seu corpo uma máscara amarelada com expressões diferentes, revelando que
aquele eram os rostos de quem já foram quando vivos. Os olhos vermelhos
arregalados encaram até a alma da cobra de grama e do treinador, enquanto
balançavam seus braços lentamente.
— E-Eu não e-estou com a minha Pokédex – disse
Hilbert, intimidado por não conseguir informações sobre aquelas criaturas. O
grupo era composto por mais de dez deles, o que deixava a inicial de grama em
desvantagem. – C-Cuidado, Brianna.
Os Pokémon com máscara começaram a se
movimentar e mergulharam em direção a Hilbert, que foi defendido pela sua
Snivy, utilizando seus golpes de grama para contra-atacar.
Mesmo sendo oponentes fracos, mais e mais
daqueles surgiam, como se fossem a cabeça de uma hidra. Por um descuido, um dos
Pokémon agarrou o rosto de Hilbert com suas mãos de maneira bizarra, soltando
grunhidos desesperados, puxando a pele da face dele na intenção de arrancá-la,
como se precisasse de uma nova máscara e um novo rosto. O treinador gritou,
tentando afastar o Pokémon, enquanto outros deles agarravam seu corpo.
Brianna se livrou de algumas criaturas que a
atacavam e virou-se para seu tutor, notando que os fantasmas puxavam o garoto
para dentro da areia. A Snivy sentiu estar ficando maluca ao ver que os Pokémon
pareciam fantasmas humanos com roupas de épocas antigas. Louca ou não, a
inicial de grama usou um Leaf Tornado contra eles. O tornado de folhas
levou os fantasmas para longe, fazendo Hilbert se soltar e cair com a fronte
baixa.
Snivy se aproximou do menino, que aparentava
exaustão, mas foram as finas lágrimas escorrendo pelo rosto ensombrado dele que
cortaram o coração de sua Pokémon. Ele deu alguns soluços e olhou com pavor
para sua inicial:
— Eu estou com medo, Brianna...
Coberta por determinação, Brianna sentiu seu
corpo arder e o brilho da evolução veio. Até mesmos os Pokémon que atacavam,
pararam para ver. Como uma versão crescida da própria Snivy, Servine possuía um
corpo esguio maior e folhas brotando em suas costas até sua cauda. Em seu
peito, uma estrutura amarelada em formato de V ultrapassava para além dos
ombros, seus braços haviam encolhido e seus olhos estavam mais estreitos e
maduros.
Hilbert admirou ao ver. Era a primeira vez que
um Pokémon seu evoluía. Mas não teve tempo de aproveitar, já que seu corpo
cedeu ao cansaço e ele apagou. Brianna continuou próxima do treinador e viu
Kirie retornar, afugentando todas as criaturas sombrias. A inicial jurou estar
protegida, mas seu corpo paralisou quando a mulher de quimono branco e o
fantasma demoníaco começaram a se aproximar, com uma expressão que não era de
boas intenções.
“Vocês precisam salvar Kirie”, a voz confortante que soprou como brisa nas
nucas de Inari e Jackson fizeram os dois tremerem. Eles se entreolharam, decidindo
mentalmente quem seria o corajoso a olhar. A sacerdotisa foi a escolhida e seus
olhos esverdeados encontraram um rosto mais novo que ela. A fantasma usava um
quimono branco, mas tinha uma aura completamente diferente do espírito que
viram no quarto.
Os cabelos negros curtos contrastavam com a
pele pálida e a expressão calma. Inari engoliu seco, ainda pensando se podia
relaxar ou pensando em quão louca era toda aquela situação.
“Por favor, salvem a minha querida irmã”, suplicou novamente.
— Tá falando daquele demônio que engole a gente
só com o olhar? Não acho que ela queria ser salva – respondeu Jackson, com uma
risada ligeira e nervosa. A sacerdotisa lhe deu uma cotovelada de repreensão.
— Estamos tentando sair daqui, estamos por
acidente aqui – explicou a ruiva.
