• Capítulo 20


    — Quanto pesa uma coroa, Anthea? – questionou N, sentado gentilmente em um sofá, observando o quadro de uma pintura antiga de uma paisagem de Unova, provavelmente de dentro da Pinwheel Forest.

    A moça com quem se comunicava olhou curiosa para o rapaz, ela tinha lisos e leves cabelos róseos e uma expressão tranquila, suas delicadas mãos estavam ocupadas costurando uma espécie de capa. Quando processou a pergunta, ela sorriu:

    — Depende de vários fatores, meu querido irmão. Mas eu ouvi dizer que algumas pesam até um quilo.

    — Eu não falo de peso físico...

    — Oh – a mulher, alguns anos mais velha que N, assentiu. – Bem, tem que pensar que qualquer problema que acontecer será responsabilidade sua, mesmo que você nem esteja presente.

    — Isso foi meio duro – o rapaz de cabelos verdes olhou para a irmã.

    — Eu sei, querido. Pode se levantar? Preciso checar uma coisa.

    Os dois se aproximaram e Anthea envolveu o jovem, que era alguns centímetros maior que ela, com a capa branca que costurava.

    — Está perfeito – a moça sorriu gentilmente e ajeitou a peça que cobria todo o corpo o rapaz. – Lembro que o papai usava um cobertor velho para simular esse momento várias vezes na sua infância. Ele vai se sentir muito nostálgico ao ver isso.

    — Anthea... – N respirou fundo. – Por que eu?

    — É tão difícil assim me chamar de irmã? – a risada da outra parecia um tanto decepcionada.

    — Perdão, é meio difícil pra mim... ainda.

    — É, eu entendo – o sorriso de compreensão logo veio, como se ela tivesse ouvido várias vezes essa mesma desculpa. – Sobre sua pergunta. Você é puro N, como um quadro em branco pronto para ser pintado.

    — E isso é bom?

    — Bem, querido – Anthea o olhou no fundo dos olhos, como se procurasse conversar com sua alma. – Não sou eu que escolho as tintas.

    Natural tinha ouvido falar da chegada da Dark Stone no castelo da Team Plasma. Na verdade, não sabia da existência daquilo até o dia que Kogsu, um dos generais, por assim dizer, da equipe, lhe contou sobre e de como estava pesquisando pela sua localização. Sua atenção ganhou mais destaque quando leu sobre Zekrom, o dragão negro que representava os IDEIAIS.

    Mas a pressão de Ghetsis a respeito da coroação dele não o deixava pensar nas possibilidades que teria se tivesse Zekrom como seu amigo, até que a ideia surgiu.

    — Se você me trazer o objeto que Kogsu procura – ele disse naquele fatídico dia. – Eu aceito me tornar rei.

    Não sabia se o mais velho tinha aceitado a proposta por desespero em ver seu filho ser coroado ou se tinha um pouco de empatia em seu coração que queria ver N feliz. Preferiu acreditar na segunda opção, ainda que a primeira fosse a cara de Ghetsis.

    Resolveu então, conferir pessoalmente a beleza da Dark Stone, ela estava depositada em uma espécie de altar como uma figura sagrada, numa sala tão protegida quanto um sistema penitenciário. N se questionou os motivos das pessoas endeusarem tanto um objeto. Recebendo autorização de membros de segurança para adentrar, ele caminhou com passos leves e surdos até a esfera, que brilhando feito mármore, era rodeada por pequenas ondas elétricas azuis.

    — Você está aí, Zekrom? – Natural questionou, inocente, mas não obteve resposta. – Vamos lá, eu só quero conversar com você...

    Não é tão fácil conquistar ele – o rapaz de cabelos verdes quase deu um pulo ao ouvir uma voz.

    — E-Eu pensei que estava sozinho.

    Teoricamente está. Eu sou parte de você, Natural – o homem continuou a falar. – Estou “dentro da sua cabeça”. Dividimos a mesma alma.

    — Estou delirando de novo, né? – o jovem virou o rosto, dando leves tapas em sua bochecha para verificar sua sanidade.

    Que tal recomeçarmos as apresentações? Eu sei o seu nome, mas você não me conhece – a voz parecia alegre. – Sou Eric, muitos me conhecem também como O Príncipe Negro.

    — Príncipe Negro? Nunca ouvi falar.

    S-sério? – o príncipe parecia desconcertado. – Você não lê livros?

    — Leio, mas só os que o meu pai e minhas irmãs me davam – N suspirou, parecia um bobo contando sobre sua vida pessoal para uma voz em sua cabeça.

    Pois bem, é uma pena. Mas para resumir, eu e Zekrom somos parceiros. E agora, você é a continuação do meu legado, é sua vez de se juntar a ele e provar para o mundo que os IDEAIS devem prevalecer e comandar o mundo.

    — ... Outra pessoa querendo colocar títulos em mim – murmurou o jovem, não escondendo a decepção na voz.

    Ninguém te coloca títulos à toa, meu rapaz, eles são lhe dados baseados na sua fama ou nos seus feitos.

    — Não sei se Natural, o Rei é o título certo pra mim.

    Pois agora, para mim, você será Natural, o Nobre Destinado.

    — Destinado a que exatamente?

    A conversa foi interrompida por leves passos que surgiram no ambiente, a atenção de N foi toda roubada e ele viu sua pequena Katrina se aproximar, roçando carinhosamente em sua perna, miando gentilmente, o jovem sorriu.

    — E não é que ela sempre sabe onde você está? – uma figura feminina loira surgiu, sorrindo animadamente. – Finalmente te achei, meu irmãozinho.

    — Oh, Concordia – observou o de cabelos verdes, reconhecendo a figura. – Estava só... Observando o objeto que pedi para Ghetsis trazer.

    — Sabe que o papai sempre faz de tudo para te ver feliz – a mulher se aproximou.

    — Desde que eu apresente algo do interesse dele em troca – o rapaz cruzou os braços, observando a Dark Stone, tentando não transparecer toda a ansiedade.

    — Vocês nem parecem pai e filho falando desse jeito – riu a outra. – O papai é meio ambicioso, mas ele não é só isso, ele ama a gente.

    N suspirou e olhou para sua Purrloin, como se implorasse para que ela o levasse para um mundo diferente sem preocupações. Ao notar que não obteve resposta, Concordia coçou a garganta de leve:

    — Estava conversando com a esfera? Ouvi sua voz no corredor.

    — É difícil explicar – o rapaz suspirou, tentando procurar palavras para explicar. Talvez sua irmã o pudesse ajudar. – Tem uma voz na minha cabeça.

    — Todos nós temos uma voz interna, querido – respondeu a loira, sem dar muito tempo de ele completar sua explicação. Sem maldade, ela não parecia estar muito interessada na explicação, provavelmente estava sendo gentil. – Cabe você ouvir ela ou não.

    — Não é isso! – exclamou o rapaz, mas logo em seguida se arrependeu. A voz tinha saído mais alto do que ele imaginou. – D-Desculpa...

    — Não foi nada, você só está nervoso e ansioso com a coroação – Concordia sorriu. – Todos nós estamos, na verdade. E eu vim te buscar justamente para começarmos logo a cerimônia. Vamos lá?

    Outro suspiro se ouvir e pelo menos, naquele momento, ele resolveu deixar a história do Príncipe Negro de lado e “aproveitar” a cerimônia. Era hora de assumir a máscara do Rei N.

     

    A base de operações principal da Team Plasma, também conhecido como o Castelo dos Plasmas não tinha uma localização específica, mas era dito que ficava ao norte da região de Unova. O motivo de tanta confusão quanto ao seu posicionamento específico no mapa se devia ao fato da construção se localizar, por algum motivo, ficar abaixo do solo. Tinha pelo menos cinco andares, espaço suficiente para um exército de capangas leais que moravam nos andares inferiores, enquanto nos andares superiores, os Sete Sábios – os maiores apoiadores e fundadores da Team Plasma – viviam com seus filhos, além do próprio Ghetsis, o cabeça da equipe, Concordia e Anthea. E por fim, o jovem N, futuro rei daquela monarquia.

    Natural alcançou o salão de festas com suas irmãs sem grandes cerimônias, o ambiente estava decorado adequadamente para a ocasião com tons de dourado e prata, o dono do evento parecia não querer economizar no luxo daquilo tudo, ainda que N parecesse um pouco deslocado de tudo ali. Vestido com sua capa branca feita por Anthea, o rapaz logo recebeu a atenção dos convidados, os homens usavam elegantes ternos e as mulheres esbanjavam beleza em seus vestidos de diversas cores e modelos. Todos observavam o futuro rei da Team Plasma com um olhar curioso, a maioria já era conhecida do jovem.

    Rapidamente, alguns membros da equipe apareceram uniformizados e formaram um corredor que ligava N até uma espécie de altar onde Ghetsis estava, ao lado dos outros sábios, que estavam vestido com rakusus, uma vestimenta tradicional dos monges (ainda que eles não pudessem ser considerados assim). Os que estavam em fila ergueram espadas cenográficas para o alto ao ritmo que o jovem de cabelos verdes caminhava entre eles até chegar ao seu destino, sempre com a cabeça baixa e uma expressão indecifrável, seu pai foi o primeiro a abrir os braços num gesto de acolhimento e sorriu sem descrições.

    — Não faz ideia do quanto eu esperei por esse dia – disse o homem.