“O senhor Autevielle nos ajudou a fugir do
Ritual das Gêmeas, mas Kirie ficou para trás”, contou a garota. “Nossa missão era proteger a nossa casa dos
espíritos obsessores que rondam a Light Stone, mas eu não queria matar minha própria
irmã. Por favor, nos ajudem”, e assim a menina desapareceu.
— R-Ritual? – Jack olhou para a mulher ao seu
lado, sentindo a espinha arrepiar só com o som da palavra.
— Os povos mais antigos utilizavam de rituais
que envolviam sacrifícios com símbolos – explicou Inari. – O Ritual das Gêmeas
é desconhecido até para mim.
— Se me permitem, acho que estou me
recordando das coisas – Grimaud saltou sobre o ombro de Jackson. – Aquela
era Tomie, a garota que conseguimos resgatar. Sua irmã, a Kirie, infelizmente
ficou para trás.
— Não quero bancar o adivinha, mas talvez toda
essas coisas esteja relacionado com essa fuga mal sucedida – presumiu Jackson.
— Um espírito que ficou preso nesse plano por
conta de uma missão não cumprida ou uma mágoa... – completou Inari, reflexiva.
– Talvez ajudar a tal Kirie seja a nossa saída.
— E a gente faz o quê? Exorciza? Joga água
benta? Sal? Bate na madeira? – o arqueólogo cruzou os braços, não muito
contente com a ideia.
— Grimaud-sama, pode nos ajudar a recriar os
passos que fez aqui quando era humano? – perguntou Inari para o pequeno Joltik.
O Pokémon saltou alto, tentando ter uma visão
geral da mansão, tentando se lembrar daquele ambiente.
— Depois que o senhor Ranmaru nos apresentou
a mansão, eles nos apresentaram a Kirie e Tomie. Não podíamos vê-las
diretamente, apenas ouvi-las.
— Eles provavelmente queriam mantê-las puras
para o mundo. Isso explica o quarto não ter janelas – contou Inari, se
levantando.
— Se me lembro bem, e se a visão estava
correta, nós fomos para lá – o inseto salvou em direção da varanda. – Foi
por aqui!
— Pera aí! – protestou Jack. – A gente vai
brincar de Ghostsbusters e caçar fantasmas? Digo, já vimos um que quase sugou
nossas almas, imagina o que podemos encontrar se a gente seguir exatamente os
passos que eles estão nos mostrando.
Inari virou-se para ele com uma expressão
brincalhona.
— Você está com medo?
— Sinceramente? APAVORADO! – respondeu o
arqueólogo. – Eu odeio filmes de terror, jogos e qualquer coisa do gênero.
— Ah, vamos lá, Jackson-sama – a sacerdotisa
colocou as mãos nos quadris, se divertindo com a situação. – Qualquer coisa
você segura a minha mão.
O silêncio predominou e Inari corou quando
percebeu no que tinha acabado de dizer. Jackson coçou os cabelos bagunçados,
sentindo a orelha esquentar. Caminhou em direção onde Grimaud os aguardava,
passando perto da colega.
— Essa frase é minha, ok?
O trio adentrou a mansão e já foram
recepcionados por vultos de Athos andando pelos corredores. A forma espectral
indicando o flashback estava sozinho e virou um corredor a direita. Os três não
pensaram muito e seguiram o mosqueteiro, mas logo pararam ao ver que o mesmo
havia parado na frente de uma parede.
“Vocês podem me ouvir?”, disse Athos, agachando para ficar mais
confortável.
“S-Senhor Autevielle?”, respondeu uma voz feminina, abafada pela
construção.
“Sou eu mesmo”, riu o homem, em resposta. Jackson percebeu
como a risada era bem semelhante à de Hilbert, ainda que mais elegante.
“T-Tomie, é o senhor Autevielle!”, a menina de dentro do quarto pareceu agitada.
“Já ouvi, Kirie, já ouvi”, riu uma segunda voz.
“Dormiram bem?”, perguntou Athos.
“Com certeza. E o senhor?”, perguntou Tomie.
“A recepção foi maravilhosa, então minha noite
foi incrível”, contou o
mosqueteiro. “Meu quarto fica de frente para a árvore de cerejeira do jardim
de vocês. É tão lindo”
“Sério?”, a voz de Kirie parecia de surpresa. “Vimos poucas vezes, então não
nos lembramos”.
Athos soltou um longo suspiro. Sua feição
parecia de preocupação e seu olhar estava perdido em pensamentos. Grimaud
olhava para seu antigo mestre com uma expressão de quem sentia falta dos velhos
tempos.
“Posso contar algo para vocês?”, Athos começou a espiar por uma rachadura,
conseguindo enxergar a expressão curiosa das gêmeas. “Meu maior sonho é ter
filhos. Infelizmente, eu sou um andarilho sem-terra que passo a maior parte do
tempo ajudando pessoas. Mas eu adoraria ter alguém pra mostrar o mundo e todas
as maravilhas dele.”
Inari e Jackson se entreolharam. Chegaram em
pensar em Hilbert, imaginando se Athos havia mantido esse pensamento até os
dias atuais.
“Papai nos contou que somos as escolhidas para
o Ritual das Gêmeas, então temos que ficar aqui, sem contato com o mundo
externo”, contou Kirie. O
mosqueteiro notou que a menina brincava com um galho seco da cerejeira. “Mas
eu tenho muita vontade de conhecer o mundo lá fora.”
“Eu prometo que assim que fizermos o ritual,
irei para todos os lugares”,
Tomie segurou a mão de sua irmã. “E você vai vir comigo, porque seremos uma”.
Inari virou-se para Grimaud.
— Grimaud... O que é, afinal, o Ritual das
Gêmeas?
— Enquanto o senhor Athos conhecia as
gêmeas, eu conversei com a senhora Akiri, a mãe delas – contou o Joltik. – Ela
era uma mulher muito bonita com seus cabelos negros, mas sempre tinha um olhar
vazio. Demorou algum tempo até que me contasse qual seria o destino das duas irmãs.
— Tomie contou algo sobre matar a irmã –
lembrou Jackson, meio se preparando para digerir a história.
— Existe uma crença que irmãos gêmeos são a
mesma alma dividida em dois corpos – apesar de não ser algo rotineiro,
Grimaud contava com seriedade, mostrando todo seu respeito com o acontecido. – Para
proteger a mansão e a vila de espíritos ruins, de tempos em tempos, gêmeos são
escolhidos para realizarem o ritual de purificação. O irmão que nasceu por
último deve matar estrangulado o irmão que nasceu primeiro, já que, se me
lembro bem, acredita-se que o mais velho e mais forte ajuda o mais novo e fraco
a nascer primeiro para depois vir ao mundo.
— Eu já ouvi falar sobre essa crença – contou
Inari. – Pelo que Tomie disse, ela é a mais velha das duas?
— Exatamente. Depois de estrangulada, o
corpo é jogado no Hellish Abyss e se funcionar, a vila e a mansão ficam purificadas
até o próximo ritual.
— Se Athos fugiu com as gêmeas, isso significa
que o ritual deu errado. Mas o que exatamente aconteceu com Kirie que foi
deixada para trás? – questionou Jack, analisando as informações com a mão no
queixo.
Seu corpo tremeu quando ele encaixou alguns
fatos. Haviam capturado Kirie e tentado fazer o ritual mesmo incompleto, o que
provavelmente deixou o espírito com uma carga negativa enorme, o que explicaria
a figura sinistra que tiveram que encarar há alguns minutos.
— Ela deve ter se sentido sozinha e incapaz –
comentou o arqueólogo, com a voz baixa.
As velas do ambiente crepitaram e sacudiram com
força, o ambiente entrou em uma atmosfera perturbadora. Inari sentiu seu corpo
pesar e olhou para trás. Kirie estava lá, com seus olhos maliciosos.
Mais de perto, era possível ver a corda em seu
pescoço magro, a corda era conectada ao espírito obsessor que gemia de dor e
agonia. Suas mãos, apesar de pálidas, estava com os dedos sujos do que parecia
lama e sangue, indicando que ela havia lutado pela sua sobrevivência antes de
ser brutalmente assassinada, além de esquecida e abandonada.