    — Talvez eu tenha um pouco – a voz de Natural falhou um pouco. – Você sempre falou sobre esse dia que é impossível não... saber – seu tom parecia inocente, não sendo agressivo. – Chamou tanta gente.

    — Chamei as mais importantes, meu filho. Todos estão aqui por você, eles sabem que você vai prosperar a Team Plasma.

    — P-Podemos começar? – o jovem ajeito sua capa branca, incomodado.

    Com poucos gestos, os convidados e empregados se reorganizaram de forma que toda a atenção fosse voltada para aquele pequeno altar, aquilo causou ainda mais timidez por parte do futuro rei que estava prestes a ser coroado. Eram muitos olhos que pareciam julgar sua capacidade em reinar que nem mesmo ele sabia se tinha. Aliás, qual era a função de um rei mesmo? Ser bondoso? Impor respeito? Ser cruel? Ou só usar uma coroa e assinar papéis?

    — Sejam todos muito bem-vindos ao evento mais histórico da Team Plasma desde a sua fundação – começou Ghetsis, com sua voz marcante e forte. – A coroação do novo rei, o meu filho, que é um símbolo de esperança para todos nós e nossos objetivos.

    O rapaz coçou os cabelos, acanhado.

    — Nós, da Team Plasma, temos um objetivo nobre: Transformar Unova em um lugar ideal para os Pokémon, onde humanos não os usem como objetos de combate e escravidão. Trazer um rei jovem que acredite nisso é renovar a crença nesse objetivo. Acredito que estamos muito longe de um mundo ideal, mas não iremos desistir – o locutor aumentava mais seu sorriso de orgulho a cada palavra que pronunciava. – Todos os presentes aqui são parte da família, e é uma honra receber cada um de vocês. Pode trazer a coroa.

    Concordia, caminhou com classe para os fundos daquele altar e logo voltou com a pequena coroa de ouro pontiaguda que estava depositada gentilmente sobre uma almofada macia, seus passos se tornaram mais atentos devido ao medo de derrubar aquele objeto precioso. Só parou quando se aproximou de Ghetsis e este segurou o símbolo supremo da monarquia com suas duas mãos e a levantou em direção ao público, como se exibisse um troféu. O ouro que era o material daquilo provavelmente deveria valer mais que aquele castelo. A luz que refletiu contra aquilo fez N levemente cobrir seus olhos, logo em seguida, o mais velho virou-se para ele e gesticulou com a cabeça, para que o filho se curvasse levemente, e assim o fez.

    — Eu, Ghetsis Harmonia Gropius, líder dos Sete Sábios e atual líder dos Plasmas, coroo você, Natural Harmonia Gropius, como Rei da Team Plasma – Ghetsis depositou gentilmente a coroa sobre a cabeça do rapaz. Não era tão pesada fisicamente, mas a carga de obrigações a faziam parecer que ela o derrubaria no chão. – Pode levantar a cabeça.

    Sério, Natural ergueu sua cabeça e seus olhos não focaram ninguém em específico.

    — Arceus salve o Rei.

    — Arceus salve o Rei! – o coro da multidão ecoou pelo salão e a espinha do jovem se arrepiou. Não seria mais o filho, o irmão, o jovem ou só N. Agora, toda sua história se resumia naquele objeto de ouro que enfeitava sua cabeça. Ele era o Rei agora.

     

    Os sons das bebidas sendo servidas já podia ser ouvido, os tintilar das taças anunciavam a hora mais esperada por alguns convidados: a festa. Pratos exóticos e sofisticados, ponches, vinhos e champagnes caros e até mesmo uma fonte de chocolate enfeitavam uma enorme mesa, disposta para qualquer um. Logo após a cerimônia, o castelo dos Plasmas passaria horas recepcionando as animadas pessoas que ansiavam por um pouco de diversão. Principalmente a jovem Mikoto.

    Em seu vestido dourado brilhante estilo sereia, ela atravessava o ambiente com empolgação e extremamente sociável com todos os presentes, cumprimentando todos, apesar de não conhecer alguns. Logo, ela se aproximou de seu destino inicial: um grupo de seis pessoas que possuíam idades próximas, a maioria já passava dos vinte.

    — Eu definitivamente estava precisando de uma festa! – anunciou a loira, encostando em Kogsu, que parecia não ter tido problemas para escolher uma roupa social para a ocasião, já que estava acostumado a usá-las sempre. Um elegante terno branco com uma gravata prateada.

    — Você foi em uma ontem, Mikoto – respondeu o rapaz.

    — Aquela estava tão entediante que eu nem contei como uma – ela deu de ombros.

    Além de Kogsu e Mikoto, estavam naquela roda Tsuyo, o ninja que estava apenas vestido com uma camisa azul escuro por baixo de um colete preto e calças de mesma cor, Kana, com seus longos cabelos róseos presos em um rabo de cavalo alto com um vestido róseo, Izami e Izani, um casal de gêmeos que apesar da diferença de gêneros, eram facilmente confundidos, mas naquela ocasião, era possível perceber quem era quem graças ao elegante vestido laranja de Izami e a camisa social do irmão da mesma cor, e por fim, a serena e majestosa Susan, que se diferenciava dos outros por usar um elegante kimono vermelho. Aqueles eram As Virtudes, filhos dos Sete Sábios, eles faziam parte do alto escalão da Team Plasma e comandavam maioria das operações em campo.

    — Lembrando que a gente a não estaria aqui se não fosse a mente brilhante do Kogsu – disse a loira, levantando a taça em direção ao colega. – Você não só descobriu, como comprovou a existência da Dark Stone. Além de descobrir a localização dela!

    Kogsu riu de leve, um tanto convencido.

    — Não foi muito difícil. Nada que horas de leituras e acesso a arquivos confidenciais que o governo ignorava não resolvessem. Lógico que eu admito que foi um golpe de sorte aquele raio azul na Twist Mountain – riu o homem de cabelos azuis.

    — Não esqueçam que quem estava em campo eram eu e Mi – pronunciou-se Kana, com sua voz tímida.

    — É claro que não esqueci, foi uma operação... explosiva – riu Mikoto, bebendo um gole de seu champanhe, recordando-se com certo orgulho.

    — O que o Ghetsis não faz pelo filhinho dele? – murmurou Tsuyo, indiferente.

    — Ouvi dizer que encontraram a Light Stone também – comentou Susan, ajeitando seus cabelos negros.

    — Essa sim foi um golpe de sorte. Uma das minhas capangas ouviu o sobrinho da Lenora falando para dois jovens em um café que ele estava com a tal pedra – explicou Kogsu, logo, seu tom de voz pareceu soberbo. – Como ele é parente de uma figura pública, não foi muito difícil rastrear seu endereço. Aí eu mandei a Maggie e o Peter para a operação e...

    — E a Light Stone simplesmente sumiu após uma explosão – provocou o ninja, recebendo um olhar ameaçador do colega.

    — Uma explosão? – Mikoto sorriu. – Agora essa história ficou interessante. Como aconteceu?

    — Duas crianças vieram me encher o saco, eles tinham um Victini falante muito irritante – contou o de cabelos azuis.

    — Um Victini? – Kana se demonstrou curiosa.

    — O mesmo aconteceu comigo – resmungou Tsuyo. – Seria uma infeliz coincidência se fossem os mesmos garotos que me atrapalharam em Striaton.

    — Tá, tá – a mulher de vestido dourado gesticulou com as mãos. – E como terminou a história?

    — Um dos meus capangas acabou destruindo-a – relembrou Kogsu, de braços cruzados. – Pobre Peter, era tão jovem.

    — Hm? O que quer dizer? – questionou Susan.

    — Não ficaram sabendo? A explosão causada pela Light Stone deixou Peter bem ferido, levamos ele pra atendimento médico, mas ele acabou não resistindo. Parece que o impacto ao ser arremessado lesionou o pulmão dele gravemente.

    — Ah minha nossa – Kana levou as mãos ao peito, tocada.

    Uma garçonete de cabelos curtos e ruivos que se destacavam por uma mecha azul mais comprida se aproximou com uma bandeja cheia de taças. Sem muito ânimo, ela disse:

    — Gostariam de mais bebidas, senhores e senhoras?

    — Ah, Maggie – seu superior foi o primeiro a reconhecer a figura. – Eu sinto muito por Peter, sei que eram próximos.

    — E-Ele só... era um colega – Maggie pareceu distante, tentando evitar que o assunto se prolongasse a qualquer custo. – Aceitam bebidas?

    — Estamos bem – ele respondeu, a dispensando com um gesto gentil com as mãos.

    A garota então deu meia volta e saiu, partindo para o próximo convidado. Não fazia nem dois dias da morte de seu colega, mas a oportunidade de ganhar um dinheiro lhe surgiu e ela não podia recusar. Estava em uma jornada para enfrentar a liga, precisava fazer trabalhos para ganhar algo. Chocada, mas ao mesmo tempo indignada, não conseguia deixar de pensar em como Peter fora enterrado como um criminoso sem coração, ela fora a única que o acompanhara até o túmulo – se é que um pedaço de terra com uma pedra com seu nome mal escrito pudesse se considerar um túmulo. Sem outros membros da Plasma ou até mesmo a própria família do garoto. Tão desumano.

    Se livrando de seus pensamentos, ela se aproximou de onde Ghetsis e o novo monarca, Natural, conversavam com um homem que passava dos cinquenta anos a julgar pelos penteados fios de cabelo platinados com gel que cheirava incrivelmente bem, as linhas de expressão ressaltando os olhos azuis que combinavam harmoniosamente com o terno de linho cinza. Dois seguranças acompanhavam a figura masculina, mas não pareciam protegê-lo, e sim, garantir que não fugiria.

    — É uma honra recebê-lo em nosso palácio, Sr. Sanchez – sorriu o mais velho para seu convidado. – Se hoje esses pilares estão em pé é graças a seu investimento.

    — Ainda tenho alma de empreiteiro apesar de anos longe dessa área – brincou o homem, acendendo um charuto caro. – Não é tão fácil encontrar clientes quando se está “preso”. Se é que usar uma tornozeleira e andar dois seguranças no seu pé seja considerado uma prisão – ele voltou a rir enquanto liberava a fumaça de seu cigarro. Aquela baforada parecia como um alívio, como se fizesse tempos que não sentia o gosto da nicotina em sua língua.

    — Com licença – Maggie finalmente entrou na conversa. – Gostariam de uma bebida? – ofereceu, com a voz meio automática.

    — Oh, obrigado mocinha – Sanchez se serviu e começou a observar a jovem dos pés à cabeça, sem malícia, apenas com curiosidade. – Você parece bem nova, quantos anos tem?

    — D-Dezesseis, senhor.

    — Quase a idade da minha filha – comentou o homem, como uma informação aleatória, mas que chamou a atenção de Ghetsis, que fazia de tudo para se manter próximo e amigável do empresário.

    — Não sabia que era pai, senhor.

    — Apenas Jeffery, por favor – retrucou, bebendo um gole de seu champanhe. – E sim, eu sou pai. Infelizmente não conheço a menina, eu e a mãe dela meio que nos desentendemos, mas obtive informações de terceiros de que ela deve ter aproximadamente quinze anos. Me pergunto se ela tem os meus olhos pelo menos – riu.

    — Nunca conheceu ela? Ah, podemos te ajudar com isso. Posso mandar meus melhores comandantes para investigar. O filho de Giallo, um dos sábios, é um especialista no assunto.

    — Ghetsis, por favor, não se afobe – Jeffery tragou seu charuto e suspirou, sorrindo no canto da boca. – O destino vai cuidar disso – ele ajeitou o relógio de ouro e N não pode deixar de notar a pequena marca de nascença parecida com um coração branco perto do pulso.

    — Você está quieto demais, meu Rei – notou Ghetsis, demonstrando preocupação. – Algo te preocupa?

    — N-Não, claro que não – Natural negou várias vezes com a cabeça, recuando um pouco. – Eu... Posso sair um pouco? Para tomar um ar. Não estou acostumado com tanta gente junta.

    — Fique à vontade, majestade.

    N não deu tempo para que seu pai terminasse a frase e logo virou-se nos calcanhares e caminhou em direção para outro ambiente, uma antessala que estava decorada com tantos sofás que faria uma criança achar que aquilo era um parque de diversões com pulas-pulas. O jovem sorriu só de imaginar.

    Finalmente, ele sentou-se e respirou fundo.

    — Ser o centro das atenções nunca foi seu forte, não é? – uma voz feminina gentil preencheu os ouvidos do rapaz que sentiu seu rosto queimar e o fez se virar em direção a voz. Susan parecia mais angelical quando estava abaixo de uma luz branca, ela sorriu e se aproximou. – A coroa fica bem em você.

    — O-Obrigado – N parecia um robô de tão nervoso e travado que estava.

    — Eu trouxe alguém que com certeza você vai gostar – a moça abriu espaço para que a pequena Katrina surgisse com um miado animado.

    — Ah! – o rapaz esbanjou um sorriso pela primeira vez. – Oi garota.

    Era disso que gostava, de estar perto dos Pokémon, das criaturas fascinantes que eram completamente misteriosas, que sempre foram seus companheiros desde a infância, o protegiam e eram sua família. Amigáveis, Natural sabia que todas elas mereciam de volta toda a proteção e cuidados, e doía demais para ele ver essas criaturas sendo usadas como objetos de batalha. Purrloin roçou seu corpo no jovem magrelo em sinal de carinho e logo juntou-se a ele no sofá. Naquela hora, ele prometeu a si mesmo que governaria a Team Plasma pelos Pokémon.

    — Acha que eu fui uma boa escolha? – questionou N, se virando para Susan. A moça de cabelos negros então sentou-se ao lado do colega com a postura ereta, dava inveja a ver ser sentada tão perfeitamente.

    — Eu acho que estávamos precisando de alguém igual a você.

    — Estranho? – ele forçou uma risada.

    — Humano – respondeu, ajeitando alguns fios verdes bagunçados do rapaz, com certa intimidade. – Você não se gaba pela coroa que está em sua cabeça e nem quer que fiquem te chamando de Rei, provavelmente nem deve saber o preço dela e nem quer saber. Algumas histórias infantis dizem que um bom líder é aquele que é humilde e humano e geralmente, os reis que não são assim, são os vilões da história e se dão mal no final.

    — Mas o bonzinho também sofre muito na história antes de ter um final feliz – suspirou o rei.

    — Tudo faz parte de um teste para provar a essência do protagonista. Você é o protagonista da nossa história, N.

    — O protagonista, o quadro em branco, o destinado, o rei, o filho – N mexeu as mãos, nervoso. – São tantos rótulos.

    — Saiba que no final da história, quem escolhe o que você quer ser é você. E geralmente, esse título é o que estampa a capa do livro.

    — Eu só quero ser o N. Ou o Natural.

    — Eu queria ser só a Susan também – confessou a mulher, rindo gentilmente. – Mas sou a filha de Gorm, uma das Virtudes. Às vezes me pergunto o motivo de termos nomes sendo que sempre somos taxados com títulos.

    O outro riu.

    — É um bom ponto – disse, refletindo um pouco. – Espero um dia encontrar a resposta.

    Susan virou-se e segurou o rosto magro do rapaz entre suas mãos, ela riu quando sentiu o rosto dele ferver de vergonha. Adorava aquele jeito tímido. Sem muita discrição, ela uniu seu nariz com o do rapaz e esfregou levemente em movimentos rápidos. Natural achou ter levado um tapa na hora de tão corado que estava, não conseguia ficar perto da mulher sem externar seus sentimentos, os mais especialistas diriam que aquilo era amor, mas N acreditava ser uma extrema admiração.

    — Deixa eu te falar. Geralmente todo protagonista tem seu próprio time, que vai lhe apoiar e ajudar até a última linha do livro – confessou a moça, soltando o rosto do jovem. – Se você é o nosso protagonista, eu serei a personagem que irá garantir que o final feliz esteja escrito na última página – o sorriso com dentes brancos preencheu a boca carnuda dela. – Eu e as Virtudes estaremos com você. Ainda que alguns que sejam teimosos, como o Tsuyo e o Kogsu, posso garantir que eles são pessoas fiéis – riu.

    Natural riu de volta, sentindo um alívio em seu coração.

    — Oh! – o grito de exclamação veio de Izami, que estava acompanhada de seu irmão gêmeo, carregando um doce em mãos. – Olha, Izani, acho que eles estão num encontro.

    — Susan e o Rei estão namorando? – riu Izani, provocando a dupla.

    — Susan e o Rei estão namorando! – riu a gêmea de voltando, entrando na brincadeira.

    Susan apoiou os braços na costa do sofá e sorriu de forma amedrontadora.

    — Se vocês continuarem com isso, eu vou ser a bruxa da história e transformar vocês em pequenos Tympoles.

    Izani e Izami se entreolharam, pareciam duas crianças que acreditavam em qualquer história, e logo, saíram correndo, rindo de suas brincadeiras.

    — Quer saber? No final da história, esses dois vão virar o bobo da corte – concluiu Susan.

    — Concordo plenamente com a ideia – riu N de volta.

    Qual o peso de uma coroa? Não era tão pesada quanto parecia. Vai ficar tudo bem, pensou o jovem consigo mesmo.

       

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  • Arquivos: Capítulo 2

    Fonte: Sharona

    — Q-q-quer c-casar c-comigo? – a voz do rapaz soou tão automática e nervosa que era difícil dizer se ele tinha ensaiado a noite toda para dizer isso ou se era uma dose de coragem injetada em seu corpo que provavelmente duraria poucos segundos.

    Ao imaginar isso, Lenora riu. Aquele calouro era realmente o que tornava seu fim de faculdade inesquecível.

    Com seu charme feminino e um sorriso meigo nos grossos lábios pintados de vermelho, ela brincou levemente com a taça de vinho e percebeu os olhares curiosos dos outros clientes, alguns riam de Hawes, o companheiro da mulher, enquanto outros criavam expectativa. Com uma alegria indescritível, Lenora respondeu:

    — É claro que sim.

     

    Casar-se ainda na faculdade foi uma notícia recebida com surpresa pela família dos dois. Comentários como “vocês são tão jovens” ou “estão jogando o namoro fora” foram tão frequentes que ambos perderam as contas.

    Mas nada disso impediu que no verão daquele ano, Hawes Willard e Lenora Petrie trocassem votos e juras de amor eterno. Ela, com 26 anos e ele, com apenas 23. E quem que duvidasse da longevidade desse casamento, provavelmente estaria de boca aberta ao descobrir que o casal de arqueólogos já estava nos seus doze anos de casamento, popularmente conhecido como Bodas de Ônix, uma amigável coincidência com o nome da majestosa serpente de pedra, resistente, assim como a relação do casal.