As mãos de Kirie alcançaram o pescoço de Inari.
“Vocês não deveriam ter vindo tão longe. Se eu
não saí daqui, ninguém mais vai”,
disse ela, aplicando certa força contra o pescoço da sacerdotisa, que não
conseguia se mexer.
— INARI! – gritou Jackson, se jogando para cima
da mulher, envolvendo-a num abraço, afastando-se do fantasma.
Kirie começou a rir de forma bizarra, seu corpo
pendeu levemente para trás enquanto sua risada mexia com a iluminação local. As
velas se apagaram e um trovão ribombou no céu, mesmo o tempo estando limpo. A
luz causada pelo fenômeno revelou algo que brincaria com a sanidade dos
presentes.
Corpos esqueléticos e sem vida forravam todo o
chão de madeira velha. A semelhança entre eles eram as máscaras amarelas de
expressão neutra, os únicos rostos que apareciam revelavam faces horrorizadas.
Inari tremeu de medo e continuou abraçada com Jackson, ambos previam o pior.
— N-não consigo me mexer – sussurrou a
sacerdotisa, com a voz pesada e os olhos molhados.
— V-Vamos morrer aqui? – perguntou o
arqueólogo, segurando a mão da mulher.
O grunhido de Bijou na mochila de Jack chamou a
atenção dos dois. A Cleffa pulou no ombro de seu tutor e se preparou para
utilizar um golpe, estendendo as curtas mãos para frente e emanando um brilho
forte de seu corpo. Flash era um golpe popular por treinadores para
iluminar cavernas escuras, mas aqui, ele serviu como um repelente para o
espírito de Kirie, que cobriu os olhos, como se aquela luz fosse divina e
estivesse condenando-a por seus pecados.
Jackson sentiu que seu corpo se movia novamente
e não pensou duas vezes antes de agarrar o pulso de Inari e sair correndo,
fugindo novamente daquela criatura demoníaca. Bijou grunhiu em resposta quando
seu treinador a agradeceu.
A sacerdotisa apontou para o fim do corredor e
lá estava Tomie, apontando para o corredor da esquerda. Confiantes, os dois
viraram e subiram um lance de escadas para o segundo andar. Andar esse que
havia tantas portas que eles escolheram a primeira que viram, entrando em um
quarto de visitas.
O quarto dava visão para o aclamado Jardim da
Cerejeira. Os humanos respiraram fundo, recuperando as energias e o fôlego. Inari
caminhou pelo quarto, indo até a janela, tentando colocar os fatos no lugar,
evitando que sua mente colapsasse e ela perdesse a sanidade, tanto ela quanto
Jack sabiam que precisam com urgência achar a saída.
Foi quando a visão para o jardim lhe chamou a
atenção de algo finalmente conhecido. No pequeno templo próxima a árvore estava
uma garota de cabelos castanhos e blusa rosa que encarava a entrada.
— J-Jackson-sama – alertou a sacerdotisa. – É-é
a Hilda!
Parecia estar em um cenário de flashback em preto
e branco igual alguns filmes que sua mãe atuava. Hilda olhou em volta e notou
estar na entrada da Manor of Twins, em uma época em que havia vida, a julgar
pela aparência convidativa, mesmo tudo estando sem cores. Na sua mão, o colar
de Akiri, o objeto que provavelmente havia transportado ela até lá.
Na sua frente, Ranmaru e a própria dona do
objeto, com feições mais joviais e felizes pareciam aguardar alguém. A mulher
foi a primeira acenar levemente, indicando que a tal visita chegara.
A Foley olhou em direção para onde os dois
olhava e logo viu um homem de meia idade, a julgar pelos fios brancos que
nasciam escondidos entre as mechas ruivas. Usava um quimono tradicional da
época e carregava consigo um objeto dentro de uma bolsa de pano. Hilda sentiu
seu peito arder e já adivinhou do que se tratava.
O homem enfim, parou para os dois que o
recepcionava:
— Senhor e senhora Muramasa – ele se curvou,
cordialmente – Meu nome é Junsei Kurosawa e vim lhes trazer a Light Stone.
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