    — Querida? Amor? – o professor Willard chamou insistentemente sua esposa com uma voz macia, a mulher despertou de seus pensamentos e fitou o rosto pálido e saudável do outro.

    — Sim, querido?

    Hawes suspirou e riu.

    — Estava no mundo de Cresselia novamente? – brincou ele, ajeitando seus óculos redondos.

    — Ah, desculpe, me distraí um pouco – riu a líder de volta. – Sobre o que falava?

    — Os relatórios sobre os acontecimentos na Twist Mountain chegaram. Clay achou importante que você lesse.

    Mas a mente de Lenora tinha apenas um foco.

    — A gente deveria sair.

    — H-hã?

    — Para comemorar.

    — Lenora, amor, tudo bem? Não estou entendendo.

    — Você se esqueceu?

    O silêncio dominou o escritório da líder de Nacrene.

    — Não – Hawes pareceu relutante. Nervoso, ele pegou uma pequena agenda, tentando conferir seus compromissos. Teria esquecido alguma premiação?

    — Nosso aniversário de casamento – Lenora encerrou o mistério, com um sorriso meio debochado. – Que feio, professor Willard. Logo o senhor, que nunca esquece nada, que tem todos os compromissos na ponta do lápis.

    — E-eu juro que não foi de propósito, querida – o marido pareceu constrangido, como se tivesse cometido o maior pecado de sua vida. Amava Lenora acima de tudo, esquecer uma data tão importante quanto a de seu casamento com ela era imperdoável. Mas mesmo assim, a líder não parecia ter se importado em dele esquecer.

    — Estou brincando, seu bobo – riu ela, se levantando. – Mas então, vamos comemorar?

    — C-Com certeza. O que pensou?

    Um segundo silêncio pairou no ar.

    — Ok – Willard riu. – Aparentemente os dois não conseguem pensar em nada que não seja o trabalho. Temos a semana inteira para pensar. 20 de Fevereiro, né?

    — Sim – Lenora respondeu. – Muita coisa aconteceu recentemente, Dark Stone e Light Stone. Isso encheu minha cabeça, então quero tirar essa semana só pra pensar nisso.

    — Essa é a parte boa do casamento – o outro se aproximou. – É o nosso cantinho de refúgio do mundo – apesar de baixinho, selar um beijo quente e apaixonado em sua esposa era a coisa mais natural do mundo para Hawes, era como se duas peças se encaixassem naturalmente independente das aparências.

    A negra riu e ajeitou os óculos de seu amado.

    — Você é incrível.

     

    Quando se tratavam de comemorações, Hawes e Lenora ficaram a maioria das vezes de fora dos eventos com a desculpa de que estavam ocupados com o trabalho. E não era por falta de vontade, se tinha algo que unia o casal era o trabalho.

    E não era crise de casamento ou nada do tipo, ser arqueólogo e cuidar de um museu proporcionava coisas interessantes todos os dias. Era completamente diferente de um trabalho monótono e entediante dentro de escritório. As emoções aumentavam mais com o fato de Lenora ser uma poderosa líder de ginásio e receber diferentes treinadores.

    — Poderíamos ir na roda gigante de Nimbasa amanhã, no dia 17. Estou com uma folguinha – sugeriu Hawes, na hora do almoço.

    — Amanhã? Ah, nem pensar – negou a mulher. – Tenho um desafio com uma treinadora que estou devendo há dias – ela brincou com a salada e levou um tomate a boca. – Hm! – exclamou. – Na quinta, dia 19, poderíamos ir pra Driftveil, temporada de Swannas, alimentar alguns e passear nos barquinhos de lá.

    — Dia 19 tenho uma conferência com Cedric Juniper, vamos discutir sobre fósseis – pensou Willard. – É uma discussão meio urgente, não consigo mudar.

    E nada foi feito.

    Lenora ajeitou seu turbante. Aquele acessório era o único que domava seus selvagens cachos esverdeados.

    Se tem uma coisa que ela aprendera entrando em uma faculdade tradicional, era que as pessoas reparavam muito em aparências. O que uma pessoa como ela fazia naquele ambiente cheio de rostos claros?

    Apesar de nunca expor, aquele sentimento de segregação a incomodava. Odiava ter que abaixar a cabeça e seguir “regras” que eram impostas só para “não ficar sozinha”. Até parecia o ensino médio.

    — Todo ano é uma decepção quanto aos calouros – comentou uma das colegas de sala de Lenora. – Um mais feio que o outro. Viu o de óculos? – debochou.

    — Deve ter entrado com bolsa, com aquela roupa, não deve ter um centavo – riu outra, com cabelo loiro. – Quem usa colete de lã ainda?

    Lenora franziu o cenho, meio enjoada, porém conformada com os comentários idiotas das colegas, mais uma vez, sua teoria sobre aparências fora comprovada. De toda forma, tentou imaginar o tipo de pessoa que seria o “senhor fora de moda”.

     

    Umas das ocupações da veterana era estudar para provas no pátio do campus da faculdade, adorava especificamente um banco que ficava ao lado de uma estátua majestosa da serpente de pedra de Kanto, Onix. Passava horas revisando matérias como antropologia, anatomia e história, não era das alunas mais excepcionais, era só mais uma jovem apaixonada pela área.

    Estava quase cochilando sobre as anotações de algo sobre a história das Ruins of Alph que mal notou quando alguém se aproximou e sentou-se no banco ao lado, ajeitando grossos livros em seu colo, meio atrapalhado. A figura só lhe chamou a atenção quando ela notou de relance o colete de lã. Era o famoso. Com seu cabelo bem penteado com algum excesso de gel e óculos fundo de garrafa, o rapaz não parecia passar dos 20 anos, um pouco mais novo que a veterana ao seu lado.

    Hawes notou que a mulher o encarava e retribuiu o olhar, um pouco ansioso.

    — Willard. Hawes Willard – ele se apresentou por fim.

    — Lenora Petrie – a outra sorriu de leve. – Te lotaram de livros também? Primeiro semestre é fogo.

    — E-Eu já li esses livros – Willard encolheu os ombros, acanhado. – Só queria ler novamente já que são extremamente importantes.

    — Não vai me dizer que gosta de documentários – Lenora revirou os olhos, rindo humorada, já imaginando a resposta.

    — Prefiro novelas – respondeu, ajeitando os óculos. – Mas essa é uma parte que eu não conto no meu clube de “geeks”.

    — Vive preso num status quo também? – questionou a mulher, como se a palavra pesasse até mesmo pra ela. Mal notou que seu turbante começava a afrouxar.

    — Todos vivemos – Hawes suspirou, tão pesaroso quanto. Olhou para o acessório de cabelo da mulher que já não fazia seu trabalho, em minutos, as madeixas se libertaram como Servipers selvagens. – O-oh – o espanto do jovem se fez claro ao vê-lo quando ele arregalou os olhos.

    Envergonhada, Lenora se desculpou milhões de vezes, nervosamente domando os fios, ainda que parecessem que eles ganhassem vida.

    — Não prende – Willard comentou, com a voz baixa, observando.

    A mulher olhou para o homem ao seu lado.

    — Não se prenda. Não se esconda atrás de um turbante. Mostre para as pessoas quem você realmente é – ele tirou os óculos e sorriu. – E não se importe com o que elas falem.

    Depois daquele dia, Lenora nunca mais usou um turbante. E Hawes se tornou muito mais que o rapaz do colete de lã.

     

    A líder de Nacrene conversava com o juiz novato que contratara para o seu ginásio, explicando com calma sobre como o tipo Normal-type era completamente necessário e flexível para um time enquanto aguardava a chegada de sua desafiante. A menina ruiva que entrou parecia determinada como todo jovem. Sua aparência lhe lembrava alguém, mas não conseguiu chegar em uma conclusão.

    — Boa tarde, querida – cumprimentou Lenora, com as mãos nos quadris e sua pose clássica. – Maggie, certo?

    A desafiante assentiu.

    — Desculpe a demora na nossa partida, muita coisa aconteceu – a líder disse, meio sem graça. – Espero que esteja pronta e que continue animada.

    — Tive alguns incentivos que me animaram. Podemos começar?

    — Com certeza.

    Apesar de Maggie trazer apenas dois Pokémon inusitados (um Stunfisk e um Foongus) para duelar contra o poderoso Watchog e o estratégico Herdier de Lenora, a jovem acabou por conquistar sua segunda insígnia, e como todo treinador, ela esbanjou animação ao receber o objeto.

    — Obrigada, dona Lenora – disse a desafiante, sorrindo.

    — Oh, pode poupar a ‘dona’ – riu a mais velha, com as mãos na cintura. – Estou impressionada com a escolha de seus Pokémon. Seu Stunfisk é incrível.

    — É uma honra ouvir isso. As pessoas menosprezam esse tipo de Pokémon por causa de sua aparência e falta de evolução, mas ele é tão incrível e me ensina muita coisa sobre determinação – explicou a mais nova.

    Lenora assentiu, ainda que seus pensamentos não estivessem completamente focados naquela conversa.

    — Tá tudo bem? Parece com problemas...

    — Ah, estou bem, querida – riu a outra. – Só estou preocupada com uns compromissos. Prometi a meu marido que iríamos comemorar nosso aniversário de casamento, mas nunca achamos uma brecha em nossas agendas.

    Maggie não pode deixar de pensar nos milhares de convites de Peter para convidá-la a sair. Ela riu, ainda que com pesar.

    — Se me permite dizer – começou a jovem treinadora. – Eu dava o ‘foda-se’ para os compromissos e iria aproveitar, a gente nunca sabe quando vai ser tarde demais. Talvez um jantar em casa no chão da sala, com um filme clichê, cobertores e chocolate. Se for um dia de chuva, o espetáculo está completo – riu, e a líder não pode deixar de sorrir com a facilidade em que os jovens resolvem problemas.

    — Acho que você tem razão – ela respondeu, após alguns minutos de reflexão. – Sugere algum filme?

     

    Quando Lenora abordou Willard sobre a sugestão, ele estranhou.

    Estava planejando um grande encontro, mas se impressionou quando a mulher sugeriu algo mais simples e simbólico.

    Trocou o vinho por refrigerantes açucarados de baixa qualidade, mas completamente viciantes, largou as entradas com nomes franceses para petiscos de botecos. O prato principal se tornou em uma macarronada que era receita da mãe de Lenora, a sobremesa virou um enorme pote de sorvete de Casteliacone que eles comeriam direto de lá. Roupas de luxo? Que nada! Pijamas velhos e confortáveis viraram o look da noite e a sala da casa o local do encontro. Era uma sexta à noite, justamente o exato dia do casamento dos dois. 20 de Fevereiro.

    Bodas de Onix. 12 anos de casados.

    Coincidentemente, o mesmo símbolo para representar aquela data, era o mesmo Pokémon que fazia plano de fundo da primeira conversa entre os dois naquele fatídico dia no campus da faculdade.

    E uau! Maggie estava correta. Com despreocupação total pelas formalidades e compromissos, aquele estava sendo o melhor encontro de aniversário para os dois, Willard se deliciava do jantar como se estivesse enjoado dos pratos prontos do trabalho e Lenora pouco ligava se sua roupa estava suja com o sorvete.

    — Isso foi inesperado – comentou Hawes para a esposa.

    — O quê?

    — Esse encontro. A gente pensou em tanta coisa, mas terminamos no mais simples.

    — Não gostou? – questionou, observando o marido.

    — Tá brincando? – ele riu. – Eu nem ligo pra rodas-gigantes, elas me deixam tonto, isso aqui é muito melhor.

    — Eu nem ligo tanto pra Swannas mesmo – a outra retribuiu a risada e devorou outra colherada do sorvete. – Com um calor desses, é muito melhor aproveitar um bom ar-condicionado.

    — Ei, Lenora – Willard chamou, a arqueóloga olhou para ele, curiosa.

    — Pra quê tanta formalidade? – perguntou, rindo. – Tudo bem?

    — Nada, é só – o professor ajeitou os óculos e se aproximou mais e selou um beijo apaixonado e carinhoso nela. Os lábios dela estavam gelados e refrescantes graças ao sabor dos Casteliacones. – Feliz aniversário de casamento.

    Lenora sorriu, completamente tímida, o que era incomum. Só Hawes era capaz de tal façanha.

    — Eu te amo, seu bobinho – ela abraçou o marido e retornou a beijá-lo. A luz da lua iluminava através da janela aquelas carícias apaixonadas que pareciam se intensificar aos poucos conforme a temperatura aumentava (ainda que o clima não estivesse tão quente assim).

    Aquele momento de privacidade era o encontro de dois corpos de duas almas, as mãos vasculhavam cada centímetro um do outro. Para Hawes, Lenora era a mulher mais linda do mundo, enquanto para sua esposa, Willard era o príncipe encantado de seus sonhos. E nada poderia atrapalhar aquele momento.

    Bom, exceto o toque do celular de Hawes.

    O professor resmungou, colocou seus óculos novamente e agarrou o aparelho. Era um de seus assistentes do laboratório. O que ele queria em plena oito e meia da noite?

    — Alô? – atendeu o homem, tentando disfarçar o descontentamento.

    — Professor Willard? Desculpe incomodar – respondeu a voz do outro lado, sentindo o leve desconforto pela chamada. – É sobre que aquele ovo que encontramos na escavação na Route 4. Acabou de rachar. Acredita que é de um Onix?

    — Um filhote de Onix? Uau.

    Lenora se demonstrou interessada na conversa.

    — Um Onix? Onde? – ela sussurrou.

    O assistente continuou:

    — Provavelmente deve ter sido deixado pra trás após as tempestades de areia. Você tem que ver, ele tem só dois metros e vinte, é a coisa mais fofa. Se é que isso é possível – riu.

    — Ah, eu vou tentar ir, estou um pouco ocupado agora – o do outro lado da chamada coçou os cabelos, rindo sem graça, mas completamente interessado. – Obrigado por me informar. Até mais – e desligou.

    — Um filhote de Onix? – a mulher já puxou a conversa logo em seguida. – É daquele ovo que você achou?

    — Esse mesmo. Dois metros e vinte, acredita?

    — Ah! Eu quero ver! – como uma criança, a mulher se levantou, procurando seus chinelos.

    — E-ei – o marido tentou acompanhar o ritmo. – Mas e nosso encontro?

    — Hawes, quem queremos enganar? Nós amamos e vivemos nosso trabalho. Ele é um dos pilares do nosso amor, não tem como fugir – riu. – Por favor... – ela implorou, usando seu charme feminino.

    Willard riu e vestiu suas pantufas.

    — Ok, ok, senhorita.

    — Oba! – comemorou a líder, indo em direção ao quarto, mas parando logo em seguida com uma ideia em mente. – Oh, já sei! Podemos adotá-lo!

    — O quê? – ele olhou surpreso para esposa, meio tentando acompanhar o turbilhão de pensamentos.  

    — Depois de 12 anos de casado, é meio óbvio que arrumaríamos um filho.

    — Mas temos o Jackson. Digo, ele não é bem nosso, mas o criamos como um.

    — O Jack está crescido e já sabe se virar – brincou Lenora. – Precisamos de alguém que precise de mimos e muitos cuidados.

    — Não era mais fácil termos um bebê? – riu o marido, brincando também.

    — Pfff – debochou. – A gente nunca seguiu o “status quo”, isso não vai mudar depois do casamento, né?

    — É por isso que eu te amo.

    No laboratório, o casal não conseguiu conter o ‘uau’ quando viram a Onix recém-nascido. A criatura parecida desorientada, como se tivesse que assimilar muitas sensações de fora da casca ao mesmo tempo. Os cientistas que trabalhavam no plantão davam todos os cuidados necessários para o Pokémon.

    Lenora se aproximou e ofereceu carinho e os olhos grafites da Onix observaram a líder. Com um sorriso, casal e Pokémon souberam que aquele era o começo de uma nova família.

    — Vamos chama-la de Alexandrita – concluiu a líder.

    Notas da Autora

    Talvez seja uma surpresa para alguns de vocês um capítulo "romântico" com a Lenora e o marido dela, um NPC quase confundível no jogo e um personagem sem muito destaque no anime. 

    Mas meu Deus, como eu precisava escrever sobre esses dois. Eu adoro casais secundários, e adoro ainda mais quando eles não são um padrãozinho e possuem densidade! A ideia surgiu quando eu pesquisei algumas imagens sobre os dois e fiquei apaixonada rs 

    Esse especial se passa depois do capítulo 23, mas não se preocupem, não há spoilers pesados :3 Espero que se divirtam. Curiosidade: Alexandrita é uma preda preciosa que atrai energias positivas.


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  • Capítulo 19

    Os dois foram capturados. 

    Amarrados em uma cadeira desconfortável, estavam em uma sala vazia e incrivelmente bem iluminada por uma lâmpada que doía a vista de tanta luz. Parecia cena de série criminal, já que logo em seguida, um rapaz trajando uma bela roupa social de maneira folgada com a camisa pra fora e o blazer aberto surgiu na sala, observando a dupla.

    — O que duas crianças fazem num lugar como esse? – ele questionou, ajeitando os cabelos azuis petróleo escuros.

    A dupla se manteve em silêncio. Hilbert olhou de relance para sua bolsa e a de sua companheira que estavam jogadas em um canto da sala, poderiam escapar com a ajuda de Vic.

    — Preferem o silêncio? Bem, eu poderia arriscar soltá-los, mas quem me garante que vocês não vão denunciar nossa posição? – Kogsu se aproximou dos dois.

    — Queremos a Light Stone de volta! – Hilda exclamou, encarando o vilão.

    — Oh, sabem da existência dela também? – riu o mais velho. – Isso é empecilho. Acho que vou ter que apagar a memória de vocês e fingir que nosso encontro nunca aconteceu.

    Estalando os dedos como uma ordem, o mesmo grandalhão que tinha capturado os dois jovens, saiu mais do que depressa da sala como um cachorrinho e logo depois retornou com uma Pokéball em mãos, liberando um pequeno Pokémon humanoide com uma enorme cabeça, a cor era uniforme, verde água da cabeça aos pés, as curiosas ovais no lugar dos olhos e nas mãos remetiam um alienígena, assim como o símbolo estranho em sua testa.


    — Pode ser que sintam uma pequena dor de cabeça, mas tentem não resistir muito, ou a cabeça de vocês vai explodir – Kogsu caminhou até atrás da dupla e levantou a cabeça deles com um puxão um tanto violento no cabelo, fazendo-os olhar para a criatura psíquica.

    No momento em que o capanga ordenou que Elgyem um Confusion fosse usado, Vic se libertou da bolsa de Hilbert, fazendo seu corpo se envolver em brasas e logo em seguida arremessar contra o adversário que caiu nocauteado com o impacto.

    — Mas o quê? – o homem de roupa social encarou a nova criatura. – Oh, um Victini.

    É senhor Vic para você, seu idiota! – o Pokémon mítico parecia irritado e determinado, a parte V em laranja da sua cabeça brilhava como fogo.

    — Um Victini falante ainda, que fofo – ironizou o vilão, sorrindo. – Tenho algo pra fechar sua boquinha – ele sacou uma Luxury Ball e liberou seu Pokémon.

    Scrafty era uma criatura bípede, parecido com um lagarto laranja, seu rosto tinha uma expressão entediada e com dentes a mostra. Uma pelagem amarela envolta de suas pernas e pescoço remetiam a um capuz e uma calça larga e para completar o “visual”, um topete vermelho era ostentado no topo da cabeça.


    Ui, ele vai usar um Pokémon Dark-type só pros meus golpes psíquicos não funcionarem – resmungou Vic, ironizando. – Qual é cara, seja mais criativo e corajoso, vem cair no soco de igual pra igual.

    — Você fala demais – retrucou o rapaz.

    O Victini tentava priorizar seus golpes de fogo já que não tinha nenhuma vantagem e efeito com seus golpes psíquicos enquanto tentava se manter ao máximo longe dos golpes noturnos do lagarto lutador, que era super efetivo contra ele. Era a primeira vez que entrava em um combate sério, então estava torcendo para ter a mira em dia.

    Enquanto o foco dos presentes estava na batalha, foi a vez de Grimaud brilhar, furtivamente, o Pokémon aproveitou o desvio de foco para começar a roer a corda que prendia Hilbert.

    — Hilda – sussurrou o menino. – Consegue dizer que direção está a Light Stone?

    — Hmmm – ela refletiu um pouco. – É meio confuso, mas eu sinto uma energia maior vindo do lado direito.

    — Esteja pronta pra correr.

    Grimaud terminou com as cordas do garoto e se direcionou para a cadeira de Hilda. Hilbert encarou o capanga de dois metros que estava extremamente interessado na batalha que acontecia, parecia uma criança curiosa, sorrateiramente, ele agachou-se no chão e rastejou até sua bolsa e a de sua companheira e as pegou.

    Prontinho, senhorita Hilda – resmungou o Joltik, saltando rapidamente para dentro do colete da jovem.

    Apreensiva e desesperada para sair dali, ela não se tocou no barulho que a cadeira fizera ao se levantar e nem na aproximação rápida do capanga que agarrou com brutalidade seu braço.

    — A-ah! Hilbert!

    Kogsu e Hilbert viraram sua atenção para a cena.

    — Cuide deles – ordenou.

    Aí, mané, a briga é aqui! ­– exclamou Vic.

    — Brianna, use Wrap! – o treinador liberou sua Snivy que saltou no rosto do inimigo, envolvendo seu rosto com suas vinhas, o que deixou o grandalhão em desespero que soltou Hilda para tentar se livrar de seu novo problema.

    — Vem Hilda! Vic, vamos! – o garoto de boné segurou o braço da amiga e retornou sua Pokémon e correu em direção ao corredor, seguindo pela direita, assim como a garota tinha dito anteriormente. Vic ficou um pouco para trás e usou suas labaredas de fogo para bloquear a passagem dos dois Plasmas.

    — PEGUEM ELES! – berrou Kogsu, extremamente irritado, apertando um botão de alarme, que fez um som alto ecoar por toda a construção.

    A dupla e o Pokémon continuaram correndo até que uma parada brusca de Hilda em frente a uma das portas interrompeu a fuga, ela olhou para dentro da nova sala e seu corpo queimou mais, lá estava ela, exposta e, como sempre, brilhante, a Light Stone.

    — Achamos... – Hilbert disse, num misto de alívio e surpresa.

    Como se todas as coisas em volta não importassem, a morena se aproximou, hipnotizada com as leves chamas que envolviam aquela esfera. Ela engoliu seco e a voz de Clara surgiu em sua mente de novo:

    A sua mestra está de volta, Reshiram.

    — Eu vou devolver isso para o Jackson – respondeu a garota.

    Nem pense nisso! Esse Pokémon pertence a nós!

    — Já disse que não vou me envolver nisso! – exclamou, começando a se irritar.

    — Hilda, com quem você tá falando? – questionou o companheiro dela, ansioso e de olho na porta. – Pega logo isso daí e vamos fugir!

    VOCÊ TEM QUE LIBERTAR ELE! – gritou Clara, deixando toda a sua pose séria de lado. – ISSO É IMPORTANTE!

    — SE VOCÊ TEM PROBLEMAS COM O SEU IRMÃO, NÃO ME ENVOLVA NISSO! – completamente enfurecida, Hilda estendeu as duas para agarrar a Light Stone.

    Uma enorme labareda em direção vertical em sentido para cima saiu da esfera, que atravessou o teto e iluminou o céu, quem estava na cidade provavelmente tinha percebido tal fenômeno, especialmente Lenora e Jackson, o que fez ambos seguirem naquela direção, sabendo que era algo grave.

    — MAS O QUE É ISSO?! – berrou Hilbert, recuando.

    A morena continuava com a pedra em suas mãos e notou que aquilo não a queimava, ofegante, ela torceu para que aquela reação cessasse logo. Seria algum sinal de que Reshiram seria libertado? O que faria se uma criatura daquelas surgisse de repente em Unova? Teria que controlar ele? Ele a obedeceria?

    Milagrosamente, a chama se dissipou aos poucos, mas isso não significava que os problemas tinham acabado.

    Pelo menos dez Plasmas devidamente uniformizados surgiram naquele ambiente, e eles não pareciam muito contentes por terem sido acordados tão cedo para lidarem com duas crianças. Não devia passar das seis da manhã. Eles rodearam o trio como caçadores sedentos, já puxando as Pokéball, prontos para qualquer ataque.

    Saiba que qualquer besteira que eu disse a vocês, era mentira – choramingou Vic, medroso, encostado no amigo. – Eu amo vocês demais.

    — O que fazemos agora? Estamos cercados! – alegou Hilda, abraçada com a Light Stone.

    Hilbert pegou uma das esferas de sua bolsa e encarou os adversários com certa confiança, não achou que fosse precisar tão cedo da ajuda deles. Aquele papo de “estaremos para você quando precisar” era real, certo? Arremessou a esfera e suplicou:

    — Wooby! Precisamos da Legião!

    Woobat surgiu e atendendo ao pedido de seu mestre como bom servo, ele grunhiu com confiança e alto, fazendo até alguns presentes tamparem os ouvidos, deixando alguns curiosos e até mesmo o treinador e sua companheira receosos, não demorou muito para que em quase um passe de mágica, os morcegos começassem a furar o teto da lona do QG e surgissem no ambiente como foguetes, atacando os Plasmas. Era a Legião mostrando para o que veio!

    — Essa é a hora que fugimos? – questionou Hilda, impressionada.

    — Com certeza!

    Se infiltrando no meio da confusão, os companheiros procuraram uma saída, aquele lugar parecia labiríntico, mas não demorou muito para que Vic apontasse para um corredor iluminado pela luz do sol, indicando a saída. O grupo então se dirigiu até lá e seus pulmões respiraram aliviados quando a brisa externa adentrou as narinas deles, era o gosto da liberdade.

    — Vocês dois realmente não saem do meu caminho, não é? – Maggie estava sem o seu uniforme e apareceu, juntamente de Peter, no caminho deles.

    Hilbert apontou, reconhecendo a garota:

    — VOCÊ É A MENINA QUE TROMBOU COMIGO NAQUELE DIA! Ah, mas eu quero aquela batalha agora! – totalmente despreocupado, o garoto sacou uma das suas Pokéball e o gesto foi imitado pela rival, que deu um sorriso malicioso.

    — H-Hã... Hilbert – sua companheira se aproximou mais dele, intimidada, notando a aparição de outros membros da Team Plasma. – Eu acho que... Ela tá do lado deles.

    — O-O quê? – o treinador repetiu o mesmo gesto da amiga e engoliu seco. – Os Woobats estão ocupados lá dentro. S-só nos resta lutar - ele liberou Brianna e Mirsthy que encararam incrédulas o seu mestre.

    — É arriscado, Hilbert! – a menina parecia muito temerosa, nunca imaginaria se deparar com esse tipo de situação.

    — Não tem o fazer!

    Dessa vez, Kogsu apareceu em cena, com a feição irritada enquanto encarava a dupla.

    — Eu tentei dialogar com vocês – começou, se posicionando próximo de Maggie. – Mas vocês são crianças teimosas e estão com algo que me pertence.

    Posso derrotar de olhos fechados todos os Scraftys que me mandar, engomadinho! – desafiou Vic.

    — Vocês são muito corajosos, vamos ver o que acontece quando eu cortar as asinhas de vocês.

    Todos os capangas imitaram o gesto de seu superior e sacaram suas Pokéballs, pronto para mais um confronto injusto contra duas crianças que incrivelmente estavam dando muito trabalho. O Victini se posicionou ao lado de Brianna, olhando confiante para ela.

    Vamos chutar as bundas desses caras, Bree.

    A Snivy assentiu, contagiada pela animação do amigo. Patrats e Watchogs foram liberados, Maggie liberou seu Stunfisk e Kogsu voltou com o Scrafty, a tensão tomou conta do ar, Hilbert não tinha certeza se seus Pokémon dariam conta, para seu alívio, a Legião tinha terminado seu trabalho do lado de dentro e tinha surgido para ajudar como pudessem.

    — Vão se arrepender de terem testado a paciência da Team Plasma.

    Um enorme feixe de luz comprido e iluminado atravessou o campo de batalha separando os jovens dos Plasmas, eles tiveram que recuar para não serem atingidos e quando se dissipou, todos olharam para a fonte daquele raio e notaram um enorme Pokémon rosa rechonchudo.

    — Vocês escaparam da primeira vez – começou Lenora, com os braços cruzados. – Mas agora eu vou mostrar que ninguém mexe com essa líder de ginásio sem se safar.

    Jackson surgiu também, não estava acompanhado de Winston e Bijou, mas carregava consigo uma Pokéball, ele olhou para seus amigos e notou a Light Stone nos braços de Hilda. Eles tinham se arriscado para resgatar a esfera para ele?

    — Hilda, Hilbert. Tudo bem? – questionou o moreno.

    — Bem é uma palavra meio forte – riu a menina, nervosa. – Mas estou aliviada por aparecerem. Eu nunca achei que essa bola branca daria tanto trabalho.

    A líder de Nacrene notou o objeto com a garota e encarou seu sobrinho, com uma expressão de descontentamento, de alguém que foi enganada e agora exigia explicações.

    — Eu te conto depois – como se lesse a mente da tia, Jack respirou fundo ao responder. – Temos um problema maior agora – finalmente, o rapaz liberou seu Pokémon, um majestoso Excadrill. – Ok, Jesse, vamos começar com Dig.

    O Pokémon mais do que depressa cavou um buraco e adentou no chão de terra, aguardando as ordens de seu treinador para atacar. O Lickilicky de Lenora permaneceu imóvel, estava recuperando do Hyper Beam lançado.

    O ataque dos dois lados começou, Hilbert ordenava ataque de suas parceiras para alguns Patrats enquanto Vic brigava com Scrafty de Kogsu novamente, nunca se sentira tão vivo em lutar contra um Pokémon. Jackson ordenava que seu Excadrill brotasse em pontos estratégicos para atacar alguns Watchogs. Parecia um cenário de guerra, e Hilda estava assustada com tudo aquilo, esse era o efeito que aquela Light Stone trazia?

    Isso é tão nostálgico – disse Clara, com a voz animada. – Só que com bem menos sangue.

    — Isso é horrível! – respondeu a garota, recuando para não ser atingida pelos golpes.

    Não, querida, isso é a vida. Eles vão brigar até um provar para o outro que são mais fortes.

    — Ninguém sai ganhando numa guerra! – Hilda gritou quando um Watchog nocauteado caiu perto dela.

    — Hilda! – berrou Hilbert, preocupado. – Corre! Fuja daqui com a Light Stone!

    — O-Ok!

    Desacostumada com correria e nervosa o suficiente para sentirem suas pernas falharem, a garota liberou Sombra de sua Luxury Ball, que a seguiu em sua corrida, atenta as ordens de sua mestra.

    — S-Sombra, c-consegue... virar aquele Arcanine agora? – ela questionou, ofegante.

    Com um grunhido fofo, um brilho cobriu o corpo da pequena raposa e rapidamente assumiu a forma do cachorro de Kanto, fazendo sua dona montar em suas costas e assim, ganhando mais velocidade para sumir de vez dali. Maggie foi a primeira a notar a fuga com o objeto de interesse da Team Plasma e cutucou Peter.

    — Vai pegar ela.

    — Deixa comigo, gatinha – sorriu o rapaz, correndo e liberando outro Pokémon, dessa vez, era uma zebra com crinas afinadas e pontudas como um raio, seu nome era Zebstrika. – Ok, garoto, hora de deixar a garota chocada. Use Shock Wave!


    O equino continuou a seguir seu alvo enquanto liberava ondas de choque, Hilda notou a aproximação do inimigo e gelou, ordenando que Sombra desviasse dos golpes a todo custo.

    — Ah, bonequinha, você não vai fugir de mim não! – Peter riu e ordenou novos ataques elétricos. – É só devolver essa coisinha aí na sua mão e a gente te deixa em paz.

    — NUNCA!

    — Você que pediu. THUNDERBOLT!

    Zebstrika fez surgiu de seu corpo uma descarga elétrica que foi mirada com um raio em direção as suas adversárias, completamente despreocupado se aquilo feriria a humana. Apesar não ser atingida diretamente, a colisão contra a sua pata traseira esquerda fez a Zorua grunhir de dor, perder o equilibro e voltar a sua forma normal, derrubando assim, Hilda de seu colo que caiu arrastada por alguns metros, encolhida, abraçada a Light Stone a todo custo.

    — Você é minha agora – riu o dono da zebra elétrica enquanto se aproximava com a mesa.

    A garota tentou levantar, mas suas pernas falharam e tudo que pode fazer foi rastejar para longe, com medo. Nunca desejara tanto ter ficado em casa. Sombra tentou impedir, mas foi chutada para longe pelo rapaz.

    — SOMBRA! – preocupada, a menina retornou a indefesa raposa para sua esfera e encarou Peter, procurando palavras para demonstrar coragem, mas quando seus olhos encheram de lágrimas, ela percebeu que era melhor se manter em silêncio.

    — Own, ela vai chorar – o rapaz riu. – Menina, é só me devolver isso. Eu não tenho interesse em você, o meu chefe só quer essa esfera. É só me dar, a gente fica numa boa e eu posso convidar a Maggie pra sair. Não vai querer manchar meu filme com a moça, né?

    Ela continuou em silêncio. Era só dar-lhe a Light Stone, aquilo não tinha nenhum interesse para ela, a Team Plasma deixaria seus amigos em paz e ela e Hilbert poderiam retornar a sua jornada, mas do outro lado da balança, que tinha um peso muito maior, estava ela, a maldita responsabilidade, e aquele sentimento a mantinha resistente e protetiva com aquele objeto.

    — Não vai colaborar né? – o Plasma parecia mais irritado e começou a se aproximar.

    Vic, focado em sua batalha contra Kogsu e Scrafty, notou ao longe o perigo que Hilda corria, acertou um golpe de fogo no adversário e enquanto ele se recuperava, procurou Hilbert com o olhar e gritou para ele:

    — HILBERT! A HILDA!

    O treinador, que terminava de derrotar pelos menos três equipes de Pokémon dos Plasmas, ouviu a prece de seu amigo e procurou desesperado pela amiga, quando localizou, sua reação começar a correr em direção a cena.

    — HILDA!

    Hilda recuava cada vez mais, se arrastando pelo chão enquanto via Peter se aproximar como um Mightyena sedento por comida.

    — DEIXA ELA EM PAZ! – a agilidade do meio Pokémon era incrível e rapidamente ele chegou até o vilão agarrando-lhe pelo braço.

    — Me solta, moleque! – esbravejou o mais velho, se distraindo de seu objeto original.

    Aproveitando a situação, Hilda conseguiu se levantar, pronta para fugir mais uma vez, quando uma descarga elétrica produzida pelo Zebstrika, que ainda mantinha o foco na garota, a fez perde o equilíbrio e cair novamente, só que dessa vez, derrubando a Light Stone, que caiu alguns metros longe dela. Isso despertou a atenção de Hilbert e principalmente de Peter, que empurrou o menino e sorriu.

    — Agora ela é minha!

    — Não vou deixar! – apesar de estar no solo, a menina conseguiu se levantar e começou a correr em direção a esfera na intenção de recuperá-la.

    — Ah, mas não vai mesmo! Thunderbolt!

    Outro raio foi lançado pela zebra elétrica, a jovem, por instinto, se jogou para o lado, se desviando do golpe, mas ninguém percebeu que o ataque não terminou sua trajetória, assim, atingindo a Light Stone, que absorveu toda aquela energia.

    O silêncio foi absoluto e a tensão tomou o ambiente, Hilda mal respirava e Hilbert logo se aproximou dela para oferecer-lhe suporte. Todos se mantinham intactos, esperando alguma reação da esfera. Foi quando se ouviu a primeira rachadura e o som muito semelhante a uma dinamite próxima de explodir.

    — H-Hilbert... – sussurrou a garota para seu companheiro, como se falar alto acelerasse o processo. – V-Vai explodir.

    — O quê?

    Ninguém teve tempo de impedir, a explosão veio com um clarão e o impacto levantou poeira. O treinador carregou sua companheira no colo para longe a fim de não sofrer maiores ferimentos, Lickilicky usou seu corpo para proteger Lenora, Jackson e Excadrill, já que seu corpo flácido e enorme aguentava qualquer baque. Alguns membros da Team Plasma foram mandados para longe, inclusive o próprio Peter, que foi o que sofreu mais impacto devido a proximidade.

    Aquela explosão causou reação imediata na cidade, já que algumas pessoas acionaram a polícia que rapidamente se dirigiram até a área.

    A fumaça demorou uns minutos para se dissipar, e a surpresa maior aconteceu quando Hilda dirigiu seu olhar para o local original da Light Stone e lá estava uma cratera, mas nem sinal da esfera branca. Aquilo deixou todos em profundo silêncio e boquiabertos, até que um berro de Maggie desviou o foco.

    — PETER! – a ruiva correu em direção ao colega de equipe, que estava estirado perto de uma árvore, ferido e com sangue saindo da sua boca, mas que estava incrivelmente consciente.

    Ela se ajoelhou ao lado do amigo e não escondeu as lágrimas.

    — Ei – ele começou, com a voz fraca. – Não chora – tentou riu, mas a dor o impediu. – Eu vou ficar bem, estamos devendo um encontro ainda.

    — Seu idiota, como pode pensar numa coisa dessas nessa situação – a menina enxugou as lágrimas e olhou para Kogsu. – ELE PRECISA DE AJUDA MÉDICA!

    O líder daquela equipe tentava processar os acontecimentos enquanto analisava o ambiente, a Light Stone tinha sumido, um de seus capangas estava ferido e como se não fosse o suficiente, ele ao longe começou a ouvir a sirene da polícia se aproximando com determinação.

    — Preparar para recuar! – berrou, tirando uma esfera conhecida como Ultra Ball do bolso e liberando o Pokémon de dentro dela.

    Quem ganhou os céus foi um enorme dragão laranja com uma expressão nada amigável, era o famoso e temido Charizard, o estágio final de um dos iniciais de Kanto. Ele encarou o campo e aguardou as ordens de seu mestre.

    — Use Flamethrower no QG!

    A criatura de fogo disparou enormes proporções de fogo, destruindo aos poucos a estrutura do prédio.

    — O MALDITO ESTÁ QUEIMANDO AS PROVAS! – berrou Lenora, pronta para correr em direção a Kogsu, mas esta foi impedida por Jackson, que puxou sua tia a tempo de uma labareda criada pelo Charizard que criaram uma parede de fogo, separando a equipe de Plasmas dos outros.

    Quando a polícia finalmente chegou, já era tarde, as chamas se dissiparam e eles haviam sumido como fumaça. A missão tinha fracassado.

     


    — Quando você pretendia me contar que estava com um objeto daqueles em sua posse, Jackson?! – exclamou Lenora, horas depois.

    Todos estavam no hospital local, Hilda precisava de cuidados médicos graças aos tombos que levara, nada muito grave, apenas para observação. A enfermeira na recepção encarou a líder, brava, pois a placa de silêncio não estava sendo respeitada.

    — T-Tia, olha, fala mais baixo – pediu Jack, tentando colaborar com a funcionária do local. – Eu assumo toda a culpa, de verdade.

    — Assumir a culpa não vai trazer aquilo de volta.

    — Eu sei, mas pense pelo lado bom, a eq-

    — Lado bom?! – o rapaz foi interrompido por outro grito e a enfermeira repreendeu a negra. – Desculpe – o tom de voz foi abaixado. – Jackson – a conversa se tornou mais discreta. – A Dark Stone foi encontrada também, e os mesmos Plasmas a roubaram também. Eu ia te contar ontem depois da minha batalha contra Hilbert e pedir para que você me ajudasse a encontrar a Light Stone já que você sempre está nas escavações. Nunca achei que fosse esconder isso de mim.

    — Você não entenderia – o moreno economizou nas palavras e levantou. – Eu preciso ver a Hilda.

    — Não vai fugir da nossa conversa, mocinho – a mulher agarrou o braço da sobrinha. – Não seja irresponsável.

    — Eu? Irresponsável? – o jovem desvencilhou o braço num ato bruto e encarou a mais velha: - Pois convoque uma reunião, com a polícia e com o comitê de arqueologia o quanto antes. Eu vou mostrar quem é o irresponsável – com passos pesados e largos, ele se encaminhou até o quarto da amiga, deixando a líder para trás, que suspirou.

    Hilda observava a paisagem pela janela, Nacrene era realmente uma cidade diferenciada em sua arquitetura, ainda mais quando se olhava do alto. Não estava com muitas dores, mas Hilbert não parecia perceber isso.

    — Hilda – ele começou, com a voz suave. – Tá tudo bem mesmo?

    A morena olhou para seu companheiro e sorriu de leve, nunca tinha reparado como ele era fofo quando estava preocupado.

    — Estou bem, de verdade. Foram só alguns arranhões, acho que nunca caí tanto na minha vida – ela riu. – Parecia uma criança aprendendo a andar.

    O colega retribuiu o sorriso, foi quando Jackson entrou e sorriu ao ver os amigos com bom-humor.

    — Eu espero que essa risada seja um sinal de que está tudo em ordem – disse, sentando no sofá ao lado do garoto de boné. – Vocês dois são malucos. Como descobriram onde estava a Light Stone?

    — Tudo começou quando a Hilda começou a falar sozinha de madrugada – começou Hilbert.

    — Pera aí, não é bem assim – riu a garota.

    Hilda contou para o arqueólogo todos os acontecimentos até o presente momento, o rapaz não podia deixar de estranhar, mas aquilo era dito com tanta convicção, que mesmo apesar de ser um pouco cético, ele acreditou naquela história. Se uma esfera que até ontem era uma lenda era real, porque aquilo não seria?

    — E a Princesa tá aí na sua cabeça ainda? As vezes ela sabe o que aconteceu com a Light Stone – teorizou Jackson.

    — Desde a explosão, ela não falou mais comigo... – lamentou a menina. – Mas o que me intriga é isso daqui – Grimaud surgiu do colete da menina com um pequeno fragmento branco na boca e depositou na mão da menina. – C-Caiu perto de mim, posso estar delirando, mas isso... faz parte da Light Stone né?

    Jack pegou o objeto e analisou como se fosse um diamante, seus olhos se arregalaram quando ele averiguou o que era aquilo.

    — Então ela não sumiu... Só... Se despedaçou – disse, olhando para os outros dois.

    — Se a gente achou um, isso quer dizer que pode existir os outros pedaços – teorizou Hilbert.

    — Exatamente. E se a Hilda consegue localizar a Light Stone, ela pode achar outros pedaços – sorriu o moreno.

    — S-Só é uma pena que tenha terminado assim. Desculpa, Jackson.

    — Tá brincando? Vocês dois foram incrivelmente irresponsáveis – o moreno passou o braço em volta do ombro do garoto ao seu lado. – E eu agradeço vocês demais, mas agora é minha vez de assumir minhas responsabilidades.

    Acho que o auditório do museu de Nacrene nunca tinha recebido tanta gente, a enorme maioria eram arqueólogos e pessoas da área que foram pessoalmente convocadas por Lenora a pedido do sobrinho. Alguns membros da polícia local estava ali também, foi quando Jackson apareceu no palco, arrumado com uma roupa social neutra e caminhou até um pequeno palanque equipado com o microfone, a tia o observava do fundo do local.

    — Boa noite senhores – começou o arqueólogo, em um tom calmo. – Desculpe pela reunião repentina. Mas o assunto é importante. Eu sei que muito de vocês devem estar estranhando um rosto jovem discursar para pessoas que provavelmente tem muita mais experiência que eu. Eu quero falar sobre desculpas e desabafar.

    “Minha tia, a líder de ginásio de Nacrene, Lenora, foi a mulher que me incentivou a ser um museólogo e um arqueólogo, e com ela, eu aprendi a amar a área que atuo, amor o suficiente para notar alguns problemas que me fizeram tomar atitudes irresponsáveis”

    Alguns membros mais velhos da plateia se entreolharam, reprovando um pouco a atitude do garoto.

    — Estou me referindo sobre como vocês criaram uma pirâmide – confessou Jack, sério. – Eu já fiz muitas descobertas nas minhas escavações, mas nunca vi o nome de um novato estampado nas revistas ou nos jornais. Vocês sugam as nossas descobertas e ganham todo o crédito por isso. E ISSO É INJUSTO!

    “Foi por esse motivo que tomei a decisão mais drástica e irresponsável. Eu escondi um artefato raro com o intuito de eu fazer a pesquisa para enfim, ganhar os devidos créditos. E eu admito que pensei um pouco na fama e deixei a colaboração histórica de lado. Se trata da Light Stone.”

    Os murmúrios agitados começaram, alguns comentavam sobre aquilo ser uma lenda e outros só cochichavam sobre querer ir embora.

    — Eu sei que isso era só considerado um mito, mas eu vi o objeto com as minhas próprias mãos – em um telão, ele exibiu as fotos da esfera branca tiradas no momento da sua escavação. – Essa esfera guarda dentro dela um Pokémon poderosíssimo que não sabemos o poder dele, mas que pode ser devastador. E antes de ontem... Ela foi roubada.

    Todos olharam atônitos e calados para Jackson.

    — Roubada, recuperada, para logo em seguida desaparecer numa explosão. E é nessa hora que todos me encaram com insatisfação – o negro se virou para um grupo de policiais presentes. – Senhores, o meu Darmanitan estava tentando recuperar a Light Stone roubada. Mesmo assim, eu assumo qualquer culpa – depois, ele estendeu os braços. – E eu não vou jogar a culpa nas costas de ninguém! A culpa foi minha, a irresponsabilidade foi minha! Mas anotem uma coisa, senhores e senhoras, eu irei assumir a responsabilidade e buscarei essa pedra no mundo de Giratina se for preciso! E eu espero que isso sirva de lições para todos aqueles que sobem nas costas dos outros para conseguirem algum mérito.

    Ele abaixou os braços.

    — Muito obrigado pela atenção.

        

